Recebido em: 30/09/2024
Aprovado em: 25/10/2024
Data centers: uma abordagem sobre as suas implicações
trabalhistas e ambientais no Brasil
Data centers: an approach to their
social and environmental implications in
Brazil
Data centers: una aproximación a sus
implicaciones laborales y ambientales en
Brasil
Rodrigo de Lacerda Carelli
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Lattes: http://lattes.cnpq.br/6162675542648709
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5504-1198
Carolline Vasconcellos Pereira
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Lattes: http://lattes.cnpq.br/5215893747717226
ORCID: https://orcid.org/0009-0008-0258-267x
Nael Neri de Souza Júnior
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Lattes: http://lattes.cnpq.br/1780781344098422
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7889-0598
RESUMO
Introdução: O Brasil, como todo o mundo, vem sofrendo um processo de
digitalização. Nesse contexto, as plataformas digitais, cuja atuação tem
crescido de maneira exponencial, apresentam novos desafios das mais
diversas ordens, inclusive por serem as maiores detentoras e processadoras
de dados. O projeto de digitalização brasileiro, que vem passando por
regulação incipiente, vem se encaminhando também em se inserir no
processo apresentando incentivos à instalação de data centers no país.
Objetivo: O objetivo é verificar se os data centers, como estruturas físicas
que geram impactos sociais em território nacional, podem afetar não
somente o direito à privacidade e à proteção de dados de cidadãos em geral
e especificamente de pessoas trabalhadoras, notadamente no que diz
respeito ao trabalho para plataformas digitais, bem como quais são os
efeitos para o meio ambiente.
Metodologia: A pesquisa está fundada em análise bibliográfica, documental
e em material jornalístico, sendo este último necessário principalmente
para exemplificar como e onde esses data centers têm sido construídos e
quais consequências produzem.
Resultados: Verificou-se que a dataficação é um projeto político-
econômico, com graves repercussões trabalhistas e ambientais,
principalmente quando se leva em conta a divisão no processo de
digitalização. Percebe-se que o Brasil pretende se inserir no processo de
dataficação mundial pelo seu lado menos nobre: exploração de recursos
humanos e de trabalho barato. A periferia fica com a parte suja, enquanto
os lucros, e os dados, ficam nos países centrais.
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Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano
Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região
CARELLI, Rodrigo de Lacerda; PEREIRA, Carolline V.; JÚNIOR, Nael N. de Souza. Data centers: uma abordagem sobre
as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
Conclusão: As empresas que se valem de plataformas digitais não se
instalam em solo doméstico de maneira espontânea. É preciso que haja
condições políticas, jurídicas e econômicas para tanto, e os data centers
integram tal projeto, trazendo enormes prejuízos para as comunidades que
pretendem se inserir na digitalização pelo lado do explorado. Assim, a
decisão de inclusão do Brasil na dataficação pelo seu lado de exploração de
recursos humanos e naturais é uma escolha, que deve ser esclarecida e
criticada.
PALAVRAS-CHAVE: dataficação; data centers; efeitos trabalhistas e
ambientais; empresas de plataformas digitais; LGPD.
ABSTRACT
Introduction: Brazil, like the rest of the world, is undergoing a process of
digitalization. In this context, digital platforms, whose operations have
grown exponentially, present new challenges of all kinds, including being
the largest holders and processors of data. The Brazilian digitalization
project, which has been undergoing incipient regulation, has also been
moving towards inserting itself into the process by presenting incentives for
the installation of data centers in the country.
Objective: The objective is to verify whether data centers, as physical
structures that generate social impacts on national territory, can affect not
only the right to privacy and data protection of citizens in general and
specifically of working people, especially regarding work for digital
platforms, as well as what the effects are on the environment.
Methodology: The research is based on bibliographic and documentary
analysis and journalistic news, which are necessary mainly to exemplify how
and where these data centers have been built and what consequences they
produce.
Results: It emerged that datafication is a political and economic project
with serious labor and environmental repercussions, especially when the
division in the digitalization process is considered. It's noticeable that Brazil
wants to be part of the global datafication process through its less noble
side: the exploitation of human resources and cheap labor. The periphery
gets the dirty part, while the profits, and the data, stay in the central
countries.
Conclusion: Companies that use digital platforms don't just spontaneously
set up shop on domestic soil. Political, legal and economic conditions must
be in place for this to happen, and data centers are part of this project,
causing enormous damage to communities that want to get involved in
digitalization on the side of the exploited. Thus, the decision to include
Brazil in the datafication for its exploitation of human and natural resources
is a choice that must be clarified and criticized.
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Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano
Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região
CARELLI, Rodrigo de Lacerda; PEREIRA, Carolline V.; JÚNIOR, Nael N. de Souza. Data centers: uma abordagem sobre
as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
KEYWORDS: datafication; data centers; labor and environmental effects;
digital platform companies; LGPD.
RESUMEN
Introducción: Brasil, como el resto del mundo, vive un proceso de
digitalización. En este contexto, las plataformas digitales, cuyas
operaciones han crecido exponencialmente, presentan nuevos desafíos de
todo tipo, entre ellos el de ser los mayores poseedores y procesadores de
datos. El proyecto brasileño de digitalización, que viene siendo objeto de
una incipiente reglamentación, también ha ido avanzando hacia su
integración en el proceso mediante la presentación de incentivos para la
instalación de centros de datos en el país.
Objetivo: La investigación se basa en un análisis de la literatura,
documentos y material periodístico, este último necesario sobre todo para
ilustrar cómo y dónde se han construido estos centros de datos y qué
consecuencias tienen.
Metodología: La investigación se basa en análisis bibliográficos,
documentales y periodísticos, necesarios principalmente para ejemplificar
cómo y dónde se han construido estos centros de datos y qué consecuencias
producen.
Resultados: Resultó que la dataficación es un proyecto político-económico
con graves repercusiones laborales y medioambientales, sobre todo si se
tiene en cuenta la división en el proceso de digitalización. Está claro que
Brasil quiere formar parte del proceso de dataficación global a través de su
lado menos noble: la explotación de los recursos humanos y la mano de obra
barata. La periferia se lleva la parte sucia, mientras que los beneficios, y
los datos, se quedan en los países centrales.
Conclusión: As empresas que utilizam plataformas digitais não se instalam
em solo nacional espontaneamente. É necessário que haja condições
políticas, legais e econômicas, e os data centers fazem parte desse projeto.
Así, la decisión de incluir a Brasil en la dataficación por el lado de su
explotación de los recursos humanos y naturales es una elección que debe
ser aclarada y criticada.
PALABRAS CLAVE: centros de datos; datificación; efectos laborales y
ambientales; empresas de plataformas digitales; LGPD.
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CARELLI, Rodrigo de Lacerda; PEREIRA, Carolline V.; JÚNIOR, Nael N. de Souza. Data centers: uma abordagem sobre
as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
INTRODUÇÃO
A relação entre plataformas digitais e dados se mostra um tema relevante nos
dias atuais e não é por acaso que esses dois objetos estão entrelaçados. Acrescido
ao rápido avanço tecnológico, à retórica neoliberal e ao seu modelo particular de
negócio, é possível observar que o número de empresas de plataformas digitais não
só tem crescido de maneira exponencial, mas também vem compreendendo diversos
setores econômicos e obtendo quantidade massiva de dados através de mecanismos
de extração, realizando ainda o seu armazenamento e até mesmo a sua manipulação.
Enquanto tais plataformas digitais buscam expor uma narrativa de que são
apenas empresas de tecnologia, as quais fazem a intermediação tecnológica e não a
organização e direção de serviços (em que pese já estar comprovado em diversos
estudos, decisões judiciais e demandas políticas dos trabalhadores que elas
estabelecem o controle e o gerenciamento do labor dos seus trabalhadores)1; no
cenário de capitalismo informacional, as referidas empresas, que se apresentam
como “neutras”, também se valem das informações de seus usuários e trabalhadores
para auferir lucro na economia dirigida por dados.
Nesse sentido, aliás, importa observar que os dados são uma matéria-prima
de extremo valor no mundo atual, uma vez que, a partir do seu processamento, pode-
se obter diversos produtos, serviços, entre outras aplicabilidades, e como bem expõe
Sérgio Amadeu da Silveira2: “o capitalismo neoliberal do século XXI tem na
dataficação um segmento de destaque e de alta lucratividade”. Portanto, quanto
mais dados, mais lucro, controle e poder.
Por outro lado, para conseguir dar conta dessa imensa quantidade de dados
para posterior processamento, é necessário um local para guardar todo esse conjunto
de informações e, a partir desse contexto, surgem as figuras dos data centers.
1 CARDOSO, Ana Claudia Moreira; ARTUR, Karen; OLIVEIRA, Murilo Carvalho Sampaio. O trabalho nas
plataformas digitais: narrativas contrapostas de autonomia, subordinação, liberdade e
dependência. Revista Valore, Volta Redonda, v. 5, p. 206-230, set. 2020. Disponível em:
https://revistavalore.emnuvens.com.br/valore/article/view/657. Acesso em: 19 set. 2023.
2 SILVEIRA, Sérgio Amadeu. A hipótese do colonialismo de dados e o neoliberalismo. In: SILVEIRA,
Sérgio Amadeu da; SOUZA, Joyce; CASSINO, João Francisco (org.). Colonialismo de dados: como opera
a trincheira algorítmica na guerra neoliberal. São Paulo: Autonomia Literária, 2021. p. 43.
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Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
A priori, pode-se entender que os data centers ou “centros de dados” são
estruturas físicas que servem apenas de suporte para armazenar, processar e
distribuir os mencionados dados. No entanto, em uma análise mais aprofundada, é
possível observar que sua implementação em certo território é muito mais
significativa, tendo em vista que geram impactos sociais, não somente para o direito
à privacidade e à proteção de dados pessoais em sentido geral, mas também para as
pessoas trabalhadoras, através de sistemas de vigilância, bem como para o meio
ambiente e para o âmbito político, com atenção especial para as relações de poder
que circundam a esfera trabalhista e, ainda, no que se refere à soberania nacional.
Assim, em razão da relevância do assunto e do seu pouco debate, o presente
artigo buscará responder a seguinte pergunta: o que significa e quais os efeitos da
implementação de data centers no Brasil?
Tendo esse questionamento em vista, o artigo será desenvolvido em três
partes. A primeira tratará dos temas plataformização e a dataficação. Já a segunda
trará a análise quanto à imbricação entre a lei 13.709/2018, Lei Geral de Proteção
de Dados Pessoais (LGPD), a dataficação e os data centers, levando-se em conta a
Estratégia Brasileira para a Transformação Digital (E-Digital) para o ciclo 2022-2026
e o programa econômico da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI),
que tem como um dos seus intuitos implementar data centers no Brasil. Por fim,
abordaremos propriamente os possíveis efeitos da implementação de tais estruturas
físicas no território nacional.
Pretende-se reforçar, ao final, que, além da sua ampliação através das
plataformas digitais, a dataficação é um projeto político-econômico e, assim, se
mostra essencial a sua compreensão e a forma pela qual se desenvolve e é
estruturada. Nesse sentido, é oportuno observar que a implementação de data
centers em solo doméstico se revela um relevante objeto de estudo dentro deste
tema, eis que, além de todas as informações digitais estarem armazenadas nestas
estruturas, elas ensejam diversos desdobramentos.
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Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
1 Dataficação e plataformas digitais
A extração de dados e o crescente uso de algoritmos é central no capitalismo
contemporâneo. Jathan Sadowski3 destaca que, embora dados não sejam o mesmo
que lucro, eles compartilham uma lógica semelhante, sendo oportuno ressaltar que,
atualmente, o impulsionamento para acumular dados motiva novas formas de fazer
negócios e governar, bem como chama atenção para o fenômeno da dataficação.
Segundo André Lemos4, a dataficação foi evidenciada a partir do
desencadeamento do processo de digitalização, bem como o posterior avanço das
redes sociais, da computação na nuvem e do desenvolvimento dos algoritmos. A
expressão “datafication” surge em 2013, através de Mayer-Schoenberger e Cukier, e
traz como ideia a conversão de ações em dados quantificáveis para acompanhamento
e diagnóstico por meio de mecanismos fixados de vigilância e que projetem
panoramas presentes e subsequentes.
Assim, podemos entender que ela implica na alteração de ações,
comportamentos e conhecimentos, todos influenciados pela performance dos dados
manipulados por sistemas de inteligência algorítmica. Desse modo, isso deve ser
concebido como um conjunto de métodos que abrange a coleta, processamento e
tratamento de dados para realizar previsões, abrangendo uma análise dinâmica a
partir de metadados comportamentais5.
Acrescenta-se ainda que é a partir da dataficação que surge a gestão
algorítmica. Desse modo, a partir dos dados acumulados, serão realizadas análises
que permitirão o surgimento de modelos comportamentais baseados nos padrões
identificados. Estes podem se tornar parte de um processo que integrará a base de
3 SADOWSKI, Jathan. When data is capital: datafication, accumulation and extraction. Big Data &
Society, v. 6, n. 1, p. 1, jan./jun. 2019. DOI: https://doi.org/10.1177/2053951718820549. Acesso
em: 20 set. 2023.
4 LEMOS, A. Dataficação da vida. Civitas: revista de Ciências Sociais, [S. l.], v. 21, n. 2, p. 194, 2021.
DOI: https://doi.org/10.15448/1984-7289.2021.2.39638. Disponível em:
https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/civitas/article/view/39638. Acesso em: 19 set. 2023.
5 LEMOS, A. Dataficação da vida. Civitas: revista de Ciências Sociais, [S. l.], v. 21, n. 2, p. 194, 2021.
DOI: https://doi.org/10.15448/1984-7289.2021.2.39638. Disponível em:
https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/civitas/article/view/39638. Acesso em: 19 set. 2023.
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as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
um modelo de negócio, como o das plataformas digitais, as quais irão promover
serviços ou produtos a partir do uso destes modelos6.
Quanto às plataformas digitais, Murilo Carvalho Sampaio Oliveira, Rodrigo de
Lacerda Carelli e Sayonara Grillo7 esclarecem, conforme as lições de Nick Srnicek,
que “são infraestruturas digitais que possibilitam a interação de dois ou mais
grupos.” Nesse âmbito, verifica-se que os avanços na tecnologia da informação
possibilitaram a substituição, ou mesmo a supremacia, do modelo de lojas de e-
commerce dispersas em seus próprios sites por plataformas centralizadas no formato
de mercados que supervisionam todo o ecossistema.
O que, inclusive, traz maiores benefícios para elas em relação à extração de
dados, afinal, as plataformas possibilitam aos usuários criarem seus próprios
produtos, serviços e mercados. Nesse sentido, diferentemente dos negócios
tradicionais, a sua vantagem está no acesso aos dados, isto é, por se posicionarem
entre os usuários, essas plataformas ocupam uma posição estratégica para coletar
informações essenciais ao desenvolvimento de suas atividades8.
Em relação a esse aspecto, é oportuno ressaltar também que a utilização dos
algoritmos pelas plataformas digitais permite a administração e execução com base
em uma quantidade enorme de informações, o que seria impraticável para uma
gestão feita por seres humanos. Ademais, verifica-se que o registro desses diversos
dados acerca de usuários, profissionais, valores e necessidades permite uma
compreensão muito mais profunda da atividade econômica e do seu mercado, o que
viabiliza que mecanismos de inteligência artificial proponham sugestões, elaborem
planos e implementem alterações nesse empreendimento9.
6 LEMOS, A. Dataficação da vida. Civitas: revista de Ciências Sociais, [S. l.], v. 21, n. 2, p. 195-196,
2021. DOI: https://doi.org/10.15448/1984-7289.2021.2.39638. Disponível em:
https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/civitas/article/view/39638. Acesso em: 19 set. 2023.
7 OLIVEIRA, Murilo Carvalho Sampaio; CARELLI, Rodrigo de Lacerda; GRILLO, Sayonara. Conceito e
crítica das plataformas digitais de trabalho. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 11, n. 4, p.
2614, 2 dez. 2020. Disponível em: https://www.e-
publicacoes.uerj.br/revistaceaju/article/view/50080. Acesso em: 30 set. 2024.
8 KALIL, Renan Bernardi. A regulação do trabalho via plataformas. São Paulo: Blucher, 2020. p. 70.
9 OLIVEIRA, Murilo Carvalho Sampaio; CARELLI, Rodrigo de Lacerda; GRILLO, Sayonara. Conceito e
crítica das plataformas digitais de trabalho. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 11, n. 4, p.
2616, 2 dez. 2020. Disponível em: https://www.e-
publicacoes.uerj.br/revistaceaju/article/view/50080. Acesso em: 30 set. 2024.
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as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
Nesse ponto, inclusive, importa trazer a noção de capitalismo da vigilância de
dados, na forma desenvolvida por Shoshana Zuboff10, em que os dados
comportamentais (provenientes das experiências humanas) observados como
preditivos são utilizados nessas operações comerciais e geram acumulação de
riqueza.
Observa-se, portanto, que os dados passam a se mostrar como novas fontes de
valor e ensejam recentes ferramentas de acumulação11. Aliás, acumulação esta que
também demonstra ser financeira quando os dados são adquiridos sem o
consentimento e a compensação justa para os criadores e fontes dessas
informações12.
Dessa maneira, não há como se pensar na relação entre a dataficação e as
plataformas digitais sem acumulação de dados, lucratividade e demais impactos.
Nesse sentido, como expõe Rafael Grohmann13, é impraticável conceber o processo
de dataficação sem considerar a financeirização, que pode ser compreendida como
o “padrão sistêmico de riqueza”, o qual resulta em um novo modelo de acumulação
e extração de valor no contexto do capitalismo e enseja uma crescente disparidade
entre a produção e a circulação de capital, além da posse e reconfiguração dos fluxos
financeiros.
E em meio a esses dados, não se pode deixar de destacar também a relação
entre plataformas digitais, trabalhadores e o desenvolvimento de sistemas de
inteligência artificial.
10 ZUBOFF, Shoshana. A era do capitalismo de vigilância: a luta por um futuro humano na nova
fronteira do poder. Tradução George Schlesinger. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2020. p. 19.
11 SADOWSKI, Jathan. When data is capital: datafication, accumulation and extraction. Big Data &
Society, v. 6, n. 1, p. 5, jan./jun. 2019. DOI: https://doi.org/10.1177/2053951718820549. Acesso
em: 20 set. 2023.
12 SADOWSKI, Jathan. When data is capital: datafication, accumulation and extraction. Big Data &
Society, v. 6, n. 1, p. 7, jan./jun. 2019. DOI: https://doi.org/10.1177/2053951718820549. Acesso
em: 20 set. 2023.
13 GROHMANN, R. Plataformização do trabalho: entre dataficação, financeirização e racionalidade
neoliberal. Revista Eptic, Aracaju, v. 22, n. 1, p. 110, jan./abr. 2020.
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as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
Como destaca Kate Crawford14 “os sistemas de inteligência artificial15 não são
autônomos, racionais ou capazes de discernir qualquer coisa sem um treinamento
extenso e computacionalmente intensivo, com grandes conjuntos de dados ou regras
e recompensas predefinidas”. Assim sendo, compreende-se que a inteligência
artificial também é feita de trabalho humano e de dados.
Fala-se aqui dos trabalhadores que “geram informações ‘treinadas’ e
customizadas, que ensinam algoritmos a combinar e compreender padrões
produzidos por seres humanos em face de determinados assuntos16”.
A título de exemplo, as microtarefas (também denominadas de microtrabalho
e trabalho-de-clique), realizadas por alguns trabalhadores, são representadas por
tarefas repetitivas, feitas em segundos, pouco valorizadas e mal remuneradas, tendo
em vista transparecer que os sistemas de dados possam parecer mais inteligentes do
que são. Como é o caso do labor dos trabalhadores da Amazon Mechanical Turk, que
precisam acompanhar as cadências algorítmicas de um vasto império logístico17.
E esses trabalhadores ocultados que produzem, classificam e analisam dados;
da mesma forma, têm os seus dados capturados e utilizados “para fazer previsões
sobre quem tem maior probabilidade de sucesso (de acordo com parâmetros
quantificáveis), quem pode estar se desviando das metas da empresa e quem pode
estar organizando outros funcionários”18. Ou seja, um mecanismo, cada vez mais
invasivo, de gerenciamento de trabalhadores, controle e lucratividade, que explora
o trabalho humano e que se vale dos dados para tanto.
Desta feita, as plataformas digitais se valerão dos dados de forma estratégica.
E partindo do ponto de vista de que tais dados são economicamente valiosos, cabe a
reflexão a respeito da sua natureza, a forma como são utilizados, como são
14 CRAWFORD, Kate. Atlas of AI: power, politics, and the planetary costs of artificial intelligence.
London: Yale University Press, 2021. p. 8.
15 Pode-se dizer que a inteligência artificial, em sua essência, é influenciada por estruturas políticas
e sociais, e desenvolvida para servir aos interesses dominantes. Assim, ela pode ser vista como um
reflexo de relações de poder existentes. CRAWFORD, Kate. Atlas of AI: power, politics, and the
planetary costs of artificial intelligence. London: Yale University Press, 2021. p. 8.
16 KALIL, Renan Bernardi. A regulação do trabalho via plataformas. São Paulo: Blucher, 2020. p. 143.
17 CRAWFORD, Kate. Atlas of AI: power, politics, and the planetary costs of artificial intelligence.
London: Yale University Press, 2021. p. 15-16.
18 CRAWFORD, Kate. Atlas of AI: power, politics, and the planetary costs of artificial intelligence.
London: Yale University Press, 2021. p. 63.
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Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
armazenados, bem como o que dispõe a regulamentação do uso desses dados no
Brasil.
2 Data centers como elemento do projeto brasileiro de dataficação
A política brasileira para transformação digital ostenta, desde a sua
instituição, a pretensão de atrair data centers para o território nacional19, o que
continua em desenvolvimento. A Estratégia Brasileira para a Transformação Digital
(E-Digital) para o ciclo 2022-202620 manteve o objetivo, enfatizando os respectivos
empecilhos, com base em estudo da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial
(ABDI). As adversidades apontadas são de ordens econômico-financeira, jurídica e
trabalhista. Compreende-se que há elevada carga tributária, assim como altos custos
para prover energia e a importação de equipamentos. Analisa-se também que há
insegurança jurídica relacionada aos instrumentos normativos setoriais incidentes;
bem como ausência de profissionais qualificados para o campo21.
No programa específico da ABDI, a atração de data centers é colocada como
uma ação estratégica de longo prazo do eixo denominado Ecossistema e Tecnologias
Digitais22 . Sob o ponto de vista trabalhista, cabe sublinhar a única referência do
19 BRASIL. Presidência da República. Decreto nº 9.319, de 21 de março de 2018. Institui o Sistema
Nacional para a Transformação Digital e estabelece a estrutura de governança para a implantação da
Estratégia Brasileira para a Transformação Digital. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, n. 56,
p. 2, 22 mar. 2018. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2018/decreto/D9319.htm. Acesso em: 18 maio 2023.
20 BRASIL. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. Centro de Gestão e Estudos Estratégicos.
Estratégia Brasileira para a Transformação Digital (E-Digital): ciclo 2022-2026. Brasília: MCTI, 2022.
Disponível em: https://www.gov.br/mcti/pt-br/acompanhe-o-
mcti/transformacaodigital/arquivosestrategiadigital/e-digital_ciclo_2022-2026.pdf. Acesso em: 19
maio 2023.
21 BRASIL. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. Centro de Gestão e Estudos Estratégicos.
Estratégia Brasileira para a Transformação Digital (E-Digital): ciclo 2022-2026. Brasília: MCTI, 2022.
Disponível em: https://www.gov.br/mcti/pt-br/acompanhe-o-
mcti/transformacaodigital/arquivosestrategiadigital/e-digital_ciclo_2022-2026.pdf. Acesso em: 19
maio 2023.
22 Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica Nova
Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 33. Disponível em:
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
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CARELLI, Rodrigo de Lacerda; PEREIRA, Carolline V.; JÚNIOR, Nael N. de Souza. Data centers: uma abordagem sobre
as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
programa ao sistema confederativo sindical, notadamente aos sindicatos de
produtores rurais, que são vistos como instrumentos de disseminação e
implementação de “inovações” técnicas e econômicas23. Nada se fala, porém, a
respeito da necessidade de participação dos sindicatos de trabalhadoras e
trabalhadores rurais neste processo, o que denota a pretendida unilateralidade das
ações.
É preciso notar, entretanto, que, no plano da ABDI, está consignada suposta
preocupação com o mundo do trabalho, nomeadamente com “empregos mais
sustentáveis e compatíveis com as demandas da Nova Economia”24. É uma diretriz
vinculada às ações voltadas às Cidades Inteligentes e Sustentáveis e que está
orientada para implementação em longo prazo. Posteriormente, já no eixo de
estratégias voltadas às práticas ASG25, declara-se o alegado objetivo de “articular
iniciativas que visem à ampliação dos direitos trabalhistas, sobretudo às mulheres e
pessoas em empregos precários”26; e de “promover ambientes de trabalho seguros e
protegidos a todos os trabalhadores”27. A implementação de tais medidas, ressalte-
se, está prevista para concretização em curto prazo.
23 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 39. Disponível em:
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
24 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 43. Disponível em:
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
25 Segundo Souza, “o conceito ASG Ambiental, Social e Governança [...] originado do inglês ESG
(Environmental, Social and Governance), engloba três pilares fundamentais. O primeiro é o pilar
ambiental, que diz respeito ao impacto das atividades da empresa no meio ambiente e sua eficiência
no uso de recursos naturais. O segundo é o pilar social, que abrange as relações da empresa com
funcionários, comunidades e a sociedade em geral, incluindo questões de diversidade, igualdade e
direitos humanos. O terceiro pilar é a governança, que se refere às práticas de gestão, transparência,
ética e responsabilidade corporativa” (grifo no original). SOUZA, Ronaldo. ASG: A nova dimensão da
sustentabilidade financeira ambiental, social e governança. Gov.br, [Brasília], 25 ago. 2023. Seção
Penso, logo invisto. Disponível em: https://www.gov.br/investidor/pt-br/penso-logo-invisto/asg-a-
nova-dimensao-da-sustentabilidade-financeira-ambiental-social-e-governanca. Acesso em: 22 set.
2024.
26 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 50. Disponível em:
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
27 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 50. Disponível em:
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Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
O programa ainda enuncia suposta intenção de “promover a equidade de
gênero em cargos e remunerações”, bem como de “aumentar o uso de tecnologias
de base, em particular as TICs, para a promoção do empoderamento das mulheres
no setor produtivo”28. O relatório ainda registra, surpreendentemente, uma alegada
preocupação com o funcionamento adequado de algoritmos, sobretudo no que diz
respeito à vedação da discriminação algorítmica. Definiu-se como ação específica de
curto prazo de ASG “tornar processos seletivos mais inclusivos para minimização dos
vieses de recrutamento”29. Outro suposto compromisso da rota estratégica da
agência é com a transparência algorítmica, de maneira a “incentivar, por meio de
processos regulatórios, que as empresas de tecnologia digital adotem padrões de
transparência em relação aos critérios e pressupostos embutidos nos seus algoritmos,
respeitados limites técnicos e segredo industrial”30.
Declara-se, ainda, que existe preocupação de ordem ambiental, inclusive
com o abastecimento público de água, a qual está inserida no eixo de ações
orientadas para Cidades Inteligentes e Sustentáveis31, como uma ação a ser realizada
em médio prazo. Estão registradas algumas ações específicas definidas em torno do
tema. Dentre elas, há as de “criar PD&I para sistemas alternativos de purificação
visando o abastecimento público de água” e de “ampliar sistema de abastecimento
e tratamento de água de forma eficiente”32.
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
28 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 52. Disponível em:
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
29 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 50. Disponível em:
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
30 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 52. Disponível em:
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
31 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 41-43. Disponível em:
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
32 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 41. Disponível em:
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as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
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A pesquisa sobre o programa econômico da ABDI para 2030 é importante para
mostrar que a política brasileira de digitalização está fundada em pressupostos
duvidosos. Ao mesmo tempo em que se alega a pretensão de proteger a privacidade,
os dados pessoais, o trabalho, o meio ambiente e demais direitos fundamentais,
fomenta-se a instalação de data centers em território nacional. Sandra Wachter,
professora da Universidade de Oxford, alertou recentemente para as implicações
ambientais de data centers. Segundo ela, para a manutenção de um data center de
tamanho médio, são necessários 360.000 galões de água por dia33.
Na Espanha, há controvérsias em torno da implementação de um data center
da empresa Meta. Estima-se que o novo empreendimento consumirá cerca de 600
milhões de litros de água potável, com a circunstância agravante de que se instalará
numa região passível de sofrer as consequências de escassez hídrica. O consumo de
água é destinado a alimentar o sistema de refrigeração dos computadores. A título
comparativo, o data center consumiria diariamente o equivalente ao consumo de
4.181 moradores da localidade. Além do impacto hídrico, há também implicações
para a fauna local, precisamente para espécies de pássaros ameaçadas de
extinção34. Um dos argumentos estatais para permitir e até mesmo fomentar a
instalação da infraestrutura de dados empresarial foi o de geração de 250 empregos
de alta qualificação. O argumento ajudaria a atenuar a resistência em torno de
projetos como esse, com importantes impactos ambientais35.
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
33 REYNOLDS, Jordan. Artificial intelligence warning over human extinction labelled “publicity stunt”:
Professor Sandra Wachter said the risk raised in the letter that AI could wipe out humanity is “science
fiction fantasy”. Independent, [Londres], 1 jun. 2023. Seção Tech. Disponível em:
https://www.independent.co.uk/tech/rishi-sunak-university-of-oxford-san-francisco-government-
people-b2349105.html. Acesso em: 6 jun. 2023.
34 PASCUAL, Manuel G. El impacto de la tecnologia: un nuevo datacenter de Meta en España consumirá
600 millones de litros de agua potable en una zona en peligro de sequía: La infraestructura, que la
Junta Castilla-La Mancha ve como “un antes y un después” para la región, añade presión a los recursos
hídricos del Tajo; consumirá la misma cantidad de agua que 4100 hogares en la zona. La Nación,
[Buenos Aires], 10 maio 2023. Seção Tecnologia. Disponível em:
https://www.lanacion.com.ar/tecnologia/el-impacto-de-la-tecnologia-un-nuevo-datacenter-de-
meta-en-espana-consumira-600-millones-de-litros-nid10052023/. Acesso em: 7 jun. 2023.
35 PASCUAL, Manuel G. El impacto de la tecnologia: un nuevo datacenter de Meta en España consumirá
600 millones de litros de agua potable en una zona en peligro de sequía: La infraestructura, que la
Junta Castilla-La Mancha ve como “un antes y un después” para la región, añade presión a los recursos
hídricos del Tajo; consumirá la misma cantidad de agua que 4100 hogares en la zona. La Nación,
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Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
E a partir desse cenário, revela-se importante compreendermos se estamos
observando uma forma de greenwashing ou maquiagem verde, em que se tem um
discurso ambiental forjado e delineado para fins de um mercado capitalista
exploratório ou se de fato está se buscando a efetivação do desenvolvimento
sustentável36.
Em março de 2024, foi publicada a declaração de impacto ambiental do
projeto de instalação do data center, na qual foram registrados o respectivo objetivo
e os principais desafios de ordem ambiental, assim como os esforços para minimizá-
los. O objetivo do projeto seria o de fornecer suporte eficiente a aplicações de
computação robustas e escaláveis, fornecendo um elevado volume de serviços de
dados, computação e armazenamento”37. Quanto aos impactos ambientais, destaca-
se a necessidade de utilização de água, registrou-se que, para a construção do
empreendimento, seria utilizada tecnologia de refrigeração de ar seco, o que
reduziria em 84% o uso de água38.
O Brasil é o país da América Latina com mais data centers, comportando 74
em solo doméstico, os quais estão concentrados sobretudo nas regiões Sul e Sudeste.
Somente o Rio de Janeiro, por exemplo, possui 9 data centers instalados. Mas ainda
[Buenos Aires], 10 maio 2023. Seção Tecnologia. Disponível em:
https://www.lanacion.com.ar/tecnologia/el-impacto-de-la-tecnologia-un-nuevo-datacenter-de-
meta-en-espana-consumira-600-millones-de-litros-nid10052023/.
36 WYZYKOWSKI, Adriana; COSTA, Beatriz Moraes de Athayde. O “Emprego Verde” como um parâmetro
ajustado à ideia de trabalho decente: uma análise a partir do incentivo e apoio da OIT. Revista
Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano, Campinas, v. 5, p. 16. 2022. DOI:
https://doi.org/10.33239/rjtdh.v5.134 . Acesso em: 17 nov. 2024.
37 No original: dar soporte eficiente a aplicaciones informáticas robustas y escalables,
proporcionando un elevado volumen de servicios de datos, computación y almacenamiento de los
mismos CASTILLA-LA MANCHA. Resolución de 20/03/2024, de la Dirección General de Calidad
Ambiental, por la que se formula la declaración de impacto ambiental del proyecto: Proyecto de
singular interés Meta Data Center Campus (expediente PRO-SC-22-1030), situado en los términos
municipales de Talavera de la Reina y Calera y Chozas (Toledo). Diario Oficial de Castilla-La Mancha:
año XLIII, núm. 59, p. 9.789 (tradução nossa). Disponível em:
https://www.castillalamancha.es/sites/default/files/documentos/pdf/20240522/4_dia__docm.pdf.
Acesso em: 25 set. 2024.
38 CASTILLA-LA MANCHA. Resolución de 20/03/2024, de la Dirección General de Calidad Ambiental,
por la que se formula la declaración de impacto ambiental del proyecto: Proyecto de singular interés
Meta Data Center Campus (expediente PRO-SC-22-1030), situado en los términos municipales de
Talavera de la Reina y Calera y Chozas (Toledo). Diario Oficial de Castilla-La Mancha: año XLIII, núm.
59, p. 9.808. Disponível em:
https://www.castillalamancha.es/sites/default/files/documentos/pdf/20240522/4_dia__docm.pdf.
Acesso em: 25 set. 2024.
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Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
estamos muito distantes dos Estados Unidos da América, que contam com 1.834 data
centers. É o país que mais concentra tais estruturas em seu território.
Apesar disso, vale salientar que o Brasil se encontra à frente da Espanha, em
quantidade, eis que os espanhóis dispõem de 69 data centers39, e tem sido objeto de
projetos ambiciosos para a implementação de novos data centers. Nesse sentido,
destacamos a inciativa da Microsoft40 em investir no Brasil R$ 14,7 bilhões para
ampliar a infraestrutura de nuvem e de data centers nos três anos seguintes, e as
propostas de promoção do Rio de Janeiro como “uma grande capital da inovação e
tecnologia da América Latina”, que entre elas está o planejamento da prefeitura de
dar incentivos para a criação de um distrito de data centers, com um intuito de ser
o novo “epicentro de data centers na América Latina41. Ou seja, é possível que haja
tantos impactos socioambientais quanto os que têm ocorrido no país europeu nos
últimos anos, inclusive com riscos para os direitos à privacidade e à proteção de
dados.
No ano de 2018, o Brasil finalmente editou sua Lei Geral de Proteção de
Dados Pessoais, a lei n. 13.709/201842. Todavia, importa destacar que ela surge como
uma espécie de contrapartida normativa para assegurar a continuidade do fenômeno
da digitalização que se concretiza aqui. É preciso enfatizar o seguinte: as pessoas
que pensaram o referido sistema normativo e que conduziram o respectivo processo
39 BRASIL. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. Centro de Gestão e Estudos Estratégicos.
Estratégia Brasileira para a Transformação Digital (E-Digital): ciclo 2022-2026. Brasília: MCTI, 2022.
Disponível em: https://www.gov.br/mcti/pt-br/acompanhe-o-
mcti/transformacaodigital/arquivosestrategiadigital/e-digital_ciclo_2022-2026.pdf. Acesso em: 19
maio 2023.
40 MICROSOFT prevê investir R$ 14,7 bi no Brasil para crescer em nuvem e data center. Bloomberg
Línea, 26 set. 2024. São Tech. Disponível em:
https://www.bloomberglinea.com.br/tech/microsoft-preve-investir-r-147-bi-no-brasil-para-crescer-
em-nuvem-e-data-center/?utm_source=the_news&utm_medium=newsletter&utm_campaign=27-09-
2024&_bhlid=0ddd93912fbe259e990b998e0836c2da8ce84a79. Acesso em: 29 set. 2024.
41 PÁDUA, Luciano. Nova bolsa de valores, 'epicentro' de data centers e inovação: as apostas do Rio
para crescer. Exame, [São Paulo], 23 jun. 2024. Seção Brasil. Disponível em:
https://exame.com/brasil/nova-bolsa-de-valores-epicentro-de-data-centers-e-inovacao-as-apostas-
do-rio-para-crescer/?utm_source=whatsapp&utm_medium=social&utm_campaign=barra-
compartilhamento. Acesso em: 29 set. 2024.
42 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018. Lei Geral de Proteção de
Dados Pessoais (LGPD). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, n. 157, p. 59, 15 ago. 2018.
Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htm. Acesso
em: 9 jun. 2023.
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legislativo não estavam interessadas tão somente na proteção dos dados dos
titulares. O interesse maior era o de confeccionar uma lei que não fosse um
empecilho às pretensões comerciais, sobretudo daquelas empresas cujo modelo de
negócio é predominantemente fundado em amplo controle e tratamento de dados
pessoais.
É dizer: em que pese o fato de a LGPD ter se sujeitado à técnica legislativa
oficial, vale sublinhar que, na realidade, a norma foi construída sobretudo pelas
próprias empresas às quais ela se aplica. Uma breve pesquisa sobre o processo
legislativo da lei enfocada revela que a intenção era a de que ela não embaraçasse
o desenvolvimento econômico. Em outros termos, a lei que se fazia não deveria
atrapalhar as práticas baseadas em dados. E isto está declarado expressamente no
texto vigente, precisamente entre os seus fundamentos, que estão previstos no
artigo 2º, inciso V e VII.
Em que pese a norma declare que almeja proteger a pessoa natural,
notadamente sua liberdade, privacidade e o desenvolvimento de sua
personalidade43, é possível perceber que a grande preocupação é com o
funcionamento desembaraçado das empresas. Isso fica evidente já no artigo 2º da
LGPD que trata sobre os fundamentos da norma. O dispositivo permite perceber
que a proteção da pessoa natural concorre em todos os momentos com a livre
iniciativa e com o desenvolvimento econômico. Ao tempo em que se prevê o respeito
à autodeterminação informativa, à privacidade e à intimidade44, também se
reconhece a necessidade de garantir o desenvolvimento econômico e tecnológico e
a inovação, bem como a livre iniciativa e a livre concorrência45.
43 Art. 1 da LGPD. BRASIL. Presidência da República. Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018. Lei Geral
de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, n. 157, p. 59, 15
ago. 2018. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2018/lei/l13709.htm. Acesso em: 9 jun. 2023.
44 Art. 2, incisos I, II e IV da LGPD. BRASIL. Presidência da República. Lei nº 13.709, de 14 de agosto
de 2018. Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília,
n. 157, p. 59, 15 ago. 2018. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2018/lei/l13709.htm. Acesso em: 9 jun. 2023.
45 Art. 2, incisos V e VI da LGPD. BRASIL. Presidência da República. Lei nº 13.709, de 14 de agosto de
2018. Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, n.
157, p. 59, 15 ago. 2018. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2018/lei/l13709.htm. Acesso em: 9 jun. 2023.
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as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
É bem verdade que os direitos humanos também constam como base jurídica
da lei referida46, mas somente são mencionados uma única vez ao longo de todo o
texto. Não existem outros dispositivos que relacionam a proteção de dados pessoais
e o programa constitucional para os direitos humanos. A LGPD também não faz
referência a entidades de proteção de direitos humanos e ao modo como elas
poderiam atuar na tutela de dados pessoais. Trata-se de uma mera declaração.
Em contraste, o segredo comercial ou industrial é mencionado em quatorze
oportunidades. É interessante destacar o artigo 6º, que enuncia os princípios que o
tratamento de dados pessoais deverá observar. Dentre eles, há o princípio da
transparência, que cria para o responsável do tratamento a obrigação de “garantia,
aos titulares, de informações claras, precisas e facilmente acessíveis sobre a
realização do tratamento e os respectivos agentes do tratamento”. Entretanto,
prevê, no mesmo enunciado, que sejam “observados os segredos comercial e
industrial”47.
Nesse contexto, é preciso enfatizar que os mecanismos tecnológicos estão
construídos sobre estruturas físicas, dotadas de corporeidade. Em outros termos, a
tecnologia em nuvem, é importante que se diga isto, não fica numa “nuvem”. Não é
algo etéreo. É dizer: para que o capitalismo digital possa funcionar, é imprescindível
a instalação da infraestrutura pertinente, que compreende, dentre outros
elementos, os data centers, enfocados neste artigo. Esta infraestrutura traz
implicações não somente para a privacidade ou para os dados pessoais das pessoas,
mas para o trabalho e para o meio ambiente. É preciso tratá-las de maneira
congregada.
46 Art. 2, inciso VII da LGPD. BRASIL. Presidência da República. Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018.
Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, n. 157, 15
ago. 2018. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2018/lei/l13709.htm. Acesso em: 9 jun. 2023.
47 Art. 6º, inciso VI da LGPD. BRASIL. Presidência da República. Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018.
Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, n. 157, p.
59, 15 ago. 2018. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2018/lei/l13709.htm. Acesso em: 9 jun. 2023.
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as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
3 Efeitos trabalhistas e ambientais da implementação de data centers em
território nacional
Para discutir as implicações da implementação de data centers no Brasil,
tomamos como lastro teórico a concepção de que o direito do trabalho deve ser
construído de modo a combinar sua função tradicional, sabidamente centrada na
dignidade da pessoa trabalhadora, e a função ecológica, voltada a evitar desastres
ambientais48. Nesta análise, portanto, o desafio é refletir sobre as consequências da
política brasileira de fomento da implementação das estruturas de data centers a
partir da centralidade do trabalho, mas sem perder de vista as lentes ambientais. A
pergunta que se coloca é: quais são os efeitos trabalhistas e ambientais de ações
estatais orientadas a atrair investimentos e esforços para a construção de grandes
centros de controle de dados em território nacional?
Preocupações semelhantes estão sendo desenvolvidas teoricamente também
na Europa, precisamente em como construir instituições que sejam capazes de
garantir justiça socioecológica49. Alain Supiot50 é outro autor que sustenta que
devemos olhar não somente para o trabalho, mas para os impactos que ele produz
para o meio ambiente.
No Brasil, também há pesquisas dedicadas a enfocar os problemas do mundo
do trabalho de forma associada à questão ambiental. Wyzykowski e Costa51, por
48 CARELLI, Rodrigo. First lines for an ecological labour law: a social utopia for the Anthropocene. In:
BUENO, Nicolas; HAAR, Beryl ter; ZEKIĆ, Nuna (ed.). Labour law utopias: post-growth and post-
productive work approaches. Oxford: Oxford University Press, ago. 2024. DOI:
https://doi.org/10.1093/oso/9780198889755.003.0005. Acesso em: 22 set. 2024.
49 LAURENT, Éloi. The European Green Deal: from growth strategy to social-ecological transition? In:
BART, Vanhercke; SPASOVA, Slavina; FRONTEDDU, Boris (ed.). Social policy in the European Union:
state of play 2020: facing the pandemic. Bruxelas: European Trade Union Institute (ETUI) : European
Social Observatory (OSE), 2021. p. 104. Disponível em:
https://www.etui.org/sites/default/files/2020-
12/Social%20policy%20in%20the%20European%20Union%20state%20of%20play%202020-web.pdf.
Acesso em: 12 set. 2023.
50 SUPIOT, Alain. Le travail n’est pas une merchandise: contenu et sens du travail au xxie siècle.
Paris: Collège de France, 2019. Disponível em: https://books.openedition.org/cdf/7029. DOI:
https://doi.org/10.4000/books.cdf.7026. Acesso em: 12 set. 2023.
51 WYZYKOWSKI, Adriana; COSTA, Beatriz Moraes de Athayde. O “Emprego Verde” como um parâmetro
ajustado à ideia de trabalho decente: uma análise a partir do incentivo e apoio da OIT. Revista
19
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CARELLI, Rodrigo de Lacerda; PEREIRA, Carolline V.; JÚNIOR, Nael N. de Souza. Data centers: uma abordagem sobre
as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
exemplo, buscam compreender os chamados “empregos verdes” e seus respectivos
pressupostos, bem como o papel da Organização Internacional do Trabalho na
promoção do instituto. As autoras investigam se os empregos verdes poderiam
atenuar essa tendência, com vistas a maximizar os benefícios ambientais decorrentes
do rearranjo na pandemia imposto pela necessidade de distanciamento social,
sobretudo no que diz respeito à emissão de gases poluentes, bem como os esforços
políticos internacionais para fomentar uma recuperação econômica lastreada na
economia verde52.
Seferian é outro autor que reforça a necessidade de pensar a “imbricação
das lutas proletárias com aquelas de natureza ecológica”53, reconhecendo a raiz
comum entre a crise do Direito do Trabalho e a crise ecológica. Para tanto, reafirma
o paradigma epistemológico que concebe o Direito do Trabalho como um direito
capitalista, precisamente para alicerçar o argumento da insustentabilidade do
direito laboral. Nesse sentido, realça uma perspectiva crítica, destinada a apontar
os respectivos limites, notadamente no que se refere à ausência de críticas ao
capitalismo e, consequentemente, ao caráter reformista das proposições.54.
Fato é que estamos imersos em uma era denominada Antropoceno, um
período de emergência ambiental e civilizatória originado por ações humanas, o qual
culmina em desdobramentos de proporções catastróficas, especialmente em razão
do modelo de sociedade industrial adotado, ou seja, uma sociedade de consumo
estruturada em torno do uso de combustíveis fósseis. Assim, baseado na exploração
sem fim do trabalho e da terra para fins de produção e consumo com a suposição e
a pretensão de crescimento exponencial e contínuo, resta claro que o modelo atual
Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano, Campinas, v. 5, p. 1-37. 2022. DOI:
https://doi.org/10.33239/rjtdh.v5.134. Acesso em: 17 nov. 2024.
52 WYZYKOWSKI, Adriana; COSTA, Beatriz Moraes de Athayde. O “Emprego Verde” como um parâmetro
ajustado à ideia de trabalho decente: uma análise a partir do incentivo e apoio da OIT. Revista
Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano, Campinas, v. 5, p. 1-37. 2022. DOI:
https://doi.org/10.33239/rjtdh.v5.134 . Acesso em: 17 nov. 2024.
53 SEFERIAN, Gustavo. Crítica ao Direito do Trabalho Insustentável. Revista Jurídica Trabalho e
Desenvolvimento Humano, Campinas, v. 6, p. 1-29, 2023, p. 25. DOI:
https://doi.org/10.33239/rjtdh.v6.176. Acesso em: 19 nov. 2024.
54 SEFERIAN, Gustavo. Crítica ao Direito do Trabalho Insustentável. Revista Jurídica Trabalho e
Desenvolvimento Humano, Campinas, v. 6, p. 1-29, 2023. DOI:
https://doi.org/10.33239/rjtdh.v6.176. Acesso em: 19 nov. 2024.
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CARELLI, Rodrigo de Lacerda; PEREIRA, Carolline V.; JÚNIOR, Nael N. de Souza. Data centers: uma abordagem sobre
as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
é completamente insustentável55. E nesse ponto, chama atenção o projeto de criação
de data centers no Brasil, tendo em vista que se mostra contrário à ideia de
progresso.
Nesse contexto, aliás, vale frisar como bem destaca Kate Crawford56, que a
computação avançada e a sua infraestrutura raramente são associadas a questões
como a “pegada de carbono”57, combustíveis fósseis e poluição. Em geral, nesse
cenário o que se nota é a utilização de metáforas como "a nuvem" que sugere “algo
flutuante e delicado dentro de um setor natural e verde”, mas que na prática oculta
uma outra realidade, como é o caso dos servidores escondidos em data centers e
seus poluentes que passam despercebidos, já que são muito menos visíveis do que as
chaminés de fumaça das usinas movidas a carvão.
No tópico de seu artigo denominado “o mito da tecnologia limpa” (em inglês:
The Myth of Clean Tech), a autora continua a confrontar o imaginário de que as
práticas em torno da computação avançada seriam desprovidas de impactos
ambientais. Para tanto, enfatiza a importância de recursos minerais para o
desenvolvimento de dispositivos informatizados que utilizamos em nosso cotidiano,
assim como da energia elétrica.
Ainda no bojo de sua crítica, aborda também os esforços para a construção
de data centers, sublinhando o necessário consumo de água e de eletricidade para
alimen-los58. A autora menciona especificamente as experiências da indústria de
data centers da China e do uso militar pelos Estados Unidos para demonstrar os
impactos ambientais causados por esse tipo de infraestrutura tecnológica.
55 CARELLI, Rodrigo. First lines for an ecological labour law: a social utopia for the Anthropocene. In:
BUENO, Nicolas; HAAR, Beryl ter; ZEKIĆ, Nuna (ed.). Labour law utopias: post-growth and post-
productive work approaches. Oxford: Oxford University Press, ago. 2024. p. 1-2. DOI:
https://doi.org/10.1093/oso/9780198889755.003.0005. Acesso em: 22 set. 2024.
56 CRAWFORD, Kate. Atlas of AI: power, politics, and the planetary costs of artificial intelligence.
London: Yale University Press, 2021. p. 41.
57 Segundo reportagem da National Geographic: "A pegada de carbono representa a quantidade de
gases do efeito estufa emitida na atmosfera por alguma atividade humana, que pode ser um produto
ou um serviço, ou pelas ações diárias de um habitante." O QUE é a pegada de carbono e como medi-
la. National Geographic, 16 maio 2022. Seção Meio ambiente. Disponível em:
https://www.nationalgeographicbrasil.com/meio-ambiente/2022/05/o-que-e-a-pegada-de-carbono-
e-como-medi-la. Acesso em: 29 set. 2024.
58 CRAWFORD, Kate. Atlas of AI: power, politics, and the planetary costs of artificial intelligence.
London: Yale University Press, 2021. p. 43-44.
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CARELLI, Rodrigo de Lacerda; PEREIRA, Carolline V.; JÚNIOR, Nael N. de Souza. Data centers: uma abordagem sobre
as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
Em obra mais recente, Mejias e Couldry59 também encampam a crítica
ambiental aos data centers. Segundo os autores, os data centers constituem um
exemplo concreto de que como as consequências ambientais não estão
satisfatoriamente postas no debate público acerca da nossa vida digital, destacando
a necessidade crescente de energia elétrica demandada para funcionamento e de
água para resfriamento dos computadores.
Discutem, ainda, a necessidade de outros insumos ambientais, como certos
tipos de minerais, para produção dos outros dispositivos tecnológicos necessários
para a vida digital geralmente extraídos dos continentes africano, asiático e latino-
americano, a reforçar o argumento sobre as práticas colonizadoras fundadas no
extrativismo de dados, e enfatizam os dados sobre o lixo eletrônico produzido ao
final do ciclo ambiental da tecnologia60.
Além do imenso consumo de água necessário, não se pode deixar de falar
que essas estruturas também se valem de grande quantidade de energia, bem como
são responsáveis por significativa emissão CO2. Inclusive, de acordo com a
International Energy Agency (IEA), os data centers são responsáveis por 0,3% de todas
as emissões globais de dióxido de carbono (150 milhões de toneladas de CO2 por
ano)61 e, em 2022, consumiram aproximadamente de 240 a 340 TWh (terawatt-hora),
o equivalente a 1,3% da demanda global de eletricidade62.
Nesse âmbito, Lemos63 expõe que a indústria de dados e plataformas acaba
por contribuir na intensificação da crise climática na era do Antropoceno, uma vez
que é essencial a utilização de recursos naturais, como a extração de minerais e
59 MEJIAS, Ulises Ali; COULDRY, Nick. Data grab: the new colonialism of big tech and how to fight
back. Chicago: The University of Chicago Press, 2024.
60 MEJIAS, Ulises Ali; COULDRY, Nick. Data grab: the new colonialism of big tech and how to fight
back. Chicago: The University of Chicago Press, 2024.
61 GARATTONI, Bruno. Datacenters submersos prometem emitir 40% menos CO2. Super Interessante,
27 out. 2022. Disponível em: https://super.abril.com.br/carbono-zero/datacenters-submersos-
prometem-emitir-40-menos-co2. Acesso em: 18 set. 2023.
62 MOTA, Renato. O impacto dos data centers no consumo de energia e no clima. Jornal da Economia
Digital, Recife, [24 ago. 2023]. Disponível em: https://jornaldigital.recife.br/2023/08/14/o-impacto-
dos-data-centers-no-consumo-de-energia-e-no-clima/. Acesso em: 18 set. 2023.
63 LEMOS, A. dataficação da vida. Civitas: revista de Ciências Sociais, [S. l.], v. 21, n. 2, p. 196, 2021.
DOI: 10.15448/1984-7289.2021.2.39638. Disponível em:
https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/civitas/article/view/39638. Acesso em: 19 set. 2023.
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as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
obtenção de energia, para sustentar a produção de dispositivos eletrônicos e o
funcionamento dos data centers. Nesse sentido, ele complementa ainda que:
O uso dos dados na internet exige também grande consumo de combustíveis
fósseis nos data centers e na infraestrutura urbana, apesar dos esforços
atuais de algumas empresas para neutralizarem a pegada de carbono. O
consumo é crescente, produzindo desperdício com a rápida obsolescência
programada na necessidade de upgrade constante dos equipamentos. Alguns
exemplos são: (i) para movimentar a moeda virtual Bitcoin, são necessários
2 milhões de toneladas de emissões de CO2 por ano, o que equivale a toda
a pegada de carbono da Jordânia; (ii) a energia consumida pelos data-
centers do Facebook, só para uso dos brasileiros, equivale ao consumo de
energia de mais de 15 mil residências no país pelo mesmo período64.
É importante notar ainda que a criação de sistemas de inteligência artificial,
além de depender de uma grande quantidade de dados e mão de obra barata,
também se valem da exploração de recursos energéticos e minerais65, que tem
relação com a utilização de datas centers. Desse modo, o desejo de aumentos
exponenciais de velocidade e precisão, demandas de processamento dos modelos de
inteligência artificial, o seu treinamento, a coleta sistemática de uma alta escala de
dados e o uso de mais ciclos computacionais para se alcançar resultados melhores,
têm gerado um alto custo para o nosso planeta66.
Nesse contexto, aliás, uma matéria do jornal “O Globo”67 chamou atenção
para a estimativa do relatório da Agência Internacional de Energia (AIE) em relação
ao consumo de energia dos centros de processamento de dados no mundo, que foi
de 460 TWh em 2022, podendo chegar a 1.050 TWh até 2026, tendo em vista a
evolução da inteligência artificial. Isto é, tal cenário representaria o dobro do
64 LEMOS, A. dataficação da vida. Civitas: revista de Ciências Sociais, [S. l.], v. 21, n. 2, p. 197, 2021.
DOI: 10.15448/1984-7289.2021.2.39638. Disponível em:
https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/civitas/article/view/39638. Acesso em: 19 set. 2023.
65 CRAWFORD, Kate. Atlas of AI: power, politics, and the planetary costs of artificial intelligence.
London: Yale University Press, 2021. p. 18.
66 CRAWFORD, Kate. Atlas of AI: power, politics, and the planetary costs of artificial intelligence.
London: Yale University Press, 2021. p. 43.
67 GULLINO, Daniel. Processamento de dados em alta velocidade por conta da inteligência artificial
equivale ao consumo anual de toda França: em dois anos, sistemas consumirão ‘dois Brasis’ em
energia. O Globo, 16 jun. 2024. Seção Tecnologia. Disponível em:
https://oglobo.globo.com/economia/tecnologia/noticia/2024/06/16/inteligencia-artificial-exigira-
energia-de-dois-brasis-ate-2026-veja-por-que-a-tecnologia-demanda-tanto.ghtml. Acesso em: 29 set.
2024.
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CARELLI, Rodrigo de Lacerda; PEREIRA, Carolline V.; JÚNIOR, Nael N. de Souza. Data centers: uma abordagem sobre
as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
consumo anual de energia do Brasil68. Além do mais, a reportagem ressalta, em razão
desse quadro, a possibilidade de ocorrer outros efeitos, como um maior incentivo à
mineração (em razão dos metais raros usados na fabricação de equipamentos e
componentes de data centers) e a formação de uma maior quantidade de lixo
eletrônico.
E, como expõe Crawford69, pensar apenas em termos de custo econômico
limita a visão da compreensão mais ampla do impacto local e ambiental em
decorrência dos ciclos de computação como forma de criar eficiências incrementais.
Nesse sentido, “a tendência ao ‘maximalismo da computação’ demonstra impactos
ecológicos profundos”.
Assim, quanto à questão ambiental, não se pode ignorar os diversos impactos
dos data centers, que, inclusive, têm sido visualizados como uma relevante
preocupação. Ainda que haja projetos de os tornar ainda mais eficientes em termos
de energia e aumentar o uso de energia renovável, a pegada de carbono da
infraestrutura computacional mundial já se equiparou a do setor de aviação em seu
auge e continua aumentando70.
Em relação aos mencionados esforços para neutralizar os efeitos nocivos no
ambiente, ao adentrarmos no documento da ABDI71, observamos, na verdade, que
são verificados de forma genérica como incentivos recomendados, mas não
explicitados como obrigatórios.
68 A reportagem destaca que para gerar entre 10 e 50 respostas, o robô virtual da OpenAI consome
cerca de 500 ml de água, dependendo da localização dos data centers. Essa estimativa é baseada em
um modelo mais antigo, e é provável que o consumo seja maior em sistemas mais recentes, como o
ChatGPT-4. GULLINO, Daniel. Processamento de dados em alta velocidade por conta da inteligência
artificial equivale ao consumo anual de toda França: em dois anos, sistemas consumirão ‘dois Brasis’
em energia. O Globo, 16 jun. 2024. Seção Tecnologia. Disponível em:
https://oglobo.globo.com/economia/tecnologia/noticia/2024/06/16/inteligencia-artificial-exigira-
energia-de-dois-brasis-ate-2026-veja-por-que-a-tecnologia-demanda-tanto.ghtml. Acesso em: 29 set.
2024.
69 CRAWFORD, Kate. Atlas of AI: power, politics, and the planetary costs of artificial intelligence.
London: Yale University Press, 2021. p. 43.
70 CRAWFORD, Kate. Atlas of AI: power, politics, and the planetary costs of artificial intelligence.
New London: Yale University Press, 2021. p. 42.
71 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. Disponível em:
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
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CARELLI, Rodrigo de Lacerda; PEREIRA, Carolline V.; JÚNIOR, Nael N. de Souza. Data centers: uma abordagem sobre
as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
Portanto, é visível que garantir a conectividade global está longe de ser uma
realidade sustentável, e toda essa exploração de recursos atrelada ao fomento de
implementação de data centers em território nacional nos leva a concluir que não é
uma prioridade do Estado diminuir o impacto das mudanças climáticas, nem
promover proteção da sociedade atual e das gerações futuras.
No mais, além do ambiental, é preciso enfatizar o aspecto trabalhista. Nesse
contexto, duas questões adquirem centralidade:
A primeira diz respeito à falta de compatibilidade dessa política de atrair
novos investidores da área de tecnologia para a instalação de data centers com os
movimentos contrários às novas formas de gestão da força de trabalho através das
plataformas digitais, como é o caso da uberização e demais desdobramentos que
impliquem em novos cenários que propiciem maior expansão como a dominação e
discriminação algorítmica, bem como a evolução do capitalismo de vigilância, o qual,
ao invés de centrar no trabalho propriamente dito, tem como intuito se valer dos
aspectos da experiência dos indivíduos72.
Muldoon e Raekstad73 desenvolvem o conceito de discriminação algorítmica,
precisamente no que interessa ao controle de trabalhadores pelas empresas. Para
eles, a dominação algorítmica se dá quando empregadores se utilizam de
ferramentas algorítmicas para exercer seu poder incontrolado sobre seus
trabalhadores. Ainda segundo eles, o poder seria “incontrolado” porque não seria
dado aos trabalhadores o direito de participação ou de influência de maneira efetiva
na dinâmica laboral. Uma das facetas de exercício da dominação algorítmica está
fundada justamente na possibilidade de acesso, pelas empresas empregadoras, de
dados sobre a performance dos trabalhadores, os quais são utilizados para subsidiar
a aplicação de sanções ou de recompensas74.
72 ZUBOFF, Shoshana. A era do capitalismo de vigilância: a luta por um futuro humano na nova
fronteira do poder. Tradução George Schlesinger. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2020. p. 20.
73 MULDOON, James; RAEKSTAD, Paul. Algorithmic domination in the Gig Economy. European Journal
of Political Theory, v.22, n. 4, fev. 2022. DOI: https://doi.org/10.1177/14748851221082078. Acesso
em: 20 set. 2023.
74 MULDOON, James; RAEKSTAD, Paul. Algorithmic domination in the Gig Economy. European Journal
of Political Theory, v.22, n. 4, fev. 2022. DOI: https://doi.org/10.1177/14748851221082078. Acesso
em: 20 set. 2023. p. 598.
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CARELLI, Rodrigo de Lacerda; PEREIRA, Carolline V.; JÚNIOR, Nael N. de Souza. Data centers: uma abordagem sobre
as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
Além da dominação algorítmica, há outra forma de sujeição das pessoas
trabalhadoras pela economia de dados. Veena Dubal75 aborda o trabalho de pessoas
trabalhadoras no setor de processamento de dados, imprescindíveis para o
desenvolvimento dos mecanismos de inteligência artificial:
Mas é central para a infraestrutura da IA o trabalho de trabalhadores
dispersos e atomizados em cadeias de suprimentos globais que criam,
reúnem, apanham, limpam, etiquetam, e processam os dados que informam
e moldam os sistemas de IA. Por meio de uma combinação de trabalho em
domicílio e remuneração por peça, o trabalho destes trabalhadores de dados
é essencial para o ritmo e o crescimento da IA. Eles e outros trabalhadores
negligenciados são (e continuarão a ser) indispensáveis para a produção de
automação por décadas à frente76.
Embora essenciais para o funcionamento da infraestrutura informacional, a
autora revela que as respectivas condições de trabalho dessas pessoas são
invisibilizadas e, consequentemente, juridicamente mal disciplinadas, de modo que
esses trabalhadores majoritariamente trabalhadoras têm vulnerados diversos de
seus direitos trabalhistas, tais como o de previsibilidade de sua remuneração e de
conciliação de tempo de trabalho com o tempo para a realização de afazeres
familiares.
Em artigo mais recente, Veena Dubal aborda outro modo de vulneração de
direitos das pessoas trabalhadoras possibilitada pelo nocivo e desregulamentado
controle de dados por empregadores: a discriminação salarial algorítmica77. Em
outros termos, no âmbito do trabalho digital, além da previsibilidade78, há prejuízo
da igualdade salarial, notadamente quando pessoas que, embora com as mesmas
75 DUBAL, Veena. A política do tempo no trabalho digital por peça baseado em domicílio. Teoria
Jurídica Contemporânea, [Rio de Janeiro], v. 6, 5 mar. 2021. No original, em inglês: The time politics
of home-based digital piecework. Tradução: Rodrigo de Lacerda Carelli. Disponível em:
https://revistas.ufrj.br/index.php/rjur/article/view/e43067. Acesso em: 29 set. 2024.
76 DUBAL, Veena. A política do tempo no trabalho digital por peça baseado em domicílio. Teoria
Jurídica Contemporânea, [Rio de Janeiro], v. 6, 5 mar. 2021. No original, em inglês: The time politics
of home-based digital piecework. Tradução: Rodrigo de Lacerda Carelli. Disponível em:
https://revistas.ufrj.br/index.php/rjur/article/view/e43067. Acesso em: 29 set. 2024. p. 6.
77 DUBAL, Veena. On Algorithmic Wage Discrimination. UC San Francisco Research, Paper No.
Forthcoming, 2023. DOI: http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.4331080. Acesso em: 29 set. 2024.
78 DUBAL, Veena. A política do tempo no trabalho digital por peça baseado em domicílio. Teoria
Jurídica Contemporânea, [Rio de Janeiro], v. 6, 5 mar. 2021. No original, em inglês: The time politics
of home-based digital piecework. Tradução: Rodrigo de Lacerda Carelli. Disponível em:
https://revistas.ufrj.br/index.php/rjur/article/view/e43067. Acesso em: 29 set. 2024.
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as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
habilidades e no escopo da mesma empresa, são remuneradas de forma distintas pelo
mesmo trabalho que desenvolvem79.
A discriminação salarial algorítmica, viabilizada pelos recentes avanços em
tecnologia de aprendizado de máquina e de computação em nuvem80, não prescinde
do controle empresarial de dados de performance de trabalhadores81 e consiste em
prática possibilitada também pela dominação algorítmica, na forma desenvolvida por
Muldoon e Raekstad82, sobretudo porque também está fundada em assimetria
informacional e em controle unilateral da dinâmica salarial.
A segunda questão a ser mencionada é o próprio enfraquecimento do Direito
do Trabalho. Como se observa no projeto de data centers lançado pela ABDI83, é
retomada a ideia de uma legislação trabalhista brasileira que supostamente reduz o
alcance do desenvolvimento econômico e financeiro ao trazer uma lista de
representantes do empresariado que identificam as leis trabalhistas como
limitadoras dos negócios. E não é só: o mesmo documento, tendo como base o Índice
de Competitividade Global do WEF/Fórum Económico Mundial (2018), expõe que “o
Brasil não performa bem em nenhuma das métricas utilizadas pelo WEF”, trazendo
como enfoques negativos as regras de contratação, demissão e até mesmo em
relação aos salários, as quais são consideradas excessivamente inflexíveis pelos
empresários84.
79 DUBAL, Veena. On Algorithmic Wage Discrimination. UC San Francisco Research, Paper No.
Forthcoming, p. 7, 2023. 7. DOI: http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.4331080. Acesso em: 29 set. 2024.
80 DUBAL, Veena. On Algorithmic Wage Discrimination. UC San Francisco Research, Paper No.
Forthcoming, p. 5, 2023. DOI: http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.4331080. Acesso em: 29 set. 2024.
81 O controle de dados pessoais de trabalhadores está presente no núcleo conceitual apresentado pela
autora “Por discriminação salarial algorítmica, refiro-me a uma prática na qual trabalhadores
individuais recebem salários por hora distintos calculados com fórmulas que mudam a todo tempo,
usando dados granulares sobre localização, comportamento individual, demanda, oferta, entre outros
fatores para trabalhos amplamente semelhantes. DUBAL, Veena. On Algorithmic Wage
Discrimination. UC San Francisco Research, Paper No. Forthcoming, p. 5, 2023 (tradução nossa). DOI:
http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.4331080. Acesso em: 29 set. 2024.
82 MULDOON, James; RAEKSTAD, Paul. Algorithmic domination in the Gig Economy. European Journal
of Political Theory, v.22, n. 4, fev. 2022. DOI: https://doi.org/10.1177/14748851221082078. Acesso
em: 20 set. 2023.
83 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 277-278. Disponível em:
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
84 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 279. Disponível em:
27
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Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região
CARELLI, Rodrigo de Lacerda; PEREIRA, Carolline V.; JÚNIOR, Nael N. de Souza. Data centers: uma abordagem sobre
as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
Ademais, o relatório de Estratégia para a implementação de política pública
para atração de data centers traz um discurso de destaque em relação às
modificações ocorridas recentemente, tal qual a maior flexibilidade trazida pela
Reforma Trabalhista (em que pese ressaltar certa falta de consenso entre o
Judiciário) e demais mudanças referentes às leis trabalhistas, como em 2019, com a
Lei da Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019), a qual é definida como uma
“importante tentativa de reduzir o impacto da burocracia governamental na
atividade econômica85.” Ou seja, na prática, o que se observa é um nítido discurso
neoliberal, em que o Estado tem por fim legitimar o mercado acima de tudo e de
todos.
Nesse ponto, inclusive, observa-se a concretização das lições de Supiot86,
tendo em vista que a virada neoliberal “não conduziu à reabertura de um debate
democrático sobre a questão de saber o que e como produzir, mas, ao contrário, a
atribui aos Estados novos objetivos cifrados de disciplina orçamental ou monetária e
de redução de impostos e benefícios sociais.”
Logo, enquanto deveria haver a compreensão e o combate contra à
precarização do trabalho consequente da uberização e o fortalecimento da legislação
laboral, o Estado busca fomentar negócios contrários aos trabalhadores e ao próprio
meio ambiente, abraçando assim uma pauta integralmente neoliberal, fazendo com
que os direitos fundamentais como a proteção ao meio ambiente (art. 225 da CRFB),
a valorização do trabalho (art. 170 da CRFB) a sua proteção (art. 7º e seguintes da
CRFB) sejam colocados em risco.
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
85 AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Programa ABDI 2030 Rota Estratégica
Nova Economia 2030. Fortaleza: FIEC, 2022. p. 279-280. Disponível em:
https://api.abdi.com.br/uploads/files/project/63c06eb1c48a44.59370960.pdf. Acesso em: 18 maio
2023.
86SUPIOT, Alain. Le travail n’est pas une merchandise: contenu et sens du travail au xxie siècle.
Paris: Collège de France, 2019. p. 9. Disponível em: https://books.openedition.org/cdf/7029. DOI:
https://doi.org/10.4000/books.cdf.7026. Acesso em: 12 set. 2023.
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Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano
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CARELLI, Rodrigo de Lacerda; PEREIRA, Carolline V.; JÚNIOR, Nael N. de Souza. Data centers: uma abordagem sobre
as suas implicações trabalhistas e ambientais no Brasil. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como ora exposto, falar sobre plataformas digitais é também falar sobre a
dataficação, acumulação de dados, lucratividade e diversos impactos. E entre eles,
não se pode deixar de falar nas políticas de incentivos que passam a surgir dentro
desse cenário, como é o caso do projeto de inserção de data centers no Brasil. Nesse
contexto, o presente artigo proporciona uma análise sobre a implementação de data
centers no Brasil e seus efeitos em meio ao processo de digitalização.
Ao destacar a importância dessas estruturas físicas, o estudo revela uma
interconexão entre as plataformas digitais e a gestão algorítmica, dataficação e a
Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) e, a partir desse conjunto de temas
entrelaçados, observamos a necessidade de se refletir sobre quais os interesses
desses data centers, sejam eles econômicos, financeiros, comerciais ou geopolíticos.
O que podemos esperar em relação aos dados pessoais utilizados por essas empresas?
Além disso, a partir da análise bibliográfica, documental em notícias
jornalísticas, foi demonstrado que esse tipo de infraestrutura dos data centers traz
implicações não somente para a privacidade ou para os dados pessoais das pessoas
consumidoras, mas também para o mundo do trabalho e para o meio ambiente. A
política brasileira de atração de data centers, portanto, pode criar condições não
somente para maior degradação ambiental em território nacional, mas também em
incremento da precarização das condições de trabalho, sobretudo naquelas
ocupações mais atravessadas pelo gerenciamento algorítmico e pelo controle de
dados de trabalhadores.
Afinal, como expusemos, os data centers consistem em importante
componente da infraestrutura em que se fundam as práticas tecnológicas
contemporâneas (inteligência artificial, internet das coisas, computação em nuvem
etc.), alimentando cada vez mais o extrativismo de dados de trabalhadores que
viabiliza experiências de dominação e discriminação algorítmica.
Ademais, o núcleo de iniciativas políticas em que se insere a pretensão de
atrair data centers está estruturado numa perspectiva enviesada (neoliberal) acerca
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Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
do direito do trabalho, cuja leitura declaradamente é a de que a legislação
trabalhista é um empecilho ao desenvolvimento econômico, inclusive com adesão à
retórica de austeridade, circunstância que revela quem têm sido as pessoas
responsáveis por pensar e estruturar a política de atrair data centers ao Brasil, as
mesmas que diuturnamente esforçam-se para a erosão do direito do trabalho
brasileiro.
Portanto, o desafio do trabalho consistiu em ponderar sobre os
desdobramentos da política brasileira de implementação de estruturas de data
centers, com ênfase nas repercussões para o trabalho e para o meio ambiente. O
tema, apesar de pouco discutido, mostra-se relevante, sendo certo que
preocupações semelhantes estão sendo desenvolvidas teoricamente também na
Europa, precisamente em como construir instituições que sejam capazes de garantir
justiça socioecológica.
Assim, este trabalho fornece elementos para pensar e debater criticamente,
por exemplo, o programa econômico da ABDI para 2030, que subsidia
ideologicamente a política brasileira para a transformação digital em escala
nacional, principalmente no que diz respeito à implementação de data centers. O
documento enfocado neste artigo foi produzido em 2022, ainda quando do governo
Bolsonaro.
Percebe-se que o Brasil pretende se inserir no processo de dataficação
mundial pelo seu lado menos nobre: exploração de recursos humanos e de trabalho
barato. A periferia fica com a parte suja, enquanto os lucros, e os dados, ficam nos
países centrais.
Diante disso, considerando os impactos ambientais e trabalhistas causados
pelos data centers, revela-se imediatamente necessário alçar tais questões ao
escrutínio público e democrático. Tais decisões não devem ficar restritas aos
gabinetes ministeriais do Poder Executivo, como se os representantes dos
trabalhadores ou ambientalistas não tivessem nada a acrescer ou a contestar. Afinal,
a infraestrutura tecnológica da qual os data centers fazem parte é feita de carne e
osso e de terra e água. A inclusão do Brasil na dataficação pelo seu lado de
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Campinas, v. 7, p. 1-34, 2024. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.253.
exploração de recursos humanos e naturais é uma escolha, que deve ser esclarecida
e criticada.
REFERÊNCIAS
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Rodrigo de Lacerda Carelli
Pesquisador Coordenador e pesquisador do TRAB21, vinculado à Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ). Doutor em Ciências Humanas: Sociologia, pelo IESP/UERJ. Pós-Doutorado no
Lise - Laboratoire interdisciplinaire pour la sociologie économique, no Cnam - Conservatoire
nationale des arts et métiers, Paris, França. Lattes: http://lattes.cnpq.br/6162675542648709.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5504-1198. E-mail: rodrigolcarelli@gmail.com.
Carolline Vasconcellos Pereira
Pesquisadora do grupo de pesquisa TRAB21, vinculada à Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ). Mestra em Direito pelo Programa de Pós-Graduação da UFRJ. Especialista em Direito e
Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes. Lattes:
http://lattes.cnpq.br/5215893747717226. ORCID: https://orcid.org/0009-0008-0258-267x. E-
mail: carollinevpereira@gmail.com.
Nael Neri de Souza Júnior
Pesquisador dos grupos de pesquisa CIRT e TRAB21, ambos da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ). Mestre em Direito pelo Programa de Pós-Graduação da UFRJ. Lattes:
http://lattes.cnpq.br/1780781344098422. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7889-0598. E-
mail: nael.junior@hotmail.com.