A evolução do conflito dos estivadores
portuários na Espanha
1
La evolución del conflicto de estibadores portuarios en España
The evolution of the conflict of dockworkers in Spain
Antonio Ojeda Avilés²
RESUMO
O artigo trata da questão do trabalho portuário na Espanha, demonstrando os caminhos pelos
quais tomaram rumo o conflito entre empregados e empregadores, potencializado, neste setor,
pela interferência realizada pelo Estado, e, indiretamente, pela Comunidade Europeia. Por meio
de uma análise crítica e de jurisprudência comunitária, o autor demonstra que as recentes
alterações na legislação portuária causaram prejuízos à classe trabalhadora, retirando-lhe
condições mais favoráveis anteriormente percebidas em atendimento aos clamores da
liberalização dos portos, o que vai ao encontro da livre concorrência e do princípio da “maior
atratividade”. Com isso, demonstra-se que a intervenção estatal espanhola na questão, por meio
da edição de novos atos normativos, viola direitos previstos na Convenção 137 da OIT, ratificada
pela Espanha, ao passo que sua edição é motivada pela intervenção do setor econômico na
atividade pública, operacionalizada pelo governo conservador instalado no país em questão à
época.
PALAVRAS-CHAVE: trabalho portuário; conflito; mediação; livre concorrência; valor social do
trabalho.
RESUMEN
El artículo aborda el tema del trabajo portuario en España, demostrando las formas en que se
desarrolló el conflicto entre empleados y empleadores, potenciado en este sector por la
interferencia llevada a cabo por el Estado e, indirectamente, por la Comunidad Europea. A través
de un análisis crítico y la jurisprudencia de la comunidad, el autor demuestra que los cambios
recientes en la legislación portuaria han causado daños a la clase trabajadora, eliminando de ella
las condiciones más favorables previamente percibidas en respuesta a los llamados a la
liberalización de los puertos, que está en línea con la libre competencia y el principio de "mayor
atractivo". Con esto, queda demostrado que la intervención estatal española en el tema, a través
de la edición de nuevos actos normativos, viola los derechos previstos en el Convenio 137 de la
OIT, ratificado por España, mientras que su edición está motivada por la intervención del sector
económico en la actividad pública, operado por el gobierno conservador instalado en el país en
cuestión en ese momento.
PALABRAS CLAVE: trabajo portuario; conflicto; mediación; libre competencia; valor social del
trabajo.
ABSTRACT
The article deals with the question of port work in Spain, demonstrating the ways in which the
conflict between employees and employers, fueled by the State and indirectly by the European
Community, has increased. Through a critical analysis and community jurisprudence, the author
1 Tradução inédita para a língua portuguesa. Artigo original publicado na Revista Justicia Social, nº 87, janeiro-
março de 2017, p. 29-35. Disponível em:
https://www.issuu.com/colegiooficialdegraduadossocialesde/docs/revista_justicia_social_87/30
. Tradução e
adaptação: Gabriela Costa e Silva, Mestre em Direito Público pela Universidade Federal da Bahia - UFBA,
Analista Processual nos quadros do Ministério Público da União - Procuradoria Regional do Trabalho da
15ª Região - Campinas/SP e Editora Assistente da Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano Revista
da Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região. Tradução e publicação aprovadas pelo autor.
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shows that the recent changes in the port legislation have caused damages to the working class,
removing more favorable conditions previously perceived in response to the calls of the
liberalization of the ports, which is in line with the free competition and the principle of "greater
attractiveness". Thus, it is demonstrated that the Spanish intervention in the matter, by means
of the edition of new normative acts, violates rights provided for in ILO Convention 137, ratified
by Spain, while its edition is motivated by the intervention of the economic sector in the public
activity, operated by the conservative government installed in the country in such time.
KEYWORDS: port work; conflict; mediation; free competition; social value of work.
Introdução: Antecedentes
Devido a sua estrutura geográfica como península situada na rota dos grandes
cargueiros que fazem o caminho entre a China e o coração industrial da Europa, a Espanha
dispõe de portos com um intenso tráfego marítimo, nos quais trabalha uma grande
quantidade de estivadores em embarcadouros de avançado nível tecnológico. Há tempos, o
modo de operação dos portos sofre uma profunda crise, o que é causado e se pode dizer
desde o princípio pelo Estado, em uma intervenção atropelada pretendendo uma
reconversão para a liberalização das relações de trabalho, ignorando o estabelecido pela
Convenção 137/1973 da OIT ratificada por este país
2
.
2 Uma Convenção, diga-se de passagem, que só foi ratificada por 24 países, na qual se percebem significativas
ausências como Estados Unidos e China. O Brasil ratificou a Convenção em 12 de agosto de 1994. Na América
Latina a ratificaram também a Costa Rica, Cuba, a Nicarágua e o Uruguai. Da União Europeia foi ratificada pela
Espanha, Finlândia, França, Itália, Noruega, Polônia, Portugal, Romênia e Suécia. Pelos Países Baixos foi ratificada
em 1976 e denunciada em 2006.
3
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O conflito entre os estivadores portuários, as empresas estivadoras e o governo
atravessa praticamente todo o período do governo conservador no poder com o Sr. Mariano
Rajoy como chefe e chega até os dias atuais, em que nos encontramos em um labirinto
devido a um governo solitário que, sem a participação dos sindicatos e empresários da estiva,
editou um Decreto-Lei em maio de 2017, desfazendo toda a situação anterior, mas que se
mostra incapaz de interferir na regulação da estiva sem que as partes coletivas respaldem a
nova estrutura. Bem é verdade que em seu apoio acudiram a Comissão Europeia e um lobby
formado por um grupo seleto de empresas marítimas, a Plataforma Investidora de Portos
Espanhóis (PIPE), contrária à negociação coletiva e possivelmente instigadora da intervenção
do governo
3
. Em meio ao conflito, os meios de comunicação espanhóis há tempos já
condenaram os estivadores portuários, escandalizados pelos elevados salários que
aparentemente recebem, segundo um informe da consultora Price Waterhouse and Cooper
(PW&C) a instâncias da organização das grandes companhias marítimas PIPE, colocando em
alerta que sua resistência em não aceitar a sentença do Tribunal de Justiça Europeu de
dezembro de 2014 e o Decreto-Lei 8/2017 iria custar aos cidadãos espanhóis uma severa
multa diária.
No entanto, empresários da ANESCO, a patronal majoritária do setor, e líderes do
sindicato de estivadores, insistem em uníssono que o Governo havia começado por ditar,
antes da norma atualmente vigente, um Decreto-Lei 4/2017, rechaçado pelo Congresso dias
mais tarde
4
, quando ambas as partes estavam a ponto de chegar a um acordo, sem haver
escutado a nenhuma delas, nem aos partidos de cujos votos necessitavam.
3 O adjetivo que melhor qualifica a PIPE é o de um lobby que pressiona o governo e a opinião pública para a
completa liberalização do setor portuário. Os portos espanhóis sofrem a influência de grandes bancos norte-
americanos, entidades investidoras, consórcios internacionais de empresas marítimas, etc. A afirmação de que
o sistema portuário espanhol prejudica as empresas estrangeiras porque impõe condições para trabalhar neles
que perturbam a livre iniciativa pode ser posto à prova quando vemos que empresas como Maersk ou Cosco
estão instaladas ali há tempos. De sua parte, a ANESCO é a associação empresarial majoritária entre as empresas
portuárias espanholas e a celebrante de todos os acordos coletivos portuários do país, que fazem negociações
em dois níveis: estatal e local, ainda que haja também acordos com empresas de outro tipo. À frente a
organização sindical esmagadoramente majoritária, a Coordenadora Estatal de Trabalhadores do Mar (CETM,
antes CEEP), com uma representatividade em torno de 90%.
4 Acordo do Congresso de Deputados de 16 de março de 2017 de derrogação do RDL 4/2017 (BOE de 24 de
março).
4
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É certo que os estivadores não são um coletivo de proletários escravizados. Mas
deveria nos fazer refletir o fato de que tão elevados salários estão, não apenas pactuados com
os empresários por instrumento coletivo, mas também que estes os defendem, pois preferem
dispor de especialistas bem pagos e preparados do que de mão de obra variável,
medianamente remunerada e desmotivada com os vertiginosos horários praticados. São
especialistas que manejam grandes gruas ou sofisticados ro-ros e bobcats, e, diferentemente
de outros especialistas, têm seus horários a mercê da chegada do barco, seja de noite ou de
dia, e com urgência para descarregar e carregar. Daí o registro de presença a cada seis horas
para render o turno
5
.
O problema do Ministro de Fomento do anterior governo era que esse sistema
funciona. Os estivadores espanhóis são mais produtivos que outros europeus, por exemplo,
que os italianos, plenamente “liberalizados”, e os portos espanhóis estão entre os cinco mais
produtivos da Europa, segunda a revista norte-americana JOC: em verdade, o ranking europeu
estaria formado por Bremerhaven, Rotterdam, Algeciras, Barcelona e Zeebrugge.
E há 1.200 portos europeus. Não obstante, a motivação principal do vigente RDL
8/2017 parece haver sido a falta de produtividade dos portos espanhóis, se nos atemos às
palavras do próprio Ministro e mediador oficial em sua proposta de mediação, que logo
veremos. A aparente contradição tem sua origem, a meu ver, em uma confusão: a
5 A digitalização transformou aceleradamente esse sistema e os portuários realizam o registro hoje em dia por
mensagem eletrônica.
5
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produtividade se mede basicamente por número de contêineres manipulados no porto,
enquanto que o que se aludiu por produtividade nas declarações ministeriais e mediadoras
parece ter sido o rendimento por trabalhador em relação ao seu salário, ou, mais exatamente,
o custo de manipulação das mercadorias, conforme o estudo realizado pela PW&C,
informação que está disponível apenas em um jornal, o qual indica que o custo laboral cobre
53% do total, além de difundir níveis de percepção salarial de cerca de 4.000 euros mensais
por estivador sobre cujos parâmetros não se pode discutir porque não foram divulgados. Com
semelhantes cifras, o Ministério incorporou uma crítica aos altos salários e à relação laboral
especial e ditou um Decreto-Lei praticamente centrado em extinguir as SAGEP, sociedades
anônimas de gestão de estiva portuária, que, em cada porto, fornecem a mão de obra às
empresas estivadoras e que está formada pelas próprias empresas estivadoras, e de abolição
do contrato especial de estivas pelo qual os estivadores obtinham estabilidade no emprego,
tudo isso dento de um período transitório de três anos. E, não obstante, outro estudo, neste
caso, público e realizado pela Universidade Politécnica de Barcelona, contradiz os resultados
do estudo da PW&C, ao avaliar o custo da mão de obra entre 14 % e 21% do custo total
6
.
Mas voltemos ao momento anterior ao Decreto-Lei atualmente vigente, o 7/2018. Três
meses antes, o governo havia pagado caro pela sua audácia quando resolveu publicar um
primário e agressivo Decreto-Lei 4/2017, sem ter escutado, nem as partes negociadoras do
setor, nem os partidos que lhe deviam apoiar para obter a maioria dos votos, e havendo
também acolhido a solução mais traumática
7
. Após a maioria do Congresso ter rechaçado a
sua convalidação, entrou em conversações, modificou o texto para abran-lo, e sim,
6
Os pormenores podem ser vistos no Centro de Inovação do Transporte da Universidade Politécnica da
Catalunha (CENIT), Faculdade de Náutica de Barcelona” Analysis of taxes and port services costs in Ro-Ro
terminals. A proposal for a cost observatory”, Barcelona 2013. Versão espanhola desse estudo, na Fundação de
Estudos Portuários FUNESPOR, Estudio sobre las tasas y servicios portuarios en terminales de carga rodada.
Propuesta de modelo para un observatorio de costes”, Tenerife 2014.
7
Deve-se ter em conta, em honra da objetividade, que as turbulências parlamentares haviam paralisado a
atividade do Parlamento desde que se havia publicado a sentença do Tribunal de Justiça Europeu (TJUE) de
dezembro de 2014 no caso Comissão Europeia contra o Reino da Espanha, e o mesmo TJUE, de novo, a mando
da Comissão, havia ameaçado impor uma assustadora multa dissuasória ao país para que cumprisse as
recomendações da sentença. Mas o governo demorou demasiado, e quando quis intervir havia sofrido um forte
castigo eleitoral e perdido a maioria, coisa que se esqueceu com o mencionado Decreto-Lei 4/2017 ao editá-lo
sem haver buscado previamente os necessários apoios parlamentares, o que depois, na fase de convalidação no
Parlamento, ser-lhe-iam negados, pelo “Acordo do Congresso dos Deputados de derrogação do R-D- Ley 4/2017,
de 24 de fevereiro”, citado supra.
6
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obteve o apoio de outros partidos, conseguindo levar adiante o Decreto-Lei 8/2017, que se
encontra em vigor, ainda que com aplicação paralisada em aspectos muito importantes como
comentarei depois.
Em todo o caso, o governo esperou tempo demais para editar a norma. Ninguém o
havia chamado nas relações portuárias que eram pacíficas, até que a Comissão denunciou a
Espanha perante o Tribunal de Justiça Europeu em 2011, não se sabe ao comando de quem,
ainda que os rumores apontem para o próprio Ministério de Fomento Espanhol
8
. Voltarei
sobre esta questão mais tarde.
Tampouco as instâncias europeias permanecem livres de sombras. O Comissário dos
Transportes da União Europeia tentou aplicar o mesmo regime estabelecido nos aeroportos
pela Directiva 96/67 nos Estados-Membros, como se os portos marítimos fossem os mesmos,
e havia fracassado em duas ocasiões - 2001 e 2004 - em suas propostas de Diretiva Portuária
pela oposição frontal do Parlamento Europeu, cujo recente Regulamento 2017/352, de
fevereiro, passou a estabelecer o respeito às convenções coletivas e aos direitos dos
trabalhadores portuários
9
. E a mesma sentença condenatória contra a Espanha de dezembro
de 2014 carece da profundidade a que o Tribunal Europeu nos tem acostumado, quiçá porque
o juiz relator, o luxemburguês Biltgen, passou quase toda a sua vida como Ministro do governo
de seu país, do partido social-cristão.
Em consequência o Decreto-Lei inicial não merecia outra coisa que sua não
convalidação pelo Parlamento. Seu texto era demasiado confuso e em ocasiões
incompreensível, com uma discutível solução para o tema central da “sub-rogação” nas
relações trabalhistas especiais que se pretendiam derrogar: dispensas indenizadas para todo
aquele que quisesse abandonar o emprego, e os demais passariam a ser contratados pelas
empresas estivadoras, diretamente ou através de empresas de trabalho temporário, mas em
8 Em realidade, ao presidente de Portos do Estado daquele momento, a máxima autoridade competente na
matéria, dependente do Ministro do Fomento. A Comissão Europeia guarda segredo sobre as denúncias que
recebe a respeito dos descumprimentos dos Estados, e que dão azo para denunciá-los perante o Tribunal
Europeu de Justiça.
9
Regulamento 2017/352 de 15 de fevereiro de 2017, por ele se cria um marco para a prestação de serviços
portuários e se adotam normas comuns sobre a transparência financeira dos portos. Tenha-se em conta também
o Regulamento (EU) 1315/2013 de 11 de dezembro de 2013 sobre as orientações da União para o
desenvolvimento da Rede Transeuropeia de Transporte, pelo qual se derroga a Decisão 661/2010/UE (DO L 348
de 20.12.2013, p. 1).
7
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todo caso mediante contratos temporários
10
. Os sindicatos resistiam em transformar alguns
contratos estáveis em outros precários e pressionavam para que as empresas se substituíssem
nos contratos indeterminados das SAGEPs. Aos mais velhos do lugar o ocorrido lhes
relembra dos Decretos ditados durante os últimos anos da ditadura do general Franco,
quando a conflitualidade laboral era resolvida mediante uma enérgica norma estatal que
ordenava a volta imediata ao trabalho, e ninguém lhes dava importância. De qualquer modo,
a multa diária de 134.000 € pelo atraso do governo ao cumprimento da sentença deveria
esperar uma condenação que a impusesse, enquanto que as soluções do Decreto-Lei haviam
custado em torno de 350 milhões de euros, também do bolso dos contribuintes. A Espanha é
um país marítimo e não merecia uma regulação que bloqueasse os portos.
O atual Decreto-Lei 8/2017 diverge radicalmente do abortado 4/2017 no que tange a
que uma boa parte das linhas futuras são deixadas à iniciativa das partes da negociação
coletiva mediante um original em outra parte também o chamei de ‘exótico’ Anexo que
incorpora a proposta de mediação e, mais especificamente, os acordos que as partes sociais
firmaram, e que o mediador havia convertido em parte dela
11
. São pactos muito enérgicos,
que o Governo deve transformar em um Decreto Real sem modificar nem um pouco deles,
pois se diz que o Real Decreto-Lei “reunirá” nessa norma o estabelecido na proposta de
mediação
12
.
Esse Anexo recompõe absolutamente o equilíbrio entre as três partes em benefício da
estabilidade da situação, ainda que imponha quatro novas obrigações de transcendental
importância: aos empresários, para sub-rogar-se nos contratos por tempo indeterminado que
10 Habilitava-se um período transitório de três anos nos quais as empresas estivadoras se obrigavam a manter
em suas folhas de pagamento um percentual decrescente de estivadores procedentes da SAGEP igual a seu
percentual de participação no capital dela: 75% no primeiro ano, 50% no segundo e 25% no terceiro. Disposição
Transitória Segunda do RDL 4/2017.
11
Essa parte nova constitui o Anexo ao Decreto-Lei, cujo valor é o mesmo que o deste, ou seja, valor de lei. Para
maiores detalhes, veja-se o meu artigo “O exótico anexo do Real Decreto-Lei de reforma da estiva”, Revista de
Trabalho e Seguridade Social 424 (2018), pp. 15-41. O governo era parte da mediação e se retirou dela quando
o mediador incorporou os pactos entre as outras duas partes, pelo que a rigor, como o RDL 8/2017 indica, trata-
se de uma “proposta” de mediação, e não um compromisso [entre as partes] por mediação.
12 Disposição Final Terceira do RDL 8/2017: “2. O governo aprovará um real decreto que retire a proposta de
mediação da data de 30 de março de 2017, pela qual se põe fim a uma mediação tripartida entre as organizações
sindicais, a associação empresarial e o governo”.
8
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os estivadores tiverem com a respectiva SAGEP
13
; aos sindicatos, a obrigação de reconhecer
o poder de direção e organização dos empresários no trabalho portuário
14
; ao governo, o
reconhecimento de uma aposentadoria antecipada bastante favorável aos estivadores de
idade avançada, em particular para aqueles para os quais faltavam sessenta meses ou menos
para alcançar a idade de aposentadoria ordinária
15
; e a todos a obrigação de respeitar a
convenção coletiva setorial de máximo nível nos capítulos referentes aos aspectos mais
delicados da relação laboral, como condições de trabalho, modalidades de tarefas, jornada e
descanso, ou formação, prevenção e igualdade
16
. Em contrapartida, se incorporava ao
Decreto-Lei uma disposição que dotava as convenções coletivas de cada porto de uma eficácia
superior a das convenções superiores, e nomeadamente a de máximo nível
17
.
O governo conservador caiu quando o presidente, Mariano Rajoy, foi submetido a uma
moção de censura vitoriosa, e atualmente a Espanha tem um governo progressista que trata
de digerir todo o ocorrido e articular esse Decreto de desenvolvimento com os compromissos
que contêm. Encontramo-nos em uma expectativa que ao dia de hoje dura já mais que um
ano. Neste ínterim será bom que analisemos todo o contexto comunitário de onde nasce
formalmente o impulso à reforma em marcha.
13 Anexo do RDL 8/2017, Anexo A. Tenha-se em conta que tal sub-rogação havia sido pactuada pela associação
de empresários e os sindicatos participantes na mediação, e por isso havia sido aceito de plano pelos primeiros.
Este ponto contrasta agudamente com o espírito do RDL, que previa a incorporação dos estivadores às empresas
de trabalho temporário e à contratação mediante contratos temporários que deixavam no vazio os tempos entre
as missões.
14 Anexo do RDL 8/2017, Anexo B, passim.
15 Anexo do RDL 8/2017, Apartado C.
16 Anexo do RDL 8/2017, Apartado B, parágrafo 10.
17 Disposição Adicional Segunda do RDL 8/2017. A incorporação ex novo desta norma deve se colocar em relação
com a criação pelo governo conservador na Lei 3/2012 da prioridade aplicativa das negociações com a empresa
em caso de conflito com as negociações de âmbito superior e referente às matérias do sinalagma contratual, um
fenômeno que se repetiu, inclusive com mais força, na Itália e também na França, e que no Brasil teve igualmente
expressão na reforma do presidente Temer com a Lei 13.467/2017.
9
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1. A regulação comunitária
Assim sendo, o Ministro de Fomento esteve consciente de que uma nova intervenção
por via do Decreto-Lei restaria amortizada caso não contasse com o respaldo dos atores em
conflito e com a maioria do Parlamento, e expressou sua disposição em esperar por um
possível acordo entre as partes.
Mas, sobre que problemas se debatia e ainda se debate?
Primeiro de tudo, acerca da aplicação do regulamento europeu sobre portos europeus,
o acórdão do Tribunal de Justiça Europeu, no caso Comissão Europeia contra a Espanha,
entende infringido pela existência em nosso país das empresas de gestão do trabalho do
trabalho portuário (SAGEP) financiadas compulsoriamente pelas empresas às quais os
estivadores devem pertencer e para as quais as empresas acima mencionadas devem
obrigatoriamente recorrer para as suas necessidades temporárias de mão de obra. Na
realidade, as SAGEP atuam como empresas de trabalho temporário, fornecendo às empresas
de cada porto a mão de obra conjuntural que necessitam, enquanto que para os estivadores
envolvidos em tal rodízio os mantêm em uma “relação laboral especial” cuja peculiaridade
consiste em permitir-lhes uma estabilidade salarial por via de abonar-lhes durante os dias de
greve graças ao financiamento oferecido proporcionalmente pelas empresas portuárias
um “salário de inatividade” ou “garantia de percepção salarial” que vem a equivaler ao seguro
por desemprego.
Encontramo-nos, consequentemente, frente a uma condenação coletiva das listas de
estivadores reconhecidos, também denominadas como registros, pools ou bolsas de trabalho
portuário, uma prática reconhecida na maioria dos portos europeus e à qual a decidida
oposição da Comissão Europeia vem diminuindo o apoio desde sua sentença sobre o porto de
Gênova em 1997
18
.
A sentença do Tribunal Europeu contra a Espanha se traduz em um apotegma e quatro
deduções. No primeiro lugar, a sentença considera que a legislação espanhola sobre portos
18 Sentença TJUE 179/90, de 10 de janeiro de 1991, caso Porto di Genova. A seu teor, as operações de estiva e
as portuárias em geral carecem de interesse econômico geral e consequentemente estão submetidas às normas
comunitárias sobre livre concorrência e liberdade de circulação.
10
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infringe a legislação europeia, em particular o art. 49 do Tratado de Funcionamento, por “fazer
menos atrativo o exercício, por parte dos nacionais comunitários, da livre iniciativa garantida
pelo Tratado”
19
; em segundo, a parte decisória da sentença destrincha os quatro
descumprimentos do Reino da Espanha: impõe às empresas de outros Estados membros
ainda que em igualdade de condições com quaisquer empresasa obrigação de inscrever-se
nas SAGEPs e de participar no capital destas, assim como a obrigação de contratar
prioritariamente os trabalhadores das listas delas e um mínimo de tais empregados como
empregados permanentes.
Dessa maneira a sentença europeia condena a Espanha porque sua legislação deixa
“menos atrativa” a liberdade de iniciativa no país para as empresas de outros países europeus,
mesmo que estas estejam obrigadas às mesmas prestações às quais se vêm obrigadas as
espanholas. Trata-se, como vemos, de uma questão de matiz, em que nenhum papel
desempenha a não discriminação, pois todos devem pertencer e pagar as SAGEP, e não apenas
as empresas tão ambiguamente chamadas “comunitárias”. Sobre o escorregadio princípio da
escassa atratividade, que poderíamos traduzir, se me for permitida a ocorrência, por “allegro
ma non troppo, a sentença remete a várias outras que tratam de definir o indefinível, os
limites do pouco-tentador-mas-em-princípio-válido
20
, assim como a uma Comunicação sobre
política portuária europeia, a COM (2007) 616, a cujo teor as disposições sobre contratação
de trabalhadores portuários não devem se utilizar para impedir que pessoas ou empresas
devidamente qualificadas prestem serviços de manipulação de mercadorias ou para impor aos
empresários uma mão de obra das quais não necessitam.
Tal é a legislação comunitária que se estima infringida: uma doutrina jurisprudencial
que protege a livre iniciativa inclusive nos evanescentes e imprecisos limites do pouco atrativo,
e uma Comunicação que carece de valor normativo, mas que em definitivo só poderia ter
relevância no que diz respeito à imposição de mão de obra desnecessária, esse percentual de
19 Sentença 576/13, apartado “Sobre el recurso”, parágrafo 2º.
20 Em verdade, as sentenças TJUE Kraus 19/92, Comisión c. Países Bajos 299/02, y Comisión c. Grecia 140/03,
citadas no item “Sobre el recurso”, parágrafo 2, assim como as sentenças Comisión contra Francia 89/09, y SOA
Nazionale Costruttori 372/12, citadas neste mesmo item “Sobre el recurso”, páragrafo 11.
11
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contratações por tempo indeterminado que a autoridade portuária estabelece para cada
empresa ao outorgar a licença de exploração
21
.
Na sua luta pela liberalização empresarial dos portos, a Comissão parece estar
absolutamente só. Fracassou em duas ocasiões nos seus intentos para conseguir a aprovação
de uma Diretriz nesse sentido, e a jurisprudência sobre o caso particular, podemos qualificá-
la como pírrica, pois frente às sentenças que a apoiam, basicamente a do caso Porto di Genova,
encontramos outras que defendem o contrário, a saber, que nos situamos ante de atividades
de interesse geral e que as normas comunitárias não são de aplicação à estiva. Nessa
jurisprudência enfrentada é onde encontramos uma chave importante no desenvolvimento
argumentativo que condena a Espanha, pois estou falando principalmente da sentença Becu
e outros, C-22/98, que resolvia a questão de se as listas de estivadores se chocavam com a
legislação comunitária sobre a livre concorrência, concluindo-se pela negativa. Desse modo,
o caminho para uma condenação digamos assim normal, em torno da possível infração à
livre concorrência, permanecia cerceado, levando a Comissão a tentar a muito mais complexa
e discutível, via de infração da liberdade de estabelecimento (livre iniciativa) do art. 49 do
TFUE (Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia). A sentença Becu não só explica os
tortuosos caminhos da condenação à Espanha, mas também entra no âmago da regulação
sobre bolsas de trabalho ou pools como o das SAGEP: a lei belga de 08 de junho de 1972
proibia e proíbe “a execução de todo trabalho portuário nas zonas portuárias por
trabalhadores distintos dos trabalhadores portuários reconhecidos”, sendo que uma empresa
estivadora do porto de Gante dirigida pelo senhor Becu havia a infringido contratando
trabalhadores externos, o que havia gerado uma denúncia criminal pela fiscalização de Gante
e uma questão prejudicial do tribunal ante o TJUE. Pois bem, o TJUE rechaçou a possibilidade
de evitar a proibição, deixando a porta aberta ao juiz local para condenar criminalmente a
Becu e os demais envolvidos, entendendo que a livre concorrência do Direito Europeu não
permite às empresas portuárias se oporem à obrigação de “empregar exclusivamente
trabalhadores portuários reconhecidos” e a “pagar a estes uma retribuição que supera
21 Art. 117.1, letra n), da Lei de Portos do Estado (RDLeg 2/2011), que veio derrogada pelo RDL 4/2017, por sua
vez derrogado não convalidado pelo Congresso, como sabemos. Diz assim: “n) Nas licenças de serviço portuário
de manipulação de mercadorias, percentual mínimo de trabalhadores que devem ser contratados em regime de
trabalho comum”.
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amplamente os salários de seus próprios empregados ou os que pagam a outros
trabalhadores”. Retorcendo os conceitos, a condenação à Espanha se inspira na mesma ideia
que havia saído derrotada na sentença Becu e à livre concorrência, para fazê-la prevalecer em
respeito ao princípio da liberdade de estabelecimento, pois em realidade, o motivo do “menor
atrativo” em se estabelecer era o do custo econômico e mais concretamente o do custo
salarial, cuja diferença com o “normal” se considerava como uma diferença “não equitativa”
22
.
Ademais, o Advogado Geral proponente na sala do Tribunal de Justiça era o espanhol
Ruiz Jarabo, quem teve a satisfação de ver confirmadas suas teses pela sentença que se
acabou de comentar. Dizia em suas conclusões que:
Da análise dos autos não se desprende elemento algum capaz de desvirtuar
o caráter exclusivamente laboral que reveste a relação jurídica no marco da
qual os trabalhadores reconhecidos da zona portuária de Gante prestam seus
serviços, nem a existência de forma organizativa alguma suscetível de ser
considerada como uma empresa aos efeitos das normas comunitárias sobre
a concorrência.
A luta parece ter sido finalmente perdida pela Comissão, apesar da condenação da
Espanha, pela promulgação do recente Regulamento sobre portos 217/352, que merece
comentário específico nas linhas que seguem.
2. O Regulamento comunitário 217/253, de 15 de fevereiro, sobre prestação de serviços
portuários
Dois anos depois da sentença condenatória, o Parlamento e o Conselho Europeus
promulgaram um Regulamento pelo qual se criava um marco para a prestação de serviços
22 Sentença Becu e outros 22/98, parágrafo 15: o juiz de primeira instância havia entendido como não equitativa
a diferença salarial entre a percepção do trabalhador ordinário na empresa SMEG, de 667 francos belgas a hora,
e a dos estivadores reconhecidos dentro da mesma empresa, de 1335 francos belgas a hora, mais que o dobro,
pelo que havia rechaçado a imputação da fiscalização. Junto a essa diferença salarial, provavelmente jogaria a
favor do não conhecimento do caráter penal das sanções contempladas pela Lei de 1972. Recorrida a decisão
em segunda instância, o novo tribunal havia abordado a questão prejudicial ante o TJUE antes de resolver.
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portuários e se adotavam normas comuns sobre a transparência financeiras dos portos, onde
uma extensa e importante exposição de motivos dá passo a um capítulo central, o 2º, com
regras de capital importância sobre a estiva ao versar sobre a prestação de serviços portuários,
um capítulo que, não obstante, acaba com um giro inesperado.
A importância desses artigos radica em que contemplam a possibilidade de que a
prestação de serviços portuários por parte das empresas interessadas possa estar submetida
a requisitos mínimos da dita prestação, à limitação do número de prestações, a obrigações de
serviço público ou a restrições relacionadas com operadores internos. Dentro dos requisitos
mínimos diz, ademais, que poderão consistir em manter as equipes necessárias para prestar
o serviço em condições normais e seguras ou na capacidade para prestá-lo sem interrupções
durante todo o ano, ou em certas qualificações profissionais, requisitos mínimos que terão
como condição indispensável ser transparentes, objetivos, não discriminatórios e pertinentes
para o serviço de que se trate
23
. A princípio, as referências, por mais genéricas que pareçam,
relembram-nos sobre os problemas principais que se elucidam no conflito da estiva, às SAGEP
com sua bolsa prioritária na contratação e ao serviço de manipulação de cargas a qualquer
hora durante todo o ano.
O art. 7º do Regulamento menciona algumas regras do serviço público que podem ser
impostas às empresas portuárias, como a continuidade ou a não interrupção do serviço, a
segurança das operações, a igualdade e a universalidade dos usuários do serviço as
carregadeiras ou companhias marítimas-, e também um preço acessível para determinadas
categorias de usuários. Alude o Regulamento, no artigo seguinte, à possibilidade de realizar
tais prestações de serviço público por meio de um operador interno que, não obstante, parece
consistir em uma entidade autônoma, ainda que plenamente subordinada à hierarquia
portuária, pois a autoridade competente há de exercer sobre esse organismo gestor do porto
“um grau de controle [...] similar ao que tem sobre seus próprios departamentos”, ou, em
outros termos, tem-se uma influência decisiva tanto sobre os objetivos estratégicos como
sobre as decisões importantes da entidade jurídica de que se trata”. Se lembrarmos de que as
SAGEP espanholas têm um funcionamento muito similar ao das ETT
24
, compostas, financiadas
23 Artículo 4 del Reglamento.
24 Empresas de Trabajo TemporalNota da Tradutora.
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e dirigidas pelas empresas portuárias que elegem seus órgãos diretivos, não parece factível
considerá-las como operadores internos totalmente controlados pela autoridade portuária. A
questão a resolver consiste, pois, em saber se as gestoras de mão de obra controladas pelas
empresas portuárias têm lugar no marco estabelecido pelo Regulamento Comunitário. Mas
essa questão tem direto encaixe no surpreendente final de que havia falado antes.
O Regulamento alude também à possibilidade de sub-rogação, pois indica no art. 9º
que em caso de mudança de prestador de serviços portuários, a autoridade competente
poderá exigir à nova empresa portuária que se sub-rogue nos direitos e obrigações
trabalhistas da anterior.
Todo o anterior parece propenso a admitir uma situação como a dos portos espanhóis
e, caberia adicionar, como a da maioria dos portos europeus -, com suas SAGEPs
compulsoriamente financiadas por recurso das empresas portuárias e com estivadores em
uma relação especial que consiste em um contrato indeterminado e bem remunerado.
A nota final do Capítulo 2, mencionada anteriormente, nos leva a uma ruptura sem
saída porque vem a anular todo o anterior porquanto se refere aos estivadores. “O disposto
no presente capítulo e no artigo 21 diz não se aplicará aos serviços de manipulação de
carga, aos serviços de passagem nem à pilotagem”. Provavelmente pela variedade de soluções
nacionais, com predomínio dos registros unitários ou bolsas internas de trabalho, que, além
disso, vêm respaldadas pela Convenção 137 da OIT, o Regulamento deixa liberdade aos portos
para organizar estes serviços como considerem mais oportuno, deixando que convivam as
sentenças contraditórias que vimos, do Porto di Genova, do Porto de Gante (“Becu e outros”)
e da Comissão Europeia contra a Espanha.
3. A proposta de mediação e a resposta das partes
Surpreendentemente a proposta de mediação oferecida em 30 de março de 2017 às
partes pelo presidente do Conselho Econômico e Social, D. Marcos Peña, omite toda
referência às possíveis mudanças normativas aportadas pelo Regulamento da UE, embora
este tivesse aparecido publicado no Diário Oficial da União Europeia quase um mês antes.
Menciona unicamente a necessidade de estabelecer “um novo marco regulador, derivado da
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Sentença [europeia] e aos critérios de ordenação da atividade empresarial contidos no
ordenamento da UE
25
.
Na realidade, a sentença e os critérios de ordenação da atividade empresarial do
Direito Social Europeu significam bem pouca coisa. Já vimos como o TJUE declara o
descumprimento de um artigo do Tratado de Funcionamento, ao não haver regulamento ou
Diretriz sobre o caso particular, e o faz em virtude do “menor atrativo” que supõe se
estabelecer nos portos espanhóis, com base na obrigação das empresas de pertencer às
SAGEP, participar de seu financiamento, empregar os estivadores da sua lista, e contratar por
tempo indeterminado uma porcentagem indicada pela autoridade portuária igualmente
dentro da lista da SAGEP. No que diz respeito aos critérios de gestão da atividade comercial
constantes no Ordenamento da UE, o mediador declara expressamente o regulamento
relativo à transferência de empresas e dispensas coletivas, bem como o princípio do equilíbrio
entre a liberdade das empresas e os direitos sociais e de emprego.
No entanto, além do acervo comunitário, incluindo-se nisso o que fora incluso por ele
mesmo, o mediador parte de dois pressupostos que influem decisivamente em sua proposta:
de uma parte, que a sentença é clara quanto aos termos da condenação; de outra parte, que
se pode partir de um marco empresarial como o desenhado pelo derrogado RDL 4/2017 na
hora de conduzir uma cessão de trabalhadores em termos similares aos que eram
desempenhados nos termos da norma anterior, ainda que não haja uma fórmula de
continuidade no emprego que suponha a sub-rogação direta a respeito de cada empresa
26
.
Que a sentença da UE permite diversas interpretações já foi discutido por autores como
VILLAR, quando este afirma que o registro único ou pool de estivadores, assim como a
preferência no emprego ou a adequação às necessidades não requerem que as empresas
portuárias devam filiar-se às SAGEP, nem a obrigação de contratar exclusivamente com elas,
nem por uma equipe mínima
27
, ou em termos mais gerais por VAN HOOYDONKE quando
25 PEÑA PINTO M., “Propuesta de mediación sobre efectos laborales de la nueva ordenación laboral del servicio
portuario de manipulación de mercancías”, Madrid 30 de marzo de 2017, p. 5.
26 Ibidem, pp. 6-7.
27
VILLAR ROJAS F.J., “La l i b e r t a d e u r o p e a d e e s t a b l e c i m i e n t o : r e st r i c c i o n e s j u s t i f i c a d a s y n o j u s t i f i c a d a s . ( A
p r o p ós i t o d e la S T J U E s o b r e l a e s t i b a e n l o s p u e r t o s e s p a ño l e s ) , en VV.AA., D e r e c h o A d m i n i s t r a t i v o e I n t e g r a
c i ón E u r o p e a , Ed. Reus, Madrid, 2017, p. 14.
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afirma que o Direito da União permite aos Estados membros escolher entre o trabalho
portuário livre ou um sistema sustentável de pool ou o registro de estivadores que não esteja
submetido a restrições excessivas
28
.
Dentro desses limites, a proposta do mediador pode ser estimada moderadamente
positiva, até o ponto de quase obter a aprovação de ambas as partes. Em substância propõe
quatro pontos principais:
a) A sub-rogação das novas gestoras de emprego portuário nas relações de trabalho
atuais que mantêm as respectivas SAGEP com os estivadores, conforme o estabelecido no art.
44 do Texto Refundido ET. As fórmulas concretas da sub-rogação seriam negociadas por
ambas as partes, e em seu caso, refletidas na negociação coletiva
29
. Trata-se de uma proposta
cuja parte mais complexa, a determinação das fórmulas específicas para a transferência de
pessoal às novas gestoras de emprego portuário sejam ETTs ou Centros Portuários de
Emprego -, distancia radicalmente ambas as partes, pelo que a negociação e sua concretização
por meio de acordos coletivos teriam grandes possibilidades de fracassar.
b) Negociação pelas partes das medidas de flexibilidade que permitiriam às empresas
portuárias assumir o controle das contratações, abandonando os sistemas de cessão direta
pelas SAGEP, e que nos atuais acordos coletivos costumam seguir a fórmula do rodízio
30
.
c) Manutenção da oferta do Governo de ajudas à aposentadoria antecipada voluntária
para os estivadores dentro dos sessenta meses prévios à aposentadoria ordinária, com
prestações equivalentes a 70% da média salarial e contribuições por meio de acordo específico.
d) Redução dos salários em 10% para aqueles que tivessem soldos superiores ao triplo
do salário mínimo, medida interprofissional que poderia substituir-se mediante acordo por
outra ou por outras medidas de flexibilidade interna.
28 Port labour in the EU, Bruselas 2013, p. 2.
29 Propuesta del mediador, p. 10.
30 O texto do mediador, p. 11, alude a uma prática consolidada durante decênios denominada “pacto de mãos
e destino”, que viria a ser rompido pela cessão do controle das empresas portuárias fixadas em acordos coletivos
futuros. Mas se os atuais acordos estabelecem o rodízio de efetivos como ocorre similarmente nas bolsas de
trabalho de outras atividades, por exemplo, na saúde e ditos pactos burlam o pactuado, mal parece que vão
desaparecer pelo mero feito de estabelecerem os futuros acordos um sistema, já não de rodízio, mas sim de
cessão direta do controle à empresa.
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A resposta das partes chegou ao mediador por cartas da ANESCO e dos sindicatos,
ambas datadas de 04 de abril. A proposta recebida agradou as empresas, ainda que
condicionem sua aceitação ao esclarecimento do marco jurídico, ou melhor, ao
esclarecimento sobre se a futura norma manterá ou não “todos os termos do RDL derrogado,
e em especial, sobre seu regime transitório”, assim como o alcance real do plano de ajudas do
Governo às pré-aposentadorias. Aos Sindicatos preocupa a garantia de 100% dos empregos
aos estivadores atuais, e requerem reconhecer os planos normativos do governo antes de
aceitar a proposta, assim como os dados concretos das ajudas, por porto e por trabalhador.
Conclusões e proposta
Ao momento de escrever essas linhas, parece muito difícil alcançar uma norma capaz
de abrir uma via de solução, principalmente por causa da atitude do Ministério de esperar
pela negociação coletiva, enquanto que a negociação coletiva espera pela publicação do
Decreto que resolva em especial o tema das aposentadorias antecipadas.
A sentença do TJUE pode ser interpretada de diversas maneiras, como já vimos, e, em
minha opinião, uma boa resposta a seus requerimentos poderia consistir em não obrigar as
empresas portuárias a pertencer forçosamente às SAGEP, as quais poderiam passar a ser
gestoras portuárias de emprego que recebem uma taxa daquelas pela cessão de mão de obra.
A relação especial de emprego dos estivadores com as SAGEP e sua formação e segurança
laboral deveria ajustar-se ao que fosse obtido com tais tarifas, que teriam um componente de
serviço público para garantir a continuidade dos serviços. Esta proposta poderia satisfazer as
exigências do Tribunal Europeu, ainda que se considere poder haver alternativas que não
perpassem pela necessidade de entrar na questão das complicadas sub-rogações. O requisito
é, como sempre, a vontade.
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diciembre de 2014, recaída en el asunto C-576/13 (procedimiento de infracción 2009/4052).
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trabajadores para la prestación del servicio portuario de manipulación de mercancías dando
cumplimiento a la Sentencia del Tribunal de Justicia de la Unión Europea de 11 de diciembre
de 2014, recaída en el Asunto C-576/13 (procedimiento de infracción 2009/4052). 2017c.
Disponível em: https://www.boe.es/buscar/doc.php?id=BOE-A-2017-5270. Acesso em:
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febrero, por el que se modifica el régimen de los trabajadores para la prestación del servicio
portuario de manipulación de mercancías dando cumplimiento a la Sentencia del Tribunal de
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