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Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano
Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região
TEIXEIRA, Victor Bertoldo. Você tem fome de quê? Direito fundamental à alimentação adequada contra o hambúrguer
como refeição fornecida pelo empregador. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano, Campinas, v.6,
p. 1-25, 2023. DOI: https://doi.org/10.33239/rjtdh.v6.167.
indivíduo, e, segundo, de que nas relações sindicais não se inseririam os
mesmos princípios jurídicos trabalhistas, fazendo-se supor que em virtude
da alteração dos sujeitos estaria aberto o campo para a incidência dos
preceitos liberais clássicos, sobretudo o contrato, a partir da autonomia
coletiva7.
Assim, a perspectiva assumida pelo presente texto é a de que, inclusive
como será reforçado no tópico sobre direito à alimentação, a questão debatida no
processo diz respeito a toda a sociedade e não somente ao valor do vale-refeição e
ao hambúrguer objetos da controvérsia no processo.
Se há uma conquista dos trabalhadores, existe, ao mesmo tempo, uma
vantagem relevante também para o patronato. Ao pagar de modo específico por
alimentação ou fornecendo in natura sem repercussões salariais, a empregadora fica
isenta em termos, por exemplo, de FGTS e contribuições sociais, mesmo garantindo
maior poder de compra ao seu empregado8.
A Convenção Coletiva debatida trouxe as seguintes disposições:
As empresas fornecerão refeições nos locais de trabalho.
§1º - O fornecimento de refeições não será considerado salário “in natura”,
não se incorporando à remuneração do empregado para fins de quaisquer
direitos trabalhistas ou previdenciários.
§2º - A obrigação de fornecimento de refeições nos locais de trabalho poderá
ser cumprida de forma alternativa pela concessão de vale-refeição nos
valores mínimos de:
7 SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Curso do direito do trabalho: teoria geral do direito do trabalho. São
Paulo: LTr, 2011. v. 1, pt. 1, p. 684.
8 A propósito das vantagens para o empregador: “o vale-refeição passou a ser incentivado pelo
legislador, como forma de melhorar as condições de trabalho do empregado. A solução encontrada
[...] foi o incentivo fiscal para a empresa que aderir ao sistema, com caráter facultativo [...]. Trata-
se do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), Lei 6.321, de 14.04.1976. O empregador pode
oferecer a refeição pronta, através de restaurantes próprios, terceirizados ou conveniados, mediante
aprovação pela autoridade do Ministério do Trabalho e Emprego, mas a circunstância mais comum,
até mesmo para facilitar a operação do programa, é a contratação de serviços de empresas
especializadas que comercializam os famosos tíquetes de refeição. Justifica-se, assim, por que o
Programa de Alimentação do Trabalhador se tornou mais conhecido pelo tíquete ou vale do que pelo
fornecimento direto da refeição. Atualmente, substituem-se os tíquetes de papel por créditos em
meios eletrônicos, mas o funcionamento do sistema segue inalterado. A crítica que se faz a essa
triangulação em torno do vale-refeição diz respeito à obtenção de lucros empresariais à custa da folha
de pagamento dos empregados. [...] Discute-se [...] se uma norma coletiva pode fixar a natureza
jurídica das parcelas convencionadas e desonerar os encargos sobre vale-alimentação não aderente
ao PAT. [...] as normas coletivas passaram a se sentir mais livres quanto à fixação da natureza jurídica,
em se tratando de cláusulas que veiculem vantagens não previstas em lei, não enquadráveis em
categorias conhecidas e envoltas em intensos debates. Não se trata de fixar a natureza jurídica das
horas extras nem do adicional noturno (sabidamente salariais), [...], mas de pôr fim à controvérsia
sobre uma zona cinzenta” (SILVA, Homero Batista Mateus da. Direito do trabalho aplicado: direito
individual do trabalho. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. v. 2, p. 673-676).