Recebido em: 29/11/2024
Aprovado em: 16/12/2024
[Tradução]
Trabalho e crise ecológica: o dilema ecomodernista no(s)
marxismo(s) ocidental(is) (1970s-2000s)
Labour and the ecological crisis: The
eco-modernist dilemma in western
Marxism(s) (1970s-2000s)
Trabajo y crisis ecológica: el dilema
ecomodernista en el(los) marxismo(s)
occidental(es)
Stefania Barca
Universidade de Santiago de Compostela / CISPAC (Espanha)
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8136-3369
VERSÃO ORIGINAL
BARCA, Stefania. The eco-modernist dilemma in western Marxism(s) (1970s-
2000s). Geoforum, v. 98, jan-2019. Disponível em:
https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S00167185173021
05. Acesso em: 16 dez. 2024.
TRADUÇÃO
Gustavo de Oliveira Correa [tradução]
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Lattes: http://lattes.cnpq.br/5090987787444945
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8136-3369
Gustavo Seferian [revisão]
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Lattes: http://lattes.cnpq.br/6051232864493698
ORCID: http://orcid.org/0000-0002-5587-6734
RESUMO
Este artigo oferece uma crítica intelectual da ecologia política marxista
desenvolvida na Europa Ocidental entre 1970 e 2000, concentrando-se na
relação trabalho/ecologia. Minha crítica se baseia na intersecção de dois
níveis de análise: (1) a evolução histórica do ambientalismo do trabalho,
focando no que chamarei do dilema ecomodernista do trabalho; (2) o
significado da política de classe em relação à política do meio ambiente,
com foco especial na dialética entre produção/reprodução. Focando na obra
de quatro intelectuais marxistas cujas ideias ressonam em vários
movimentos sociais do espectro da esquerda (de trabalhadores,
ambientalismo, feminismo e decrescimento), o artigo mostra como o atual
embrenhamento do trabalho dentro da política da ecomodernização oculta
uma série de fraturas internas e visões alternativas da ecologia que precisam
ser esmiuçadas a fim de abrir o terreno para um repensar das políticas
ecológicas hoje em termos de classe.
2
Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano
Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região
BARCA, Stefania. Trabalho e crise ecológica: o dilema ecomodernista no(s) marxismo(s) ocidental(is) (1970s-2000s).
Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano, Campinas, v. 7, p. 1-42, 2024. DOI:
https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.268.
PALAVRAS-CHAVE: ecologia; marxismo; movimentos sociais; sindicalismo;
trabalho.
ABSTRACT
The article offers an intellectual critique of Marxist political ecology as
developed in western Europe between the 1970s and 2000s, focusing on the
labour/ecology nexus. My critique is based on the intersection of two levels
of analysis: (1) the historical evolution of labour environmentalism, focusing
on what I will call the eco-modernist dilemma of labour; (2) the meaning of
class politics in relation to the politics of the environment, with a special
focus on the production/reproduction dialectic. Focusing on the work of four
Marxist intellectuals whose ideas resonated with various social movements
across the Left spectrum (labour, environmentalism, feminism and
degrowth), the article shows how the current entrenchment of labour within
the politics of eco-modernization hides a number of internal fractures and
alternative visions of ecology that need to be spelled out in order to open
the terrain for a rethinking of ecological politics in class terms today.
KEYWORDS: ecology; labor; Marxism; social movements; syndicalism.
RESUMEN
Este artículo ofrece una crítica intelectual de la ecología política marxista
desarrollada en Europa Occidental entre 1970 y 2000, centrándose en la
relación trabajo/ecología. Mi crítica se basa en la intersección de dos niveles
de análisis: (1) la evolución histórica del ecologismo obrero, centrándose en
lo que llamaré el dilema ecomodernista del trabajo; (2) la importancia de
la política de clase en relación con la política del medio ambiente, con
especial atención a la dialéctica entre producción/reproducción.
Centrándose en la obra de cuatro intelectuales marxistas cuyas ideas
resuenan en diversos movimientos sociales de todo el espectro de la
izquierda (obrero, ecologista, feminista y decrecimiento), el artículo
muestra cómo el actual enredo del trabajo dentro de la política de la
ecomodernización oculta una serie de fracturas internas y visiones
alternativas de la ecología que es necesario escudriñar para abrir el terreno
a un replanteamiento de la política ecológica actual en términos de clase.
PALABRAS CLAVE: ecología; marxismo; movimientos sociales; sindicalismo;
trabajo.
3
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BARCA, Stefania. Trabalho e crise ecológica: o dilema ecomodernista no(s) marxismo(s) ocidental(is) (1970s-2000s).
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https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.268.
INTRODUÇÃO
Este artigo oferece uma crítica ao que eu considero uma das tendências mais
importante nas políticas ambientais da era neoliberal na Europa Ocidental: a
convergência política entre o movimento trabalhista e a corrente convencional da
Modernização Ecológica, o que chamarei de ecomodernismo trabalhista, e sua
divergência contemporânea com os movimentos ecológicos anticapitalistas. Este
padrão tornou-se dominante em um contexto histórico marcado pelo declínio
generalizado da representatividade e do poder político da classe trabalhadora, tanto
no nível dos sindicatos
1
quanto no nível das - praticamente generalizadas - derrotas
eleitorais da esquerda radical
2
, bem como por uma ampla adoção de políticas
neoliberais nos países da Europa Ocidental. Ao mesmo tempo, o ecomodernismo
trabalhista esconde importantes fraturas internas e contradições ecológicas: por um
lado, na esteira do aumento dos níveis de desemprego, uma série de diferentes
setores sindicais e partidos políticos de esquerda continuam a apoiar os combustíveis
fósseis e a abertura de novas fronteiras extrativas (da mineração de ouro ao
fraturamento hidráulico
3
, e ao próprio carvão); por outro lado, o endosso das
organizações sindicais ao ecomodernismo tem sido confrontados pela resistência das
bases contra novos projetos de "energia limpa", tais como, parques eólicos e usinas
de energia solar de grande escala, produção de energia a partir de resíduos e
ferrovias de alta velocidade. Estas divisões complicam imensamente o esforço para
1
Nota do Tradutor (N.T.): no original são trade-unions é um tipo de organização um pouco diferente
do que conhecemos hoje como sindicatos, escolhi essa tradução por não possuirmos uma figura
jurídica e organizativa exatamente igual.
2
ELEY, G., NIELD, K. Scholarly Controversy: Farewell to the Working Class? International Labor and
Working-Class History, No. 57, Spring 2000, pp. 130. Disponível em:
https://library.fes.de/libalt/journals/swetsfulltext/14895131.pdf. Acesso em: 12 dez. 2024; ELEY,
G. Forging Democracy: The History of the Left in Europe, 18502000. Oxford University Press, 2002;
SILVER, B.J. Forces of Labor: Workers' Movements and Globalization Since 1870. Cambridge University
Press, 2003; VAN DER LINDEN, M. Workers of the World: Essays toward a Global Labor History, Brill,
2008.
3
N.T.: no original fracking, uma técnica específica de retirada de petróleo do solo, muito comum nos
Estados Unidos, que causa grandes danos ambientais.
4
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delinear um programa vermelho-verde, ou mesmo para entender onde a principal
frente de batalha está localizada no atual conflito de classe ecológico.
A abordagem deste enigma, eu defendo, requer que desenvolvamos uma
crítica à ecologia política do trabalho, ou seja, uma análise histórica material das
relações internas entre trabalho e ecologia, com foco no significado ecológico do
trabalho e as implicações políticas de interação das classes trabalhadoras com a
natureza, tanto em teoria como na práxis histórica
4
. Minha crítica se situa dentro da
perspectiva ecofeminista marxista sobre o trabalho e a agência da classe
trabalhadora. Acrescentando à noção de "ruptura metabólica"
5
, como proposto por
J.B. Foster
6,7
, o ecofeminismo marxista se concentra nas "forças de reprodução",
enfatizando o "valor metabólico"
8
produzido pelas formas de trabalho que se alocam
além dos entendimentos convencionais (ocidentais) do termo. De acordo com
Salleh
9
, "valor metabólico" indica "uma ‘outra’ esfera subliminar de trabalho e
valor”, aquela produzida por "camponeses/as, mães, pescadores/as e coletores/as
que trabalham com processos termodinâmicos naturais que satisfazem as
necessidades diárias da maioria das pessoas na Terra"
10
. Necessárias para a produção
e intercâmbio industrial, estas pessoas - ela escreve - habitam tipicamente "as
4
BARCA, S. Laboring the Earth: Transnational reflections on the environmental history of work.
Environmental History 19 (January 2014). pp. 327. The University of Chicago Press, 2014; RYLE, M.,
SOPER, K. Introduction: the ecology of labour. Green Letters 20(2), pp. 119126. doi:
10.1080/14688417.2016.1164984. Acesso em: 12 dez. 2024.
5
N.T.: no original “metabolic rift” que é traduzido como “falha” ou “ruptura” metabólica.
6
“Em seu marco ecológico de Marx (2000), J.B. lembrou como - segundo Marx - o capitalismo industrial
transformou o metabolismo social em uma ‘ruptura metabólica’, ou seja, um processo de aceleração
da degradação tanto da natureza não humana quanto do trabalho.” FOSTER, J.B. Marx’s Ecology.
Materialism and Nature. Monthly Review Press, 2000.
7
FOSTER, J.B. Marx’s Ecology. Materialism and Nature. New York: Monthly Review Press, 2000;
FOSTER, J.B., CLARK, B., YORK, R. The Ecological Rift: Capitalism’s War on the Earth. New York:
Monthly Review Press, 2010; CLARK, B., YORK, R. Carbon metabolism: global capitalism, climate
change, and the biospheric rift. Theory and Society 34 (4), pp. 391428, 2005.
8
SALLEH, A., From metabolic rift to “Metabolic Value”: reflections on environmental sociology and
the alternative globalization movement. Organization and Environment, vol 23, n. 2, pp. 205219.
Sage Publications, Inc., 2010.
9
SALLEH, A., From metabolic rift to “Metabolic Value”: reflections on environmental sociology and
the alternative globalization movement. Organization and Environment, vol 23, n. 2, pp. 205219.
Sage Publications, Inc., 2010.
10
SALLEH, A., From metabolic rift to “Metabolic Value”: reflections on environmental sociology and
the alternative globalization movement. Organization and Environment, vol 23, n. 2, pp. 205219.
Sage Publications, Inc., 2010. p. 205.
5
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https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.268.
margens de capitalismo - periferias domésticas e geográficas", e assim elas são
"ignoradas, como se estivessem em ‘lugar nenhum’ no sistema mundial"
11
.
Nomeando-as "trabalhadores/as meta-industriais" e ao mesmo tempo observando que
elas formam a maioria da classe trabalhadora mundial é, para Salleh
12
, uma forma
importante de tornar seu trabalho visível e valorizar sua contribuição como "cura de
rupturas", ou seja, contrastando a degradação dos corpos e dos ecossistemas
colocados em movimento pela produção industrial.
Os conceitos de trabalho meta-industrial e valor metabólico de Salleh
13
constroem uma abordagem material ecofeminista
14
, que visa a uma nova
conceitualização da ecologia política através de um diálogo socialista/feminista
15
.
Acho essa abordagem extremamente relevante para uma reconceituação do
ambientalismo do trabalho, tanto em suas formas históricas como atuais. Vendo o
nexo trabalho/ecologia a partir do ponto de vista do eco-feminismo marxista, o cerne
da questão para uma crítica da ecologia política do trabalho torna-se: que formas de
trabalho e quais sujeitos estão incluídos no ecomodernismo trabalhista? E, em geral,
o que conta como trabalho no ambientalismo do trabalho? Esta perspectiva nos
permitiria ampliar o escopo do ambientalismo do trabalho através do
desenvolvimento de uma descolonização do trabalho, tanto como conceito quanto
como práxis, tornando assim visíveis suas potencialidades como agente de revolução
ecológica.
11
SALLEH, A. “Green Economy” or Green Utopia: the salience of reproductive labor Post-Rio+20.
American Sociological Association, Volume 18, Number 2, pp. 141-145, 2012. p. 141.
12
SALLEH, A. “Green Economy” or Green Utopia: the salience of reproductive labor Post-Rio+20.
American Sociological Association, Volume 18, Number 2, pp. 141-145, 2012. Disponível em:
https://jwsr.pitt.edu/ojs/jwsr/article/view/468/480. Acesso em: 12 dez. 2024.
13
SALLEH, A. “Green Economy” or Green Utopia: the salience of reproductive labor Post-Rio+20.
American Sociological Association, Volume 18, Number 2, pp. 141-145, 2012. Disponível em:
https://jwsr.pitt.edu/ojs/jwsr/article/view/468/480. Acesso em: 12 dez. 2024.
14
MELLOR, M. Ecofeminist political economy. International Journal of Green Economics, v. 1, n.
1/2, pp. 139150, 2006; PERKINS, P.E. Feminist ecological economics and sustainability. Journal of
Bioeconomics, v. 9, pp. 227244, 2007. Disponível em: https://www.greeneconomics.net/EllieP-
FemEcolEcon.pdf. Acesso em: 12 dez. 2024; BAUHARDT, C. Solutions to the crisis? The green new
deal, degrowth, and the solidarity economy: alternatives to the capitalist growth economy from an
ecofeminist economics perspective. Ecological Economics, Elsevier, vol. 102, pp. 6068, 2014.
15
SALLEH, A. CNS symposium: ecofeminist dialogues. Capitalism Nature Socialism, v. 17, n. 4, pp.
32141, 2006.
6
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Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano, Campinas, v. 7, p. 1-42, 2024. DOI:
https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.268.
Partindo dessa abordagem, este artigo desenvolverá uma crítica da ecologia
política do trabalho na Europa Ocidental nos últimos 25 anos do Século XX. Minha
intenção é refletir sobre o processo dialético histórico pelo qual o marxismo
ocidental enfrentou a crise ecológica, focando em como conceituou-se o trabalho e
a agência da classe trabalhadora em relação à ecologia. Meu argumento é que,
apesar de estar cada vez mais consciente da restrições que impediram a mão de obra
industrial de desenvolver uma resposta apropriada à crise ecológica, os movimentos
trabalhistas europeus foram incapazes de desenvolver uma visão clara da agência de
“cura de rupturas” do trabalho de reprodão (ou trabalho meta-industrial) e da
necessidade de unir estas duas formas de subjetividade laboral em uma aliança de
solidariedade global.
Minha narrativa é construída em torno de quatro intelectuais públicos/as -
Laura Conti, André Gorz, Raymond Williams e Maria Mies - cujas obras representam
diferentes vertentes do marxismo ocidental, e cuja influência se estendeu por vários
movimentos sociais não apenas em seus respectivos países, mas também
internacionalmente. Lendo estes/as autores/as através do respectivo contexto
político-histórico, e pondo-os em diálogo uns com os outros, acredito que podemos:
(1) discernir a trajetória conceitual pela qual o movimento operário da Europa
Ocidental trilhou para abraçar o ecomodernismo; (2) entender como o
ecomodernismo trabalhista é distinto da versão capitalista da Modernização
Ecológica; (3) desenvolver uma crítica construtiva do ecomodernismo trabalhista a
partir de uma perspectiva ecofeminista materialista. A próxima seção delineará
brevemente o atual posicionamento das organizações trabalhistas dentro do cenário
da ecologia política contemporânea, e então introduzirá a hipótese de pesquisa e a
narrativa que será desenvolvida no restante do artigo.
1 O trabalho na ecologia política
O primeiro passo para uma crítica da ecologia política do trabalho é definir os
dois campos, do trabalho e do ambientalismo, como sendo compostos de ações
7
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https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.268.
políticas muito variadas dentro de si mesmas, e cujas áreas de intervenção se
sobrepõem de diversas maneiras. Esta abordagem, por sua vez, se baseia na
compreensão da natureza (e da crise ecológica) não como um objeto de sentido
comum, mas como um conceito contestado que atravessa os campos ambiental e do
trabalho, com conceituações e atuações de maneiras diferentes dentro de cada um
deles.
Um entendimento chave para uma Ecologia Política contemporânea é o de que
o ambientalismo nunca foi um movimento homogêneo, e que diferentes almas
coexistiram dentro dele
16
. Duas formas de ambientalismo, a Modernização Ecológica
(ME)
17
e a Justiça Ambiental (JA)
18
, são particularmente importantes em discutir o
ambientalismo do trabalho. O primeiro, que agora domina discursos ambientais nas
principais ONGs ambientalistas e na política ambiental global (incluindo negociações
climáticas), foi originado como um fluxo norte-europeu de teoria social no início dos
anos 90
19
. Esta linha ofereceu uma visão otimista, vantajosa para ambas as partes,
sobre o reformismo ambiental como um efeito de soluções tecnológicas aliado a
incentivos de mercado, que teria como resultado um giro para sistemas de valor pós-
materialista nas economias industriais. Como na maioria das pesquisas
contemporâneas sobre política ambiental, o conceito “pós-materialista” foi
associado com uma compreensão pós-classe, até mesmo pós-política, do
ambientalismo. Apesar de ser uma teoria altamente contestada, a ME conquistou o
palco central na formulação de políticas ambientais em vários níveis, graças ao seu
ajuste perfeito com a ambientalidade
20
neoliberal
21
. Como Maria Kaika demonstrou
convincentemente, a ME atingiu uma dominância global ao ser incorporada nos
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, nos quais fechou-se o debate
16
GUHA, R.; MARTÍNEZ ALIER, J. Varieties of Environmentalism: Essays North and South. Earthscan,
1997; HARVEY, D. Justice, Nature and the Geography of Difference. Blackwell, 1996.
17
N.T.: no original “EM” que corresponde à Ecological Modernization
18
N.T.: “EJ” que corresponde à Environmental Justice.
19
WHITE, D.; RUDY, A. P.; GAREAU, B. J. Environments, Natures and Social Theory: towards a
critical hybridity. Macmillan Education UK, 2016.
20
N.T.: no original “environmentality” cujo conceito é uma apropriação do debate Foucaultiano sobre
governamentalidade, dentro do contexto ambiental.
21
LUKE, T.W. Environmentality. In: DRYZEK, John S.; NORGAARD, Richard B.; SCHLOSBERG, David
(Ed.). The Oxford Handbook of Climate Change and Society. 2011.
8
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sobre sustentabilidade dentro da "falsa dicotomia de eficiência de mercado versus
responsabilidade pública"
22
. Embora sua “era de inocência” tenha terminado, após
sua cumplicidade com as "novas formas de desocupação e ‘gentrificação
ambiental/ecológica’", amplamente documentada
23
, a ME agora domina a Nova
Agenda Urbana da ONU. Isto acontece, de acordo com Kaika, porque os/as
tomadores/as de decisão optaram por ignorar as vozes de comunidades e movimentos
urbanos que expressam visões dissonantes e alternativas de sustentabilidade voltadas
para a práxis dos espaços do comum.
24
Um argumento semelhante foi apresentado
por Goodman e Salleh
25
a respeito da posição oficial do PNUMA
26
sobre a mudança
climática.
De forma oposta, a Justiça Ambiental global (ou então, o "ecologismo dos
pobres”
27
: representa uma perspectiva subalterna e popular que está ganhando
impulso nas mobilizações climáticas, cada vez mais consciente e pungente na
identificação do capitalismo como o verdadeiro culpado da atual crise ecológica -
como diz Naomi Klein em “Isso Muda Tudo”
28
, e no movimento pela justiça climática
em geral. A não-compatibilidade entre esta perspectiva e a da ME emergiram com
clareza impressionante na Rio+20, Fórum Global de 2012, onde a declaração final
oficial "O futuro que queremos" - uma declaração unívoca de apoio à Modernização
Ecológica através de uma agenda de "crescimento verde" - estava em oposição ao
22
KAIKA, M. ‘Don’t call me resilient again!’: the New Urban Agenda as immunology ellipsis or ellipsis
what happens when communities refuse to be vaccinated with ‘smart cities’ and indicators.
Environment and Urbanization, v. 29, n. 1, 2017. p. 97.
23
KAIKA, M. ‘Don’t call me resilient again!’: the New Urban Agenda as immunology ellipsis or ellipsis
what happens when communities refuse to be vaccinated with ‘smart cities’ and indicators.
Environment and Urbanization, v. 29, n. 1, 2017. p. 91.
24
N.T.: no texto original é utilizado o termo “commoning” o texto “Forças de reprodução: o
ecofeminismo socialista e a luta para desfazer o Antropoceno” traduzido pelo Centro de Estudos
Sociais da Universidade de Coimbra, disponível em: https://journals.openedition.org/eces/5448,
utiliza essa tradução direta para um texto da autora. Nos parece que o mais adequado seria um
conceito mais amplo, que abordasse as próprias práticas de construção do espaço do comum, algo
como “comunização”, contudo manteremos essa tradução a fim de uma maior uniformização de suas
traduções.
25
GOODMAN, J.; SALLEH, A. The ‘Green Economy’: class hegemony and counter-hegemony.
Globalizations, v. 10, n. 3, p. 411424, 2014.
26
N.T.: Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.
27
MARTÍNEZ ALIER, J. The Environmentalism of the Poor. A Study of Ecological Conflicts and
Valuation. Cheltenham, UK: Edward Elgar, 2002.
28
N.T.: livro e documentário, no original chama-se “This Change Everything”
9
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https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.268.
documento alternativo aprovado pela Cúpula dos Povos, "Outro futuro é possível".
Sentadas à mesa oficial e assinando a declaração da CNUCED
29
, a grande maioria das
organizações sindicais se posicionou firmemente dentro do primeiro campo.
Como podemos dar sentido a este posicionamento político do movimento
trabalhista com o ecomodernismo? De acordo com Goodman e Salleh, a Rio +20
sinalizou a existência de um bloco contra-hegemônico global, formado pelo "trabalho
meta-industrial - mulheres cuidadoras urbanas, agricultores/as de subsistência e
indígenas" que representam as categorias mais atingidas pela ruptura metabólica.
Goodman e Salleh
30
veem a Cúpula dos Povos como um passo importante no processo
dessa "classe" global se tornar consciente de sua subjetividade política e ecológica.
Mesmo concordando amplamente com esta visão, creio que não devemos esquecer
que a divisão entre os blocos ME e JA é interna a uma frente de sustentabilidade
amplamente definida, que se opõe à continuação do crescimento econômico
direcionado para a exploração fóssil (com a recente adição de novas fronteiras
extrativistas no fraturamento hidráulico, gás de xisto e minerais raros) que
caracteriza a maior parte da economia mundial. Além disso, precisamos considerar
que, assim como o ambientalismo, o movimento trabalhista não é homogêneo,
portanto, a linha divisória entre sustentabilidade e o modelo costumeiro de
negócios
31
também atravessa este campo. Uma literatura emergente em Estudos
Ambientais do Trabalho
32
mostra como a adoção generalizada de um discurso de
crescimento/modernização ecológica por parte de muitas centrais sindicais se traduz
29
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
30
GOODMAN, J.; SALLEH, A. The ‘Green Economy’: class hegemony and counter-hegemony.
Globalizations, v. 10, n. 3, p. 411424, 2014.
31
N.T.: Business as usual.
32
RÄTHZEL, N.; UZZELL, D. Mending the breach between labor and nature: a case for environmental
labor studies. In: RÄTHZEL, N.; UZZELL, D. (Ed.). Trade Unions in the Green Economy. Routledge,
2013. p. 112; FELLI, R. An alternative socio-ecological strategy? International trade unions’
engagement with climate change. Review of International Political Economy, v. 21, n. 2, p. 372
398, 2014; COCK, J. The “Green Economy”: a just and sustainable development path or a “Wolf in
Sheep’s Clothing”? Global Labour Journal, v. 5, n. 1, p. 2344, 2014.
10
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em pouca ação efetiva em razão da resistência interna proveniente de uma série de
setores, bem como sinais contrastantes vindos de empregadores e governos
33
.
A partir disso, embora as centrais/confederações internacionais tenham se
alinhado com o bloco hegemônico, uma série de organizações trabalhistas (como a
Via Campesina/MST) se posicionaram com o bloco contra-hegemônico, e alguns
sindicatos endossam a Justiça Ambiental ou mesmo uma agenda anticapitalista
34
: a
tendência mais comum, nesse caso, é a de adotar uma abordagem de sindicalismo
social, formando grandes coalizões com organizações defensoras da justiça
ambiental e social. Além de todas as dificuldades que tipicamente enfrentam
construções de coalizões, essas experiências enfrentam a oposição até mesmo de
governos potencialmente progressistas: foi o caso da Espanha, onde uma Coalizão
Climática (Coalición Clima) foi fundada em 2008 por 30 ONGs ambientais, sindicatos,
pesquisadores, organizações de consumidores e cooperativas, que apresentaram três
projetos de lei (sobre mobilidade, energia e taxação ambiental), todos rejeitados
pelo governo, à época, socialista
35
.
Passando da escala global para a escala europeia, no entanto, podemos dizer
que a maioria das organizações trabalhistas, representadas pela Confederação
Europeia de Sindicatos
36
, estão inequivocamente se alinhando com o bloco do
"crescimento verde", defendendo uma estratégia baseada na chamada Transição
Justa, consistente em investimentos públicos e incentivos fiscais para a criação de
33
BURGMANN, V. From ‘jobs versus environment’ to ‘green-collar jobs’: Australian trade unions and
the climate change debate. In: RÄTHZEL, N.; UZZELL, D. (Ed.). Trade Unions in the Green Economy.
Routledge, 2013. p. 131145; SNELL, D.; FAIRBROTHER, P. Just transition and labour environmentalism
in Australia. In: RÄTHZEL, N.; UZZELL, D. (Ed.). Trade Unions in the Green Economy. Routledge,
2013. p. 146161; STEVIS, D. Green jobs? Good jobs? Just jobs? US labour unions confront climate
change. In: RÄTHZEL, N.; UZZELL, D. (Ed.). Trade Unions in the Green Economy. Routledge, 2013.
p. 179195; SWEENEY, P. US trade unions and the challenge of “extreme energy”: the case of the
TransCanada Keystone XL pipeline. In: RÄTHZEL, N.; UZZELL, D. (Ed.). Trade Unions in the Green
Economy. Routledge, 2013. p. 196213.
34
MURILLO, L. From sustainable development to a green and fair economy: making the environment
a trade union issue. In: RÄTHZEL, N.; UZZELL, D. (Ed.). Trade Unions in the Green Economy.
Routledge, 2013. p. 2940; GINGRICH, S. From blue to green: a comparative study of blue-collar
unions’ reactions to the climate change threat in the United States and Sweden. In: RÄTHZEL, N.;
UZZELL, D. (Ed.). Trade Unions in the Green Economy. Routledge, 2013. p. 214226.
35
GIL, B.M. Moving towards eco-unionism: reflecting the Spanish experience. In: RÄTHZEL, N.;
UZZELL, D. (Ed.). Trade Unions in the Green Economy. Routledge, 2013. p. 6477.
36
N.T.: European Trade Unions Confederation.
11
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empregos de colarinho azul
37
nos setores de “energia limpa”, transporte e
construção
38
. Iniciativas nacionais como a campanha “Um Milhão de Empregos
Climáticos” no Reino Unido (e mais recentemente na Noruega, Portugal e França
39
)
representam a versão mais avançada dessa posição, no sentido de que elas têm como
objetivo superar divisões internas dentro da frente de batalha no campo do trabalho
e construir maiores coalizões sociais para se que mobilizem ativamente para a
adoção de um programa de empregos verdes (ou empregos climáticos). Esse
posicionamento estratégico certamente tem a ver com o fato de que o trabalho está
enfrentando uma das mais sérias e duradouras crises das últimas décadas, assim a
perspectiva de empregos verdes/climáticos aparece como a mais suscetível de
estimular consenso social e político.
O problema com a estratégia de Transição Justa, como argumentei em outro
lugar, é que ela está bloqueando o trabalho ainda mais firmemente com a
continuação do capitalismo e do trabalho assalariado no modo "verde" - construído
sobre a perpetuação de uma divisão de trabalho baseada no gênero e na raça em
escala mundial - excluindo uma discussão séria de diferentes perspectivas e
alternativas mais radicais, e, portanto, a possibilidade de erradicar efetivamente as
causas estruturais tanto ecológicas como sociais das desigualdades
40
. A esse respeito,
o ecomodernismo trabalhista apresenta uma semelhança impressionante com o caso
da Nova Agenda Urbana destacado por Kaika
41
. Em ambos os casos, o endosso da ME
por parte das lideranças políticas e sindicais repousa sobre um desrespeito pelas
vozes dissidentes e práxis alternativas que se localizam fora do capitalismo (verde),
reivindicando a preeminência social da reprodução, valor de uso e os bens comuns -
em suma, do trabalho meta-industrial. Para uma crítica ao ecomodernismo
37
N.T.: termo geralmente usado para referir-se a trabalhadores braçais no contexto urbano.
38
EUROPEAN TRADE UNIONS CONFEDERATION (ETUC). Action Programme 20152019. 2015.
Disponível em: www.etuc.org. Acesso em: 13 dez. 2024.
39
Veja o site oficial da campanha “Um milhão de empregos climáticos”:
https://globalclimatejobs.wordpress.com/.
40
BARCA, S. Greening the job. Trade unions, climate change and the political ecology of labour. In:
BRYANT, R. (Ed.). International Handbook of Political Ecology. London: Edward Elgar, 2015.
41
KAIKA, M. ‘Don’t call me resilient again!’: the New Urban Agenda as immunology ellipsis or ellipsis
what happens when communities refuse to be vaccinated with ‘smart cities’ and indicators.
Environment and Urbanization, v. 29, n. 1, 2017.
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trabalhista, as questões-chave se tornam então: que ideias e práticas alternativas
foram historicamente embutidas no ambientalismo do trabalho? Como foi que os
movimentos trabalhistas chegaram a abraçar a Modernização Ecológica?
Um bom ponto de partida para responder a essas perguntas é considerar as
raízes intelectuais da ecologia política marxista na Europa Ocidental, identificando
as tensões e contradições internas que derivam de leituras divergentes de Marx e
Engels, bem como provenientes dos próprios trabalhos de Marx
42
. Nesse vasto debate
teórico, destacarei aqui dois pontos que parecem particularmente relevantes para
uma crítica da ecologia política do trabalho na Europa Ocidental. A primeira diz
respeito à própria noção de trabalho na sociedade (eco)socialista: de acordo com
J.B. Foster
43
, a tradição marxista contém duas visões diferentes: uma centrada no
potencial social da tecnologia, organização científica e automação, levando à
progressiva redução do tempo de trabalho e ao aumento do tempo de lazer; a outra
centrou-se na desalienação do trabalho e na consequente liberação completa das
potencialidades para o desenvolvimento humano. Para Foster, a segunda visão por si
- que ele traça de William Morris a Marx - conduziria a "uma sociedade
verdadeiramente sustentável"
44,45
. Ele critica a primeira visão, traçada desde o
42
BURKETT, P. Marx and Nature: A Red and Green Perspective. New York: St. Martin’s, 1999; CLARK,
B. Marx’s natures: a response to foster and Burkett. Organization & Environment, v. 14, n. 4, p. 432
442, 2001; FOSTER, J.B. Marx’s Ecology. Materialism and Nature. Monthly Review Press, 2000;
MOORE, J.W. Ecology, capital, and the nature of our times: accumulation & crisis in the capitalist
world-ecology. Journal of World-Systems Research, v. XVII, n. 1, p. 108147, 2011.
43
FOSTER, J.B. The Meaning of Work in a Sustainable Society: A Marxian View. CUSP Essay Series on
the Morality of Sustainable Prosperity No 3. 2017, p. 4. Disponível em:
http://www.cusp.ac.uk/essay/m1-3/. Acesso em: 13 dez. 2024.
44
FOSTER, J.B. The Meaning of Work in a Sustainable Society: A Marxian View. CUSP Essay Series on
the Morality of Sustainable Prosperity No 3. 2017, p. 4. Disponível em:
http://www.cusp.ac.uk/essay/m1-3/. Acesso em: 13 dez. 2024.
45
A diferença entre as duas visões reside no valor atribuído ao trabalho: trabalho sem sentido, mas
necessário no primeiro caso, atividade potencialmente criativa no segundo. Claramente, tal distinção
só pode suportar em termos abstratos, enquanto na experiência histórica dos seres humanos as duas
formas de trabalho coexistem e se complementam; na realidade um não poderia existir sem o outro.
Assim são as duas formas de luta: para aquelas atividades que são principalmente dolorosas ou
repetitivas e que não podem ser eliminadas mesmo em um sistema social desalienado, o controle
democrático sobre a tecnologia e a organização será necessário para reduzi-los ao mínimo, para serem
realizados da melhor maneira possível. Todas as demais atividades, nas quais a criatividade e a
realização do potencial humano podem ser alcançadas, devem ser socializados o máximo possível,
para que eles não permaneçam uma prerrogativa de certas classes sociais, e de um gênero apenas.
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escritor americano Edward Bellamy, por "tomar a produção como econômica e
tecnologicamente determinada” e concentrar-se no lazer como um fim social maior:
uma tendência que ele vê representada hoje pelo movimento de decrescimento,
através da influência de André Gorz.
O segundo ponto do debate ecomarxista que é de particular relevância aqui
diz respeito à ideia, avançada por Foster e Clark
46
em um ensaio anterior, de que os
marxistas europeus têm sido influenciados principalmente pela crítica da Escola de
Frankfurt à "dominação da natureza", uma postura filosófica anti-iluminista que,
embora fundamentada em escritos do jovem Marx, tinha "levado ao afastamento dos
pensadores desta tradição não só do Marx tardio, mas também da ciência natural e,
portanto, da própria natureza"
47
. De acordo com os autores, isso explica porque o
marxismo ocidental estava mal equipado para responder à ascensão do movimento
ambiental na década de 1960, e permaneceu assim até que uma "segunda etapa do
ecossocialismo" surgiu no final dos anos 90, baseada em uma nova leitura da ecologia
como um conceito científico inerente ao pensamento de Marx.
Com o objetivo de explicar a convergência dos movimentos trabalhistas com
a modernização ecológica, este artigo se afasta dos dois pontos acima em vários
aspectos. Focando nos últimos 25 anos do Século XX, um período no qual a influência
do marxismo ocidental sobre os movimentos trabalhistas ainda era forte, embora em
declínio, mostro como a distinção entre as duas visões de trabalho destacadas por
Foster tinham se tornado cada vez mais turvas, sendo desafiada por várias
contribuições provenientes do cenário político e econômico em transformação. Eu
argumento que o centro dessas mudanças foi a questão da agência política e da
subjetividade: em outras palavras, a questão de qual deve ser o papel do movimento
trabalhista (e da classe trabalhadora em geral) na revolução ecológica. Localizo a
perspectiva de "libertação do trabalho" de Gorz dentro desse cenário político,
conectando-a com as visões político-ecológicas contemporâneas desenvolvidas na
46
FOSTER, J.B.; CLARK, B. Marx’s ecology and the left. New Left Review, n. 68, 2016. Disponível em:
https://monthlyreview.org/2016/06/01/marxs-ecology-and-the-left/. Acesso em: 13 dez. 2024.
47
FOSTER, J.B.; CLARK, B. Marx’s ecology and the left. New Left Review, n. 68, 2016. Disponível em:
https://monthlyreview.org/2016/06/01/marxs-ecology-and-the-left/. Acesso em: 13 dez. 2024.
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Itália e no Reino Unido. Em relação ao segundo ponto, mostro como a distinção entre
o marxismo ocidental e o ambientalismo também foi bastante esbatida, já que as
preocupações ecológicas estavam sendo elaboradas, com mais ou menos referência
direta a Marx, de dentro do próprio movimento trabalhista. Irei construir uma
narrativa alternativa, procurando rastrear as conexões entre as preocupações
sindicais e ambientais enquanto eram reformuladas através de um processo dialético
que envolvia tensões e convergências entre o marxismo (ou melhor, várias formas de
Marxismos Ocidentais) e uma variedade de movimentos políticos em todo o espectro
da esquerda, nomeadamente: o movimento trabalhista, o ecologista (especialmente
movimentos antinucleares), o feminista e o do decrescimento.
A narrativa deste artigo é a seguinte: em meados da década de 1970, uma
versão inicial da ecologia política marxista tinha tomado forma na Itália, que
encontrou expressão no trabalho da política comunista e intelectual Laura Conti
(Seção 2). Com base em um entendimento da ecologia como a ciência das inter-
relações biofísicas, e sobre uma visão de ecossocialismo como planejamento baseado
na ciência, essa ecologia política vislumbrou uma forte classe trabalhadora
urbana/industrial como o único sujeito político capaz de conduzir o resto da
sociedade em direção ao horizonte ecossocialista. Nesse sentido, pode ser
considerada uma expressão precoce do modernismo ecológico do trabalho, que
repousava sobre o poder progressivo das forças produtivas, entendidas como
trabalhadores masculinos de colarinho azul da indústria pesada e infraestruturas. Nos
mesmos anos, uma perspectiva ecológica política diferente vinha do intelectual
austríaco-francês André Gorz (Seção 3): também baseada em uma compreensão
científica da ecologia, esta posição difere da anterior na medida em que refletia o
descontentamento contemporâneo com as ideias tradicionais da subjetividade da
classe trabalhadora e da ideologia do trabalho, ao mesmo tempo quebrando o nexo
entre o desenvolvimento das forças produtivas (ou crescimento econômico) e o
planejamento ecológico socialista. Em Gorz, o sujeito ecológico revolucionário deixa
de ser o trabalhador masculino de colarinho azul para se tornar um sujeito social
indefinido e multifacetado que se recusa à identificação baseada em classe obreira.
15
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Essa posição reflete uma crise incipiente de movimentos trabalhistas, consequentes
de uma complexa reestruturação e terceirização dos mercados de trabalho nas
economias centrais da Europa Ocidental entre os anos 70 e 80. Conjuntamente com
o surgimento de um forte movimento verde nesses mesmos países, aglutinado por
uma posição antinuclear em comum (uma posição que os movimentos trabalhistas
não estavam prontos para tomar), os anos oitenta marcaram uma divergência entre
estes últimos e o movimento ecologista, e a consolidação da defesa do crescimento
econômico a qualquer custo por parte da esquerda convencional. Essa crescente
divergência e oposição formou a tendência política para a qual um proeminente
marxista britânico e intelectual como Raymond Williams sentiu a necessidade de
responder (Seção 4), oferecendo seu próprio conhecimento marxiano (mas também
polanyiano sobre a subsistência, ou reprodução, como base comum entre o trabalho
e as preocupações ambientais. Marcando um claro afastamento das visões anteriores
da ecologia como planejamento baseado na ciência, Williams estimulou o movimento
trabalhista a se afastar da ideologia da produção que o manteve refém do
desenvolvimento das forças produtivas capitalistas. Ao contrário de Gorz, porém, ele
sustentou que o sujeito político para a revolução ecológica só poderia ser o
movimento obreiro - uma vez que este tinha elaborado a necessária "alteração
qualitativa do socialismo".
Resumindo a narrativa até agora: enquanto o ecossocialismo de Conti era
construído sobre o ponto da produção, Gorz e Williams apontaram para reprodução
(ou subsistência) como o terreno onde uma ecologia política do trabalho diferente
poderia ter sido construída. Para que isso se tornasse uma visão hegemônica do
ambientalismo do trabalho, no entanto, faltou algo: a reprodução precisava ser
teorizada mais claramente como detentora da agência política e subjetividade. Esse
foi um passo que o movimento feminista havia tomado na década anterior, sem poder
realizar a triangulação necessária com o trabalho e o ambientalismo. A
intelectual/ativista alemã Maria Mies exemplifica esse ponto (Seção 5): partindo de
uma crítica das divisões sexual e colonial do trabalho que estão subjacentes à
acumulação capitalista, Mies repensou a relação trabalho/ecologia com base na
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centralidade social do trabalho reprodutivo. Essas ideias, desenvolvidas em um
período de grande agitação para o socialismo europeu devido à queda do bloco
soviético, foram fundamentais para o desenvolvimento do pensamento ecofeminista
materialista, mas não influenciaram a evolução do ambientalismo do trabalho. Na
realidade, na virada do século 20, a maioria das organizações sindicais e partidos de
esquerda na Europa Ocidental haviam se afastado do ecossocialismo e estavam
oficialmente abraçando a perspectiva de Modernização Ecológica hegemônica. A
desconexão entre o movimento trabalhista e o ecofeminista, como argumento nas
conclusões (Seção 6), impediu o primeiro de completar a "alteração qualitativa do
socialismo" que precisava para enfrentar a crise ecológica em seus próprios termos,
sem sucumbir à lógica do capitalismo verde. Aberturas para a compreensão
ecofeminista materialista do trabalho e da subjetividade política poderiam ter
levado os movimentos trabalhistas ocidentais a uma convergência com a perspectiva
da Justiça Ambiental global.
A próxima seção identifica a Itália como o local no qual a ecologia política do
trabalho tomou forma desde a tradição política marxista em meados dos anos 70, e
então desenvolveu-se em movimentos sociais de massa, uma década depois
rescindindo sua relação original com o marxismo.
2 A “ecologia da classe trabalhadora”. Laura Conti e a esquerda italiana
Desde os anos 70, a tese da crise ecológica como uma contradição do
capitalismo apareceu na Itália por meio daquele que foi à época o maior partido
comunista na Europa Ocidental, o PCI
48
. Durante a escola de quadros realizada em
1941 em Frattocchie (notadamente, um ano antes da publicação do relatório ‘Os
limites do crescimento’ pelo Clube de Roma), o PCI tinha realizado sua primeira
conferência nacional com o tema “Homem
49
, natureza e sociedade” na qual o
48
N.T.: Partido Comunista Italiano.
49
N.T.: Conforme escrito no original.
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membro executivo do partido Giovanni Berlinguer
50
admitiu a necessidade de uma
atualização na ortodoxia marxista a fim de que seja levado em conta o conceito de
limites naturais. Ele comparou a ecologia com o planejamento socialista e enfatizou
a necessidade de o partido considerar o meio ambiente como uma prioridade da
classe trabalhadora
51
. Alguns anos depois, a intelectual pública e representante do
PCI, Laura Conti, publicou seu livro “O que é Ecologia - capital, trabalho e ambiente”
[Che cos’è l’ecologia. Capitale, lavoro, ambiente, 1977], que oferecia uma
teorização dessa nova visão e a elaboração de uma estratégia política
correspondente. Uma médica por treinamento e uma apaixonada escritora científica,
Conti tornou-se uma figura proeminente no nascimento de um movimento verde-
vermelho
52
. Ela definiu a ecologia política como o estudo de como as relações sociais
dentro da espécie humana influenciam o mundo natural e outras espécies e descreve
a ecologia como a relação metabólica entre sociedade e meio ambiente. A tese chave
nesse livro foi a de que esta teia de interrelações tão complexas entre mecanismos
naturais e sociais carecem de uma boa dose de planejamento ambiental, para serem
democraticamente definidos e governados. A luta contra aqueles que destroem a
natureza, “as nossas vidas e de outras espécies”, como Conti escreveu, não pode ser
deixada nas mãos do mercado ou de qualquer eco-tecnocracia, mas precisa ter a
sociedade como protagonista e especificamente uma classe social: aquela que se
opõe ao capital. Conti acreditava que, em defender não apenas os próprios
interesses, mas a humanidade em si como parte da natureza, a classe trabalhadora
pode achar solidariedades e coalizões substanciais com a sociedade.
A relação dos movimentos trabalhistas com os ecologistas foi um tópico um
tanto marginal na abordagem de Conti: ela tomou nota de passagem da antipatia
entre trabalhadores (industriais) e ambientalistas, porém para ela isso representava
50
Giovanni era o irmão mais novo de Enrico Berlinguer, que se tornou secretário geral do PCI em 1972.
Médico por formação, ele foi autor de inúmeros trabalhos sobre o história da medicina e tornou-se
uma referência para a ciência marxista da saúde ocupacional na Itália e além dela.
51
GRAF VON HARDENBERG, W.; PELIZZARI, P. The environmental question, employment and
development in Italy’s left. Left History, n. 2, p. 77104, 2008.
52
BARCA, S. ‘Work, bodies, militancy: the “class ecology” debate in 1970s Italy’. In: BOUDIA, S.; JAS,
N. (Ed.). Powerless Science? Science and Politics in a Toxic World. Berghahn Books, 2014.
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uma reação saudável da classe trabalhadora em oposição a um certo tipo de
ambientalismo (de classe-média) baseado em moralismos condenatórios do consumo
de massa e na defesa de algum mamífero carismático
53
. Ao invés de ser
filosoficamente fundamentada na improvável aliança com esse tipo de
ambientalismo, a ecologia política de Conti fundamentou-se no conceito de
alienação de seres vivos em Marx. Para ela, isso apontou para a necessidade das
organizações de trabalhadores desenvolverem seu próprio reformismo ecológico
revolucionário, i.e. uma “ecologia de classe trabalhadora”, a fim de contrapor por
dentro o abuso do capitalismo para com o meio ambiente
54
.
A “ecologia de classe trabalhadora, contudo, foi guiada por uma contradição
interna irredutível, da qual Conti estava criticamente consciente, o que eu chamarei
de “dilema ecomodernista do trabalho”: o avanço de uma consciência ecológica da
classe trabalhadora era consequência do desenvolvimento das forças de produção,
no sentido de que apenas um avanço do aparato industrial poderia garantir níveis
ocupacionais e força política necessária para a classe trabalhadora desenvolver seu
papel como defensora do meio ambiente. Na visão de Conti, o ambientalismo do
trabalho precisava lidar com essa contradição: ela pensou que uma resposta possível
seria a esquerda pressionar para o desenvolvimento de setores industriais que
garantissem os maiores níveis ocupacionais com os relativos menores impactos
ambientais. Ela observou que embora apenas soluções temporárias e limitadas como
essa poderiam ser encontradas, essa era uma luta que o movimento trabalhista não
poderia mais postergar.
A resposta de Conti para a crise ecológica foi, de alguma maneira,
representativa da linha “oficial” adotada pelo partido comunista a esse respeito -
ou, pelo menos, a que era mais aceita entre a política eurocomunista no final dos
anos 70 e início dos 80: ao invés de rejeitar a modernidade industrial na sua
completude, os comunistas tiveram que exercer seu poder dentro e fora do
parlamento italiano para manter o poder destrutivo das forças de produção à
53
CONTI, L. Che cos’è l’ecologia. Capitale, lavoro, ambiente. Mazzotta, 1977. p. 140.
54
CONTI, L. Che cos’è l’ecologia. Capitale, lavoro, ambiente. Mazzotta, 1977. p. 136-139.
19
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distância, via controle democrático. Essa democratização da produção começou pelo
local de trabalho, onde uma nova metodologia de controle participativo dos
trabalhadores da indústria foi elaborada em colaboração entre as confederações
sindicais e grupos de cientistas militantes, e alcançaram uma grande parte da
sociedade via instituições públicas nas quais os movimentos trabalhistas estavam
lutando com afinco nesses mesmos anos, tal como o sistema de saúde público
55
.
A abordagem da “ecologia de classe trabalhadora”, entretanto, apresentou
outras limitações, tanto internas quanto externas. Para começar, a estratégia de
controle dos trabalhadores sobre a toxicidade da indústria via sindicatos e
instituições públicas foi altamente vulnerável aos ciclos de recessão econômica,
especialmente na produção industrial, nos quais tornavam-se restritas as
possibilidades para o capital investir nas medidas de saúde e segurança, além de
prejudicar o poder de negociação dos sindicatos no local de trabalho. A estratégia
também ofuscou as diferenciações geográfica, setoriais e de gênero dentro da classe
trabalhadora italiana: não apenas provou-se fracassada no Sul “subdesenvolvido”,
mas também reforçou a noção implícita de que os homens de colarinho azul da
indústria pesada fossem detentores da única forma de mobilização política
significativa em políticas sociais - da ambiental à saúde pública - que implicavam em
significâncias e subjetividades muito mais amplas.
Não obstante, essa abordagem produziu resultados importantes quanto às
convergências entre a política verde e vermelha, entre as quais a fundação da Liga
Italiana pelo Meio Ambiente (Legambiente), hoje uma ONG bem estabelecida, criada
em 1979 como uma subseção do Setor Recreativo do PCI. Conti desempenhou um
papel central na fundação da nova organização, conjuntamente com uma porção de
55
BARCA, S. Bread and poison. The story of labor environmentalism in Italy, 19681998. In: MELLING,
J.; SELLERS, C. (Ed.). Dangerous Trade. Histories of Industrial Hazards across a Globalizing World.
Temple University Press, 2012. Disponível em português com o título: BARCA, S. Pão e veneno:
reflexões para uma investigação sobre o ‘ambientalismo do trabalho’ em Itália, 1968-1998. In:
Laboreal, Volume 6, Nº2, 2010. Disponível em: https://journals.openedition.org/laboreal/8590.
Acesso em: 06 dez. 2024; N.T.: o Sistema Nacional de Saúde Pública foi conquistado em 1978, o artigo
referenciado explica com profundidade a luta para sua criação.
20
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intelectuais com expressão pública que compartilhavam uma militância em comum
no PCI
56
.
Durante as décadas de 1980 e 1990, a estratégia de "ecologia de classe
trabalhadora" foi profundamente desafiada pela estrutura econômica italiana em
transformação, com a terciarização e depois a precarização da força de trabalho, e
as preocupações ambientais mudaram gradualmente da produção ao consumo
57
.
Consequentemente, a Legambiente começou a se desprender do PCI, recusando
estratégias centralizadas e promovendo, ao invés disso, formas de organização
territorial "fora do local de trabalho, e longe de qualquer lógica de defesa
econômica”
58,59
. A separação definitiva veio em 1986, juntamente com uma escolha
de relações privilegiadas com o Partido Verde nas eleições locais e nacionais. A crise
da abordagem da "ecologia de classe trabalhadora" tornou-se clara quando a
Esquerda (partidos comunistas e socialistas e o sindicato CGIL
60
) dividiu-se em duas
frentes opostas em relação ao referendo antinuclear promovido pelos Verdes e
organizações ecologistas em 1987
61
.
A Legambiente mover-se da fábrica para o território refletiu um processo
histórico de divisão interna na esquerda italiana, mais do que entre organizações
ambientais e de trabalhadores, uma divisão que tornou-se mais evidente após o racha
do PCI em duas formações políticas distintas em 1991. Isso coincidiu com um giro
acentuado no debate ecomarxista, que encontrou expressão na revista “Ecologia
56
Entre eles, o ecologista urbano Virginio Bettini, que tinha sido co-autor com Barry Commoner de
um livro chamado ecologia e luta sociais. Meio ambiente, população e poluição (1976), apresentando
a tese das duas ecologias (ecologia do poder e ecologia da classe), que se tornou um manifesto político
para a ecologia de esquerda italiana. Mais um membro fundador da Legambiente foi o químico Giorgio
Nebbia, também um conhecido acadêmico e autor de vários livros e panfletos sobre ecologia política
(BARCA, S. ‘Work, bodies, militancy: the “class ecology” debate in 1970s Italy’. In: BOUDIA, S.; JAS,
N. (Ed.). Powerless Science? Science and Politics in a Toxic World. Berghahn Books, 2014).
57
DELLA SETA, R. La difesa dell’ambiente in Italia. Franco Angeli, 2000; DELLA PORTA, D.; DIANI, M.
Movimenti senza protesta? L'ambientalismo in Italia. Il Mulino, 2004.
58
A alegação é atribuída a Andrea Poggio, jornalista e autora, uma das fundadoras do Legambiente e
diretora da revista La Nuova Ecologia entre 1980 e 1984.
59
DELLA SETA, R. La difesa dell’ambiente in Italia. Franco Angeli, 2000, p. 50-51.
60
N.T.: Italian General Confederation of Labour.
61
DELLA SETA, R. La difesa dell’ambiente in Italia. Franco Angeli, 2000, p. 50-51.
21
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BARCA, Stefania. Trabalho e crise ecológica: o dilema ecomodernista no(s) marxismo(s) ocidental(is) (1970s-2000s).
Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano, Campinas, v. 7, p. 1-42, 2024. DOI:
https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.268.
Política - Capitalismo, Natura, Socialismo”
62
fundada em 1991. A revista introduziu
a tese da crise ecológica como a “segunda contradição” do capital, apresentada pelo
acadêmico estadunidense James O'Connor em sua introdução ao primeiro número do
CNS
63,64
, enquanto popularizava também diferentes versões do pensamento
ecológico radical
65
.
Em resumo: ao invés de representar uma virada da abordagem materialista
para a pós-materialista do ambientalismo - no qual o materialismo é reduzido a uma
“defesa econômica” - os ecologistas políticos italianos expressaram um giro mais
específico: desde a hegemonia política do PCI, voltado para a hegemonia ideológica
do proletariado industrial urbano, para uma perspectiva popular e territorial da
ecologia, onde uma diversidade de subjetividades sociais deveriam ser agregadas
para a defesa de condições de produção contra a toxicidade industrial. Esse giro,
contudo, veio depois de o próprio conceito de classe trabalhadora ter sido submetido
a uma crítica político-ecológica radical. Vamos agora examinar essa crítica.
3 Adeus à ecologia da classe trabalhadora. André Gorz e a “libertação do
trabalho”
Em 1977, o mesmo ano em que “O que é ecologia?” de Conti foi lançado na
Itália, a noção de crise ecológica enquanto uma questão política de especial
relevância para o socialismo estava sendo levantada, por motivos radicalmente
62
A revista, é uma publicação irmã da família internacional do eco-marxismo ocidental - a saber, em
conexão com o Capitalismo Nature Socialism, com sede nos EUA, A Écologie et Politique francesa, e
a Ecología Política espanhola, foi dirigida por Giovanna Ricoveri e Valentino Parlato (que também foi
o diretor do jornal Il Manifesto).
63
O’CONNOR, James. Natural Causes: Essays in Ecological Marxism. New York: Guilford, 1998.
64
O artigo postulava que o ponto de partida do socialismo ecológico era a contradição entre as forças
capitalistas, as relações de produção e as "condições de produção", que ele considerava - seguindo
Polanyi - como "mercadoria fictícia". Esta contradição causaria uma crise ecológica como uma "crise
de subprodução", ou seja, uma versão não-malthusiana da escassez, em que o capital induz a
destruição das condições da produção. Este tipo de escassez, acreditava O'Connor, levaria a uma
maior socialização da produção, via planejamento econômico e regulamentações ambientais, assim
criando a possibilidade de um caminho ecológico para o socialismo.
65
Exemplos são a crítica de Mumford à tecnologia, ou a crítica de Sachs e Latouche ao
desenvolvimento ocidental. Para uma lista (parcial) de artigos publicados nos anos 90, ver: http://
www.ecologiapolitica.org/wordpress/?page_id=1245.
22
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diferentes, pelo intelectual austríaco-francês André Gorz em seu ensaio “Ecologia e
Liberdade”
66
, publicado pela primeira vez na França como “Écologie et Liberté
(1977). Inspirado por uma espécie de socialismo humanista derivado de uma
variedade de influências marxistas não ortodoxas (desde o existencialismo de Sartre
e a crítica de Marcuse à dominação, até ao movimento estudantil de maio de 1968 e
o chamado marxismo autônomo italiano), Gorz introduziu o tema da natureza como
um limite externo ao crescimento e definiu ecologia política como a luta por uma
política ambiental democrática e emancipatória. O ensaio apresentou a crise
ecológica como uma crise de reprodução por superacumulação, e expôs os riscos do
produtivismo econômico derivado do trabalho decorrente de uma adoção acrítica do
ethos produtivista - uma tese que ele desenvolveu em toda a sua extensão em sua
posterior “Crítica da Razão Econômica”
67
[Métamorphoses du travail,1988]. A
ecologia política de Gorz não se destinava, portanto, apenas como uma crítica do
modo de produção capitalista, mas também como instrumento de libertação das
categorias conceituais que constrangia o movimento trabalhista dentro da ordem
capitalista: um projeto político "capaz de, ao mesmo tempo, superar o capitalismo
e transformar o próprio socialismo"
68
. Também em escritos posteriores, ele manteve
um esforço constante no diálogo com várias organizações trabalhistas, e com
sindicatos em particular, convidando-os a desafiar a "ideologia do trabalho"
69
.
Gorz não viu a superação do industrialismo capitalista como um retorno à
ordem pré-industrial do artesanato e do feudo medieval. Ao contrário, ele
desenvolveu uma utopia socialista onde as pessoas recuperaram o controle sobre a
tecnologia industrial, não através de formas centralizadas de planejamento estatal,
mas através da autogestão individual e comunitária. Se a ecologia não era compatível
com a racionalidade capitalista, não era compatível com o socialismo autoritário
também. Além disso, como a ecologia, a tecnologia não era socialmente neutra:
66
GORZ, A. Ecology and freedom. In: Ecology as Politics. South End Press, 1979.
67
GORZ, A. Critique of Economic Reason. Verso, 1989.
68
LEONARDI, E. Introduzione. In: GORZ, A. (Ed.). Ecologia e libertà. Orthotes, 2015. p. 17.
69
GORZ, A. Critique of economic reason: summary for trade unionists and other left activists. In:
MUNCK, R.; WATERMAN, P. (Ed.). Labour Worldwide in the Era of Globalization. Alternative Union
Models in the New World Order. Palgrave Macmillan, 1999.
23
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apenas aquelas tecnologias que eram compatíveis com o capitalismo (ou, com o
socialismo de Estado) em seu impulso para o crescimento quantitativo da produção
- independentemente de considerações qualitativas - tinham sido desenvolvidas até
o momento. O exemplo mais claro seria o da energia nuclear, pressupondo uma
ordem social autoritária de fato. Consequentemente, a luta por uma sociedade
diferente passou através da luta por diferentes tecnologias: "O socialismo não é
melhor que o capitalismo se não troca as ferramentas”
70
. Apenas aquelas tecnologias
que podem ser controladas em escala comunitária, trazendo maior autonomia
individual e local, preservem a reprodução da vida e facilitem o controle de
produtores e consumidores deveriam ser desenvolvidas
71
.
A ecologia política de Gorz foi um chamado intelectual para o movimento
trabalhista para a transformação do socialismo. Entretanto, o livro mais popular de
longe de Gorz, o “Adeus ao proletariado” teve muito mais impacto,
significativamente com o subtítulo “Um ensaio sobre o socialismo pós-industrial
72
(primeiramente publicado na França como "Adieux au Prolétariat" (1980) e dois anos
depois traduzido para o inglês e o italiano). O livro apresenta a tese de que chegou
a hora dos movimentos trabalhistas se emanciparem da ideologia (e ética) do
trabalho como emprego e deslocarem-se no sentido de uma revolução pós-industrial
no plenamente reconhecido novo sujeito histórico formado pela “não-classe do
proletariado pós-industrial"
73
. Publicado no limiar da desindustrialização à
reestruturação pós-fordista da produção na Europa Ocidental, o livro previu o fim da
era do pleno emprego e do bem-estar keynesiano, para ser substituída por uma
sociedade de "tempo livre" baseada na produção autônoma de valor de uso - uma
tese que soou, à época, fresca e oportuna. A ideia central que apresentou era, no
entanto, muito antiga e até fundadora do pensamento marxista: "o comunismo não
70
GORZ, A. Ecologica. Seagull, 2010. p. 9.
71
GORZ, A. Ecology and freedom. In: Ecology as Politics. South End Press, 1979.
72
GORZ, A. Farewell to the Working Class. An Essay on Post-Industrial Socialism. Pluto Press, 1982.
N.T.: no Brasil a monografia foi lançada com o título “Adeus ao Proletariado: para além do
socialismo”.
73
GORZ, A. Farewell to the Working Class. An Essay on Post-Industrial Socialism. Pluto Press, 1982.
p. 66.
24
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é nem pleno emprego nem um salário para todos - escreveu Gorz - mas a eliminação
do trabalho na forma social e historicamente específica presente no capitalismo. Ou
seja, é a eliminação do trabalho como emprego, trabalho como mercadoria"
74
. Esta
foi uma das dimensões mais esquecidas do pensamento marxista que Gorz extraiu de
marxistas não ortodoxos como o alemão oriental Rudolf Bahro e o italiano Antonio
Negri
75
.
O ponto chave no livro foi que o capitalismo não terminará por suas próprias
contradições internas, nem mesmo atingindo limites externos - nomeadamente, o
ecológico. Pelo contrário, como ele escreveu, nos últimos 20 anos, o capitalismo
demonstrou uma inesperada habilidade de “lidar com seus problemas que não teriam
solução, acomodar suas disfunções e até mesmo redesenhar-se com força renovada
a partir do estado de coisas”. Além disso, esses problemas continuarão sem solução
até mesmo se a classe trabalhadora tomar o controle das forças de produção - isto
é, sem transformá-las qualitativamente. A triste notícia, na realidade, foi a de que
o capitalismo produziu uma classe trabalhadora cujos interesses eram mais
consonantes com a reprodução do próprio capitalismo do que com a “racionalidade
socialista”. Consequentemente, a erradicação do capitalismo pode apenas surgir das
áreas da sociedade que encarnaram ou prefiguraram “a dissolução de todas as classes
sociais, inclusive a própria classe trabalhadora”
76
. A sugestão de Gorz não foi
substituir a tradicional classe trabalhadora marxista por um sujeito diferente, mas
igualmente transcendental, uma nova classe com uma nova missão histórica de
salvação. Como todos os movimentos sociais nascentes, ele escreveu, aquele dos
“que se recusam a serem nada mais do que trabalhadores” foi uma não-classe com
uma forte ética de liberação, “a negação da lei e da ordem, poder e autoridade, em
nome do inalienável direito de controlar a própria vida”
77
. O movimento, no entanto,
74
GORZ, A. Ecologica. Seagull, 2010, p. 11.
75
GORZ, A. Farewell to the Working Class. An Essay on Post-Industrial Socialism. Pluto Press, 1982.
p. 88.
76
GORZ, A. Farewell to the Working Class. An Essay on Post-Industrial Socialism. Pluto Press, 1982.
p. 14-15.
77
GORZ, A. Farewell to the Working Class. An Essay on Post-Industrial Socialism. Pluto Press, 1982.
p. 11.
25
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não foi estruturado como tal, porque sua principal preocupação foi construir a
autonomia dos indivíduos. Isso foi, ao mesmo tempo, sua maior força e fraqueza,
porque espaços de autonomia - capturados pela ordem social existente - serão
marginalizados, subordinados ou guetizados
78
, a menos que haja uma completa
transformação e reconstrução da sociedade"
79
.
Como Martin Ryle e Kate Soper observaram, André Gorz deu voz a um
pensamento alternativo e radical sobre ecologia e trabalho que surgiu entre as
décadas de 1970 e 1980, um pensamento que estabelecia uma nova conexão "entre
o desejo humano de uma vida menos dominada pelo trabalho e a necessidade
ambiental de uma economia menos indiscriminadamente produtivista"
80
. No Écologie
et liberté de Gorz e em alguns círculos intelectuais da França, essa ideia começou a
ser chamada de décroissance (decrescimento), um conceito que tem recebido
crescente atenção na esteira da atual crise econômica, especialmente no sul da
Europa
81
. Esse interesse renovado deu origem ao que agora se considera como um
movimento guarda-chuva - uma convergência de movimentos sociais e intelectuais
que se esforçam por desacoplar o bem-estar social e o viver bem do imperativo do
crescimento econômico
82
. As ideias de Gorz sobre a "libertação do trabalho" são
centrais para o movimento de decrescimento atual. No entanto, é desnecessário
dizer que o fim do Fordismo e o abandono de uma política centralizada na classe
trabalhadora não resultou na desejada "libertação do trabalho" - o exato oposto, é
possível de ser dito. Não houve em Gorz mais elaboração sobre quais possibilidades
alternativas poderiam ser desenvolvidas em substituição à antiga perspectiva de
classe, nem uma análise crítica dos “novos movimentos sociais" que tinham ocupado
o cenário do ativismo ecológico, em sua maioria via mobilização antinuclear,
evoluindo para novas formações políticas - os partidos verdes.
78
N.T.: transformados em guetos.
79
GORZ, A. Farewell to the Working Class. An Essay on Post-Industrial Socialism. Pluto Press, 1982.
p. 12.
80
RYLE, M., SOPER, K. Introduction: the ecology of labour. Green Letters 20(2), pp. 119126. doi:
10.1080/14688417.2016.1164984. Acesso em: 12 dez. 2024.
81
Sobre a redução do tempo de trabalho e o decrescimento ver, por exemplo: KALLIS, Giorgos. In
defense of degrowth: opinions and manifestos. Uneven Earth Press, 2017.
82
D’ALISA, G.; DEMARIA, F.; KALLIS, G. Degrowth. A vocabulary for a new era. Routledge, 2014.
26
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Para resumir: Gorz deu voz a uma desilusão difusa, tendo a oportunidade e
até mesmo a possibilidade de desenvolver uma estratégia de “ecologia de classe
trabalhadora”, baseada na subjetividade política do movimento trabalhista. Essa
desilusão localizada em uma fase histórica de transição pós-industrial experienciada
na França, Itália, Alemanha e na maioria da Europa Ocidental nos anos 80, no qual,
somados a um giro quase generalizado para as políticas neoliberais de
“flexibilização” do trabalho e de cortes no bem-estar social, contribuiu para um sério
enfraquecimento e crise do movimento trabalhista. Ao mesmo tempo, a transição
pós-industrial pareceu abrir caminho para a “libertação do trabalho” ou “negação do
trabalho”, como teorizado no movimento autonomista italiano: uma posição que era
radicalmente alternativa ao, e veementemente oposta pelo, movimento trabalhista
tradicional.
A crise da abordagem da "ecologia de classe trabalhadora" sinalizou uma
situação em que a ecologia política não podia mais ser vista como um território
hegemonizado pelo movimento trabalhista: o movimento ambiental estava se
consolidando como um "novo movimento social", nascido de mobilizações radicais,
populares e de massa contra a energia nuclear em toda a Europa Ocidental
83
, de
modo que não foi possível para a esquerda marxista e tradicional caracterizá-las
como uma expressão das preocupações elitistas com a vida selvagem carismática,
como Conti já havia feito antes. Em outras palavras, os anos oitenta foram uma época
em que se tornou evidente que uma política vermelho-verde precisava ser construída
sobre uma nova relação entre os movimentos trabalhista e ecologista. A próxima
seção ilustrará como essa aliança possível foi idealizada por um dos mais
proeminentes intelectuais marxistas da época: o crítico literário britânico Raymond
Williams.
83
ROOTES, C. Environmental Protest in Western Europe. Oxford University Press, 2003.
27
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4 “Uma alteração qualitativa do socialismo”: Raymond Williams sobre trabalho e
ecologia
Em junho de 1984, Williams foi convidado pelo Socialist Environment &
Resources Association de Letchworth, Reino Unido, para discursar sobre "Ecologia e
o Movimento trabalhista". Ele começou com a reivindicação de que: "nenhum
desenvolvimento político é mais necessário agora do que uma convergência entre o
movimento ecológico e o movimento trabalhista"
84
. Oferecendo uma narrativa
convincente de como se relacionam trabalho e natureza entre si sob o capitalismo
industrial, ele imaginou uma possível convergência entre os movimentos trabalhista
e o ecologista, com base em dois pré-requisitos: primeiro, que o primeiro esteja
disposto a substituir a noção de "produção" com a de "meio de vida"; segundo, que o
segundo reconheça o capitalismo como o inimigo da natureza.
Williams caracterizou a política ecossocialista nos seguintes termos: a crise
ecológica foi um produto não da modernidade em si - planejada como a capacidade
de alimentar mais pessoas a partir de uma quantidade limitada de recursos, a
capacidade de escapar da armadilha malthusiana - mas da modernidade capitalista.
Esta última deveria ser entendida como um modo de produção em que ambos,
trabalho e o meio ambiente, foram considerados "matéria prima” (ou “recursos”)
para a acumulação e lucro, ao contrário de possuírem um fim em si mesmos. O ponto
para o movimento trabalhista era mudar esse sistema, não o administrar mais
eficientemente. A ecologia política de Williams converge com a de Gorz na rejeição
da visão de uma mudança sistemática que implique em um retorno à agricultura pré-
industrial e artesanato - ele rejeitou a ideia de que esses modos de produção seriam
capazes de manter os níveis atuais de população no Reino Unido. Uma modernidade
não capitalista parece ser o horizonte no qual ele pensou que o trabalho e a ecologia
irão se fundir.
84
WILLIAMS, R. Ecology & the Labour Movement. A talk given at the Plinston Hall, Letchworth, 2nd
June 1984. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=EiFWHtKOcj0. Acesso em: 16 dez.
2024. Gostaria de agradecer a Jason W. Moore por colocar este recurso na Rede Mundial de Pesquisa
Ecológica, através da qual tomei conhecimento desta.
28
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Para Williams, o movimento trabalhista (britânico) havia surgido a partir de
um ambiente específico: o da primeira revolução industrial, caracterizado pelo
fechamento de terras comuns, e mudanças essenciais consequentes na produção de
alimentos e no meio de vida; e novas formas de "extrair energia da natureza"
relacionadas com as tecnologias do carvão e do ferro. Tudo isso deu à sociedade uma
capacidade sem precedentes de transformar a natureza, uma transformação que se
tornou uma experiência de trabalho comum. "A partir dessa experiência caótica e
dinâmica um movimento trabalhista formou-se, primeiramente defensivo", observou
ele, pois se formou em torno da noção de pobreza remediável. E a resposta à pobreza
que estava em oferta pela ordem social - ele observou - foi: "produza mais e você
não vai mais ser pobre - trabalhe mais duro". Os socialistas logo perceberam que não
há correlação necessária entre o aumento da produção e a redução da pobreza,
porque as relações sociais estabelecidas no decorrer da produção determinam em
grande parte as decisões sobre como o excedente é distribuído. Isso faz com que
continue possível que uma grande pobreza exista em meio a uma grande riqueza - se
esta for funcional para a ordem social. Assim, o problema não era a produção em si,
disse Williams, mas as relações de produção. Durante a maior parte de sua história,
ele afirmou: o movimento trabalhista não havia levado essa diferença a sério.
O problema para o qual Williams apontava era a consolidação do trabalho
dentro da racionalidade instrumental dominante da modernidade capitalista, na qual
o trabalho, ele parecia dizer, foi aceito como um fato inelutável de vida. No entanto,
ele observou, com a evolução do capitalismo industrial, as matérias primas tinham
se tornado redundantes, e a população tinha chegado a um ponto muito maior do
que a demanda de mão de obra, de modo que as pessoas tinham se tornado
redundantes também, como uma matéria prima que poderia ser deixada no chão. E
nesse ponto, afirma Williams, o movimento trabalhista enfrentou sua maior crise,
uma crise de ideias:
[...] porque, se continuar a ver mais produção como a forma de combater a
pobreza, vai simplesmente produzir sua própria redundância geral. É um
processo que tem uma certa lei de ferro... Então a batalha agora é... se
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você continuará a aceitar o modo predominante de produção... ou se vo
pode (e é aqui que a convergência com o movimento ecológico deve
acontecer) começar a pensar em uma ordem social diferente.
85
Em outras palavras, chegou o momento de reconhecer que a problemática
relação do trabalho com a ecologia derivou dessa aceitação passiva desse hábito
falacioso do pensamento, pelo qual a produção foi a resposta necessária e suficiente
à pobreza, enquanto o trabalho assalariado e propriedade privada haviam se tornado
instituições sociais indiscutíveis. Quebrar essa direção política implicava em
abandonar a ideia de que o socialismo poderia competir com o capitalismo na
execução melhor do mesmo sistema, ou seja, "produzir mais", porque as
consequências a longo prazo desse modelo sobre as pessoas e o meio ambiente
haviam se tornado inequivocamente claras.
Qual era a alternativa a isso? “Desafiar a noção de produção tal como ela foi
apresentada, e começar com uma concepção diferente” - Williams afirmou - uma na
qual a convergência entre os movimentos socialistas e ecologistas poderia ocorrer,
ou seja, a ideia de meio de vida. O meio de vida era para Williams "um conceito
muito mais profundo, e muito mais humano do que a produção", porque este último
foi "quase sempre uma quantidade bruta, indiscriminada quanto ao que você produz,
com qual qualidade você produz, que efeitos essa produção tem sobre os outros e as
outras espécies", e isso impediu que o sistema priorizasse necessidades humanas.
Pelo contrário, o meio de vida significava "partir do lugar humano e do interesse de
todos os seres vivos envolvidos”
86
.
A formulação de Williams da relação entre ecologia e trabalho converge com
a teoria de O'Connor de marxismo ecológico, formulado alguns anos depois
87
, e
sinaliza uma tendência da ecologia política marxista para convergir com a crítica
polanyiana da mercantilização que estava se popularizando nos círculos esquerdistas
85
WILLIAMS, R. Ecology & the Labour Movement. A talk given at the Plinston Hall, Letchworth, 2nd
June 1984. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=EiFWHtKOcj0. Acesso em: 16 dez.
2024.
86
WILLIAMS, R. Ecology & the Labour Movement. A talk given at the Plinston Hall, Letchworth, 2nd
June 1984. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=EiFWHtKOcj0. Acesso em: 16 dez.
2024.
87
O’CONNOR, James. Natural Causes: Essays in Ecological Marxism. New York: Guilford, 1998.
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da época. A originalidade da abordagem de Williams, no entanto, consistia em se
perguntar como poderia o meio de vida ser sustentável em uma economia industrial
moderna: este era, para ele, o núcleo do dilema na relação entre a ecologia e o
trabalho.
A resposta que o movimento ambientalista havia dado não foi satisfatória,
alegou ele, e essa foi a principal razão pela qual o movimento trabalhista precisava
intervir e tomar a questão em suas mãos. Questionando as prioridades do sistema de
produção, na realidade, o movimento ambiental o tinha feito chamando o sistema
de nomes suaves - sociedade industrial ou sociedade moderna - e, portanto, nunca
tinha chegado "às escolhas políticas difíceis". Se os o movimento ecologista pudesse
chegar ao ponto em que eles identificassem o capitalismo como inimigo da natureza,
e se - ao mesmo tempo - o movimento trabalhista estivesse preparado para avançar
na mesma direção, então uma base comum para a política vermelho-verde poderia
ser encontrada. Se as conversas fossem bem-sucedidas, não produziriam
simplesmente uma convergência entre dois movimentos, concluiu, mas "uma
alteração qualitativa do socialismo". E a única força que poderia levar a cabo essa
transformação era "a força que está enraizada no interesse da maioria e na
indispensável subsistência de todas as pessoas da sociedade, e que... idealmente...
é o movimento trabalhista"
88
.
Para resumir: Williams compartilhou a ideia de Conti de que um movimento
trabalhista forte é o sujeito social capaz de liderar uma revolução ecológica, mas,
como Gorz, ele não considerou isso como uma escolha política necessária e natural
para o movimento trabalhista, pelo menos não até que uma convergência tenha sido
realizada entre ele e o movimento ambiental no terreno de uma política de
subsistência. Enquanto todos os três compartilharam uma crítica marxista às
contradições ecológicas do capitalismo, faltava a eles um entendimento da
colonialidade/racismo e patriarcado/sexismo como fundamentalmente constitutivos
do próprio capitalismo industrial (e em grande medida, do então existente socialismo
88
O’CONNOR, James. Natural Causes: Essays in Ecological Marxism. New York: Guilford, 1998.
31
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de Estado também), e, portanto, da ecologia-mundo capitalista
89
. Tal consciência
estava sendo produzida pela vertente ecológica do movimento feminista, ao qual a
próxima seção é dedicada.
5 Redefinindo o trabalho. Maria Mies e a abordagem ecofeminista materialista
Desde o início da década de 1970, uma reflexão muito necessária sobre os
trabalhos reprodutivos e domésticos como uma "morada oculta" crucial do
capitalismo tinha emergido na Itália, França, Alemanha e outros países ocidentais
90
,
contribuindo de forma fundamental para desestruturar antigas concepções de
trabalho centradas na força de trabalho industrial e no emprego assalariado em
geral. O que é bem menos conhecido é o fato de que essa reflexão permitiu que
várias estudiosas e ativistas também desenvolvessem uma perspectiva ecofeminista
materialista com base em uma crítica da divisão sexual do trabalho em escala global.
Provavelmente, a contribuição mais importante a este respeito veio da acadêmica
alemã e feminista de longa data Maria Mies: “Patriarcado e Acumulação em Escala
Mundial” [Patriarchy and Accumulation on the World Scale, 1986], publicada pela
primeira vez na Alemanha em 1986, e que logo se tornou uma referência chave no
ecofeminismo materialista
91
. A relevância do livro para uma discussão sobre o
trabalho e a ecologia não deve ser subestimada. Ele apontou para o mesmo problema
que Williams havia identificado em seu discurso de Letchworth, o de abandonar uma
compreensão redutora da produção como o único terreno onde a pobreza poderia ser
enfrentada - mas o fez acrescentando duas perspectivas que estavam totalmente
ausentes em Williams (assim como em Conti e Gorz): a do trabalho oculto das
89
MOORE, J.W. Ecology, capital, and the nature of our times: accumulation & crisis in the capitalist
world-ecology. Journal of World-Systems Research, v. XVII, n. 1, p. 108147, 2011.
90
ARRUZZA, C. Functionalist, determinist, reductionist: social reproduction feminism and its critics.
Science & Society, v. 80, n. 1, p. 930, 2016; DALLA COSTA, M.R. Introduction to the Archive of
Feminist Struggle for wages for housework. Viewpoint Magazine, issue 5, October 2015. Disponível
em: https://viewpointmag.com/2015/11/02/issue-5-social-reproduction/. Acesso em: 16 dez. 2024;
FRASER, N. Behind Marx’s Hidden Abode. For an Expanded Conception of Capitalism. New Left
Review, v. 86, p. 5572, Mar.-Apr., 2014.
91
MIES, M. Patriarchy and Accumulation on the World Scale. Zed Books, 1996.
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mulheres e a da divisão internacional do trabalho. O livro focava no que Mies chamou
de "a produção geral da vida, ou produção de subsistência", que ela viu como
"realizada principalmente através do trabalho não assalariado de mulheres e outros
trabalhadores não assalariados como escravos, trabalhadores contratados e
camponeses nas colônias” e que para ela constituía "a base perene sobre a qual ‘o
trabalho produtivo capitalista’ pode ser construído e explorado"
92
.
O livro acrescentou uma nova perspectiva sobre a divisão sexual do trabalho,
teorizando-a como uma questão que ia além da esfera familiar, e que definiu toda
uma estrutura social, incluindo tanto as relações de classe como as relações sociais
com a natureza. De uma forma decisivamente não essencialista, Mies explicou que
as diferenciações entre homens/mulheres evoluíram a partir de um processo
histórico, criticando assim a naturalização do trabalho reprodutivo (feminino) em
Marx e Engels, para quem as atividades reprodutivas "não pertencem ao reino das
‘forças produtivas’, da ‘mão de obra’, da ‘indústria’ e ‘troca’, mas à ‘natureza’”
93
.
"Separando a produção de vida nova da produção das necessidades diárias através do
trabalho, elevando este último para o reino da história e humanidade, e ao chamar
a primeira de 'natural', a segunda de 'social' - ela escreveu - eles contribuíram
involuntariamente para o determinismo biológico que ainda hoje sofremos. Em
relação às mulheres e seu trabalho, permanecem tão idealistas quanto os ideólogos
alemães a quem eles criticaram"
94
. Para Mies, a visão de Marx e Engels, em última
instância, refletia o processo histórico pelo qual a ordem patriarcal tinha sido
incorporada, primeiro pelo feudalismo europeu (através da caça às bruxas) e depois
pelo capitalismo industrial, quando "a esfera onde a força de trabalho era produzida,
a casa e a família" foi redefinida como "natureza privada e domesticada", enquanto
a fábrica foi definida como "o lugar para produção pública e social (‘humana’)"
95
.
Ainda que essa distinção pertença mais plenamente ao processo de transformar a
92
MIES, M. Patriarchy and Accumulation on the World Scale. Zed Books, 1996.
93
MIES, M. Patriarchy and Accumulation on the World Scale. Zed Books, 1996. p. 52.
94
MIES, M. Patriarchy and Accumulation on the World Scale. Zed Books, 1996. p. 53.
95
MIES, M. Patriarchy and Accumulation on the World Scale. Zed Books, 1996. p. 69.
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mulher em esposa e dona de casa
96
do período Fordista do que ao início da era
industrial - quando um grande número de mão de obra fabril era formado de mulheres
- continua a ser de grande relevância para entender a subordinação social das
mulheres como sujeitas tipicamente não-políticas, e da reprodução como terreno
não político de vida social.
Nas duas décadas seguintes, Mies deu contribuições paradigmáticas à
literatura ecofeminista global com os livros Ecofeminismo
97
e A Perspectiva de
Subsistência
98
, que estabeleceram fortes conexões entre ecologia, feminismo e o
emergente movimento antiglobalização (ou alter-mundialismo). Eles contribuíram
substancialmente para a discussão do trabalho além do trabalho assalariado e do
proletariado urbano-industrial e mostraram como a possibilidade de desenvolver um
“viver bem" além do crescimento capitalista já era praticada em uma série de
contextos rurais e países do chamado terceiro mundo. Surgido de dentro de um grupo
acadêmico/ativista de estudos de "mulheres e desenvolvimento" na Alemanha,
Áustria e Países Baixos
99
, a "perspectiva da subsistência" era, portanto, um conceito
empoderador que deu valor à capacidade de cooperação das pessoas umas com as
outras e com a natureza na "produção da vida".
O trabalho de Mies repercutiu nas produções do mesmo período das feministas
autônomas marxistas italianas Silvia Federici e M. Rosa Dalla Costa, e pela acadêmica
e ativista eco-socialista britânica Mary Mellor
100
. O que esses argumentos tinham em
comum era ir além dos tradicionais movimentos nacionais trabalhistas, tipicamente
dominados por homens, para analisar a exploração e a solidariedade em escala
mundial, onde a maioria das pessoas da classe trabalhadora eram mulheres rurais do
96
N.T.: no original housewifization.
97
MIES, M.; SHIVA, V. Ecofeminism. Zed Books, 1993.
98
MIES, M.; BENNHOLDT-THOMSEN, V. The subsistence Perspective. Zed Books, 2000.
99
MIES, M. Questioning needs: a rejoinder to victor wallis. Capitalism Nature Socialism, v. 17, n. 4,
p. 4447, 2006.
100
DALLA COSTA, M.R. The native in us, the Earth we belong to. The Commoner, n. 6, 2003. Disponível
em: https://thecommoner.org/wp-content/uploads/2020/06/Mariarosa-Dalla-Costa-The-Native-In-
Us-The-Earth-We-Belong-To.pdf. Acesso em: 16 dez. 2024; MELLOR, M. Feminism and Ecology. New
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Sul global
101
. A divisão global/sexual do trabalho era, portanto, o nível em que essas
autoras e ativistas, muitas de origem marxista-feminista, desenvolveram uma crítica
ecológica do capitalismo do ponto de vista da reprodução e subsistência
102
. Esse
esforço intelectual/ativista tem sido construído através de uma abordagem
materialista tanto para a ecologia como para o feminismo, mas também em um
diálogo transnacional que se interseccionaram, de formas importantes, com estudos
pós-coloniais e do terceiro mundo, enquanto opera um diálogo difícil entre
abordagens construtivistas e realistas da "natureza"
103
. O terreno analítico comum
era o de expor os efeitos materiais da ordem capitalista/patriarcal/colonial em
termos de esgotamento tanto dos ecossistemas quanto das pessoas, através da
extração do trabalho não remunerado de reprodutores (em sua maioria mulheres) e
da natureza, que se originou na depreciação cultural de serviços reprodutivos,
levando ao mesmo tempo - à sua comoditização.
A economia política ecofeminista tem fundamental importância para uma
consideração da ecologia e do trabalho, na medida em que expõe os perigos dos
dualismos culturais ocidentais (entre “cultura” como mente-agência-produção-
masculina e “natureza” como corpo-passividade-reprodução-feminino) que também
são profundamente imbricadas dentro das políticas socialistas. Sua preocupação
principal é a necessidade de revisar por completo a noção do que conta como
“trabalho”. Contudo, o debate ecofeminista materialista tomou lugar
principalmente em espaços “globais” como a Rio +20 ou a conferência de “mulheres
e desenvolvimento”
104
, envolvendo principalmente mulheres estudiosas e ativistas
trabalhando no Sul global; além disso, a maioria delas desenvolveu seu trabalho fora
da Europa. Como consequência, o impacto deste debate sobre o desenvolvimento de
uma agenda política verde-vermelha no velho continente foi muito limitado, se não
101
SALLEH, A. From metabolic rift to “Metabolic Value: reflections on environmental sociology and
the alternative globalization movement. Organization & Environment, v. 23, n. 2, p. 205219, 2010.
102
SALLEH, A. CNS symposium: ecofeminist dialogues. Capitalism Nature Socialism, v. 17, n. 4, p.
32141, 2006.
103
SOPER, K. Feminism and ecology: realism and rhetoric in the discourses of nature. Science,
Technology, & Human Values, v. 20, n. 3, p. 311331, 1995.
104
MERCHANT, C. Radical Ecology. In: Search for a Livable World. 2. ed. Routledge, 2005; SALLEH,
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ausente. A perspectiva ecofeminista materialista nasceu e se desenvolveu como um
outsider do movimento trabalhista tradicional, e assim tem permanecido até hoje.
Marginalizada, e também mal compreendida pelo chamado feminismo branco da
terceira onda
105
, ganhou novo impulso nos últimos anos graças a uma reviravolta
materialista nos estudos de gênero, mas também graças às crescentes mobilizações
de indígenas, camponesas e outras mulheres racializadas contra o aumento da
mercantilização e do esgotamento da vida no novo milênio.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As últimas três décadas do Século XX representaram um ponto de virada
crucial para o ambientalismo do trabalho. A abordagem que foi consolidada na era
Fordista, baseada na luta dos sindicatos por regulamentações de saúde e segurança
no ponto de produção, estendendo para a sociedade através de um amplo
planejamento democrático - o que os comunistas italianos chamaram de “a ecologia
de classe trabalhadora - perdeu sua centralidade e surgiram várias visões na
Esquerda Europeia. Nenhuma delas, contudo, obteve sucesso prevenindo os
movimentos trabalhistas da Europa de perderem sua perspectiva anticapitalista e
abraçarem a ecologia política ecomodernista. Essa derrota deve ser lida através do
pano de fundo histórico das pressões políticas e estruturais (estagnação econômica,
desindustrialização e o fim da experiência soviética); entretanto, deve ser explicado
também como um efeito interno de curto prazo da ecologia política marxista:
nomeadamente, a desconexão entre as visões ecossocialistas e ecofeministas.
Durante a época da escrita deste artigo (2017-19), as prospecções para uma
política verde-vermelha na Europa parecem se polarizar em dois blocos, que podem
ser representados de forma ampla como bloco da Modernização Ecológica e da
Justiça Ambiental: o primeiro bloco gira em torno de um plano de crescimento verde
amigável ao trabalho, baseado em uma mistura de regulamentações de mercado e
105
GAARD, G. Ecofeminism revisited: rejecting essentialism and re-placing species in a material
feminist environmentalism. Feminist Formations, v. 23, n. 2, p. 2653, 2011.
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não-mercado, representados, por exemplo, pela Confederação Europeia de
Sindicatos e o grupo social democrata no Parlamento Europeu; o segundo bloco é
inspirado nas visões de pós-desenvolvimento e de Justiça Ambiental Global,
representado, por exemplo, pelo movimento de decrescimento, ao qual a
perspectiva ecofeminista materialista convergiu, e que incorporou as reivindicações
dos “comuns” como um terreno político para política anticapitalistas (ecológicas).
A primeira representa a posição oficial do ambientalismo do trabalho:
entretanto, isso é entendido de uma forma bem diferente que sua versão
ecossocialista. As estratégias de “transição justa” e “empregos climáticos”, na
realidade, vêm trabalhadores não como sujeitos políticos de uma revolução
ecológica, mas como potenciais vítimas de políticas climáticas. Em outras palavras,
enquanto a ecologia da classe trabalhadora foi uma estratégia transformadora,
orientada por uma defesa da reprodução classista, essa nova versão de
ecomodernismo trabalhista é uma estratégia conservadora, construída em volta da
defesa da produção. A segunda opção, por outro lado, manifesta-se em resistências
populares a atividades com uso intensivo de carbono e megaprojetos de “energia
limpa”, bem como uma série de iniciativas urbanas de
ocupações/hortas/compartilhamento de trabalho, várias delas que estão
conscientemente adotando princípios do decrescimento. De acordo com o defensor
do decrescimento e pesquisador Giorgos Kallis, essas ações não são inspiradas por
um escapismo, mas sim por uma atitude de agoratopia
106
, ou seja, uma que almeja
mudar a cidade conectando ações populares com institucionais.
107
Deve ser notado,
contudo, que essa estratégia tem falhado até agora em ganhar tração de massas com
as classes trabalhadoras empobrecidas e precarizadas da era da austeridade, nem
parece ser capaz de ter um diálogo construtivo com o movimento trabalhista em
geral.
106
N.T.: no original nowtopia junção das palavras “agora” e “utopia”
107
KALLIS, Giorgos. In defense of degrowth: opinions and manifestos. Uneven Earth Press, 2017.
p. 14.
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A desconexão e até mesmo eventual hostilidade entre a perspectiva
ecofeminista, agora fortemente aliada com os movimentos de Justiça
Ambiental/pós-desenvolvimento/decrescimento, e o ecomodernismo trabalhista é o
que está atualmente impedindo a possibilidade do desenvolvimento de uma luta
anticapitalista ecológica mais forte e convincente, tanto no nível europeu quanto
global. Essa estratégia, eu defendo, deve almejar transformar o ambientalismo do
trabalho em uma aliança antipatriarcal e anticolonial entre o trabalho
industrial/assalariado e o trabalho meta-industrial. Para isso acontecer, uma nova
geração de ecologistas políticos/as e intelectuais militantes precisarão aceitar o
desafio de repensar as classes trabalhadoras e suas agências ecológicas.
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Stefania Barca
Pesquisadora sênior do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (CES/UC).
Doutora em História Econômica pela Universidade de Bari (Itália). Professora associada em
História Moderna e em História Econômica (pelo Ministério da Educação, Universidade e
Pesquisa da Itália - MIUR). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8136-3369. E-mail:
sbarca68@gmail.com.