23
Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano
Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região
FRITZ, Karen Beltrame Becker; VIEIRA, Pedro Guimarães. Questão ambiental e fragilidade do Estado Democrático de
Direito: uma análise a partir da crise socioeconômica e do desmantelamento dos direitos sociais do trabalho. Revista
Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano, Campinas, v.7, p. 1-31, 2024. DOI:
https://doi.org/10.33239/rjtdh.v7.229.
propícia ao surgimento de “afetos tristes”
84
em amplos espectros da sociedade, o
que está atrelado à crise político-democrática por três aspectos principais.
Em primeiro lugar, o sentimento de mal-estar provoca o surgimento de uma
postura antipolítica, caracterizada como uma forma de aversão à cidadania e à
política em si, que é vista como algo sujo
85
. A manipulação dessa aversão – sobretudo
a partir de interações pelas redes sociais, cujas formas de mobilização estimulam a
polarização, baseada em lógicas algorítmicas
86
- propicia a ascensão ao poder de
governos com características autoritárias
87
. Em geral, esses governos são
comandados por uma autoridade carismática que se apresenta como um outsider do
sistema político
88
, capaz de vocalizar as aspirações populares diretamente, sem
qualquer intermediação das instituições democráticas
89
.
Em segundo lugar, a ascensão de governos com traços autoritários ocasiona
um clima de guerra cultural, baseada na intimidação dos críticos e na oposição ao
livre funcionamento das instituições democráticas e, no limite, ao próprio direito,
convertido pelo discurso antissistêmico em um ardil das elites
90
. Por meio dessa
postura, não se procura reformar o sistema político, mas sim restaurar um passado
84
STARLING, Heloisa Murgel; LAGO, Miguel; BIGNOTTO, Newton. Linguagem da destruição: A
democracia brasileira em crise. São Paulo, Companhia das Letras, 2022, p. 113.
85
BAUMAN, Zygmunt; BORDONI, Carlo. Estado de crise. Rio de Janeiro: Zahar, 2016, p. 8, 20.
86
EMPOLI, Giuliano Da. Os engenheiros do caos. São Paulo: Vestígios, 2019.
87
No Brasil, esse ressentimento revela-se na oposição à “velha política”, identificada com práticas de
corrupção e com o presidencialismo de coalização, o que explica o amplo apoio inicial recebido por
operações de órgãos do sistema justiça para seu combate, como a Operação Lava-Jato. Havia, assim,
um “clima de terra arrasada”, diante da crise interna do modelo de governabilidade e do esgotamento
da própria política social-democrata do Partidos dos Trabalhadores, que propiciou a eleição de um
candidato que se apresentava como outsider, como o ex-Presidente Jair Bolsonaro. LYNCH, Christian
Edward Cyril. Ascensão, fastígio e declínio da “Revolução Judiciarista”. Insight Inteligência. Rio de
Janeiro, n. 79, p. 158-171, out./dez. 2017.
88
NOBRE, Marcos. Limites da democracia: de junho de 2013 ao governo Bolsonaro. São Paulo:
Todavia, 2022, p. 116.
89
Os governos autoritários emergentes não procuram eliminar o mal-estar da população em geral.
Pelo contrário, precisam dele para se manterem no poder e sedimentarem o vínculo do líder com o
povo. LYNCH, Christian Edward Cyril. A utopia reacionária do governo Bolsonaro (2018-2020). Insight
Inteligência. Rio de Janeiro, n. 89, p. 21-43, abr./jun. 2020, p. 3, 11; LYNCH, Christian Edward Cyril;
CASSIMIRO, Paulo Henrique Paschoeto. O populismo racionário no poder: uma radiografia ideológica
da presidência Bolsonaro (2018-2021). Aisthesis. Santiago, Chile, n. 70. p. 223-249, 2021; EMPOLI,
Giuliano Da. Os engenheiros do caos. São Paulo: Vestígios, 2019.
90
NUNES, Rodrigo. Do transe à vertigem: Ensaios sobre bolsonarismo e um mundo em transição. São
Paulo: Ubu editora, 2022.