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Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano
Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região
BATISTA, Flávio R.; IZIDORO, Leila G.. “Transição justa” e ideologia jurídica: uma crítica a partir da cadeia da
reciclagem de plásticos. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano, Campinas, v. 7, p. 1-35, 2024. DOI:
https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.258.
palavras, apontava Edelman acerca da história do movimento da classe trabalhadora
ao longo do século XX:
Queria demonstrar, na contramão de todos os lugares-comuns dos marxistas,
que as ‘conquistas’ da classe operária – jornada de trabalho, férias
remuneradas, reforma da dispensa... – eram, na realidade, “derrotas”
políticas. Claro, as condições de trabalho haviam melhorado; certamente, a
classe operária vivia melhor, mas o preço a pagar havia sido o abandono de
qualquer ambição revolucionária, de qualquer vontade de abater o
capitalismo e de tomar para si os meios de produção. A oposição entre
capital/trabalho havia se renovado uma aliança capital/trabalho, em
compromisso. E o instrumento privilegiado desse compromisso havia sido o
direito. Ao se “legalizar” a “classe” operária, ela era capturada,
neutralizada, amordaçada. [...]. Muitas dessas “vitórias” foram necessárias
para manter em “boa saúde” a classe operária, e Marx, em seu tempo,
demonstrou que o Estado inglês foi muitas vezes obrigado a intervir contra
os excessos dos seus capitalistas. [...]. Isso é bem conhecido. Mas o que é
menos conhecido é que a classe operária pode ser ‘desencaminhada’,
precisamente por suas próprias ‘vitórias’, que podem apresentar-se também
como um processo de integração ao capital. A ‘participação’ nunca esteve
ausente da estratégia da burguesia, e há veneno em seus ‘presentes’.
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Uma terceira questão importante de se observar é um aspecto que parece
muitas vezes negligenciado quando o assim chamado sindicalismo internacional
coloca-se como postulante ao ingresso no pacto produtivista com o capital: a divisão
internacional do trabalho. Não é necessária grande reflexão para constatar a
impossibilidade de uma “transição justa” em nível global. É de uma nitidez imensa
que, por exemplo, a “justiça” da transição para os trabalhadores do carvão na
Austrália pode ser “comprada” apenas por meio da exportação de carvão para a Índia
ou outros países ‒ nos quais, a toda evidência, a queima do carvão impedirá a
“transição justa”. Do mesmo modo, as campanhas por direitos trabalhistas podem
ser limitadas a categorias específicas de trabalhadores, marginalizando grupos mais
fracos
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, o que também fica especialmente evidente ao se constatar os mecanismos
de intensificação da força de trabalho na cadeia de reciclagem, conforme
desenvolvido na seção anterior.
47
EDELMAN, Bernard. A legalização da classe operária. São Paulo: Boitempo Editorial, 2016, p. 8,
18.
48
STEVIS, Dimitris. A globalização da Transição Justa no mundo do trabalho: políticas de escala e de
escopo. Tempo Social, São Paulo, Brasil, v. 33, n. 2, p. 57–77, 2021. Disponível em:
https://www.revistas.usp.br/ts/article/view/182883. Acesso em: 12 dez. 2024.